Justiça de SC reconhece que pessoa pode se declarar com gênero neutro em certidão de nascimento
Para juíza que proferiu decisão, o Judiciário deve frear a discriminação das minorias e garantir a todos o exercício pleno de uma vida digna
Em uma das primeiras decisões sobre o tema no país, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reconheceu o direito de uma pessoa de declarar que seu gênero é neutro, ou seja, não-binário, sem gênero definido. O processo permitiu a troca de nome e a alteração da certidão de nascimento da pessoa, que agora não será classificada como homem nem como mulher.
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A decisão foi proferida pela juíza Vânia Petermann, que buscou jurisprudência em países com sistemas jurídicos compatíveis para basear sua análise e conceder o pedido da pessoa que impetrou com a ação. Austrália e França, por exemplo, já reconhecem o gênero neutro desde 2014 e 2015, respectivamente. A magistrada ainda lembrou que o Supremo Tribunal Federal já se manifestou a favor da possibilidade de se mudar o registro de sexo, independentemente do órgão sexual.
No documento, a magistrada ponderou que o Judiciário deve frear a discriminação das minorias e garantir a todos o exercício pleno de uma vida digna. "Impedir as pessoas de serem o que sentem que são é uma afronta à Constituição", assinalou a juíza na decisão.
Ainda de acordo com a juíza, é importante garantir às pessoas o direito à autodeterminação de gênero, livre de preconceito, opressão e discriminação. "Os ideais de igualdade e dignidade, o viés protetivo da personalidade, previstos em nossa Constituição dependem do avanço legislativo para atender a dinâmica evolutiva da vida em Sociedade. Diante de uma lei que não faz mais sentido, da norma infraconstitucional, e da falta do avanço no fluxo do que está pulsando, não cabe denegar os mais intrínsecos direitos inerentes a todo ser humano", ponderou Vânia.
Em razão da alteração do sexo na documentação, a juíza também analisou os impactos na língua brasileira na forma de identificar o autor do pedido. Pela língua não possuir um pronome neutro, ela ressaltou que a adequação encontrará espaço, "seja na voz da sociedade ou da legislação".
O caso
Segundo o TJSC, quando nasceu, a pessoa foi registrada como sendo do gênero masculino, mas nunca se identificou como tal e também não se identificava com o gênero feminino. Ao tentar mudar na sua certidão de nascimento o nome e o gênero para "não identificado", houve a necessidade de levar o pedido à Justiça.
Por isso, a juíza Vânia Petermann admitiu a petição e proferiu a sentença com base em dados históricos, antropológicos, sociológicos, filosóficos, biológicos, pscicanalíticos, e psicológicos, além de fazer extensa uma análise sobre a trajetória de gênero e sexualidade, no Brasil e no exterior.
As informações foram divulgadas pelo TJSC na segunda-feira (12). O caso corre sob segredo de Justiça.