PALEONTOLOGIA

Sertão já teve sua Era do Gelo

Vestígios de mamíferos gigantes foram encontrados durante escavação de canal em São José da Tapera (AL)

Claudia Parente
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Claudia Parente
Publicado em 21/09/2014 às 8:05
Museu de História Natural da Ufal
Vestígios de mamíferos gigantes foram encontrados durante escavação de canal em São José da Tapera (AL) - FOTO: Museu de História Natural da Ufal
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Os grandes mamíferos da Era do Gelo, imortalizados pelo cinema de animação, também habitaram o Sertão de Alagoas há mais de 10 mil anos, no Pleistoceno (período pré-histórico entre 1,8 milhão a 11 mil anos atrás). Fósseis bem conservados de tigre de dente-de-sabre, mastodonte, preguiça gigante, tatu-gigante, toxodon e paleolhama foram encontrados durante as obras de construção do Canal do Sertão Alagoano, em São José da Tapera, a cerca de 220 quilômetros de Maceió (AL).

“Em termos de diversidade, foi uma das maiores coletas de fósseis que já fizemos no Estado”, revela o paleontólogo Jorge Luiz Lopes, responsável pelo recolhimento e diretor do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), para onde o achado foi transportado. “Em duas semanas de trabalho, no fim do ano passado, recolhemos mais de duas toneladas de material. É a maior quantidade encontrada até hoje”, diz Jorge Luiz Lopes, que garimpa fósseis há 20 anos no Estado. 

Depois de peneirar e separar o material, o pesquisador identificou molares e presas de mastodonte (parente dos elefantes), dentes de preguiça gigante, placas ósseas (osteodermos) de tatu gigante, cabeça do fêmur de um tigre dente-de-sabre, vértebras de paleolhama (lhama grande, do tamanho de um camelo) e dentes de taxodon (animal que se assemelhava a um hipopótamo). “O material foi fácil de identificar e tem muita peça de boa qualidade que pode integrar o acervo do museu”, afirma o paleontólogo.

Normalmente, fósseis são encontrados em depressões nas rochas, mas esses estavam entulhados ao lado do trecho onde o canal ia passar. “A área foi escavada por moradores há cerca de 70 anos. Eles costumavam esvaziar os tanques de fósseis para armazenar água de chuva”, explica o professor. “Felizmente, não destruíram as peças.” Até agora, nenhum fragmento de animal desconhecido foi identificado. “Mas só conseguimos pesquisar metade dos fósseis encontrados”, lembra. Em Alagoas, há cerca de 60 sítios paleontológicos em 24 municípios pesquisados pela Ufal. Na maioria predomina a magafauna (mamíferos gigantes da era do gelo). “Mas encontramos fósseis de animais menores ainda não identificados.”

A descoberta do novo sítio foi feita pela Arqueolog Pesquisas, consultoria que acompanha a construtora Odebrecht nas obras do canal que vai levar água do Rio São Francisco para a parte mais alta do Estado. “Como o canal ia passar por dentro do sítio, as escavações foram suspensas por determinação do Iphan até que fosse feito o resgate dos fósseis”, informa Omar Barreto, engenheiro de produção da Odebrecht. 

Ele explica que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) exige que obras desse porte sejam acompanhadas por arqueólogos. “Caso contrário, a licença ambiental não é concedida.” O pessoal da Odebrecht ajudou o paleontólogo Jorge Luiz na retirada dos fósseis.

Por enquanto, as peças estão no museu da Ufal para análise. Mas o paleontólogo defende que parte do achado volte para o município de São José da Tapera depois de catalogado. “Seria uma forma de atrair visitantes e estimular a pesquisa na região. Porém, é preciso montar um local adequado para abrigá-lo”, ressalta. Depois desse achado pré-histórico, as obras do canal continuaram. “Mas não encontramos mais nenhum material paleontológico ou arqueológico”, diz Omar Barreto, informando que as obras terminam em julho de 2015.

Desde 1942, o comércio de fósseis é proibido no Brasil (Decreto-Lei 4.146). Tudo que for encontrado 50 centímetros abaixo do solo é patrimônio da União. A pena por roubo dessas peças pode chegar a cinco anos de prisão.

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