A sina da maioria dos jovens que conclui o ensino médio no Sítio Encruzilhada, a dez quilômetros de Afogados da Ingazeira, no Sertão do Pajeú (e distante 377 quilômetros do Recife) é constituir família, no caso das moças, ou viajar para trabalhar na construção civil no Sudeste, no caso dos rapazes. Marcicleide Santana, 23 anos, resolveu que com ela seria diferente. Enfrentou cansativas viagens diárias até a cidade, em estrada de barro, às vezes sem ter dinheiro para lanchar, com o objetivo de se tornar professora. Hoje, formada em licenciatura em matemática, ensina numa escola municipal e está como docente substituta na autarquia onde pouco tempo atrás era aluna.
Do 3º ao último período, Marcicleide ganhou bolsa integral do Programa Universidade para Todos de Pernambuco (Proupe). Economizou, por mês, R$ 214 (em valores corrigidos hoje). “Para custear a inscrição no vestibular juntei um mês do salário que recebia no estágio. Trabalhava no comércio de Afogados. Paguei o primeiro ano com dificuldade. Se não fosse a bolsa acho que não teria terminado a faculdade”, conta. No Sítio Encruzilhada vivem cerca de cem moradores. Ela é a única com curso superior. “Quando estou lá as pessoas fazem questão de dizer ‘a professora chegou’. O tratamento é diferente. Percebo que sentem orgulho”, comenta a jovem.
Durante a graduação ela deu aula de reforço num colégio público. Uma das exigências do programa é que os bolsistas desenvolvam algum projeto social como contrapartida. Marcicleide revela que a Escola de Referência Monsenhor Antônio de Pádua Santos, unidade estadual que funciona em tempo integral, melhorou os indicadores em português e matemática no Sistema de Avaliação Educacional de Pernambuco (Saepe). A presidente da autarquia de Afogados, Socorro Dias, confirma. “Vários colégios do Sertão do Pajeú que tiveram reforço ministrado por bolsistas do Proupe avançaram em avaliações como Saepe e Saebe”, diz Socorro.
Marcicleide vê com preocupação a não abertura de novas bolsas do Proupe – desde o meio do ano passado não houve ingresso de novos alunos no programa. “Na autarquia estou ensinando a turmas de 1º e 2º período da licenciatura em matemática. Muitos alunos entraram na faculdade com a perspectiva de conseguir vaga no Proupe. Sem bolsas, vão trancar ou abandonar o curso, o que é lamentável”, diz a professora.
A diretora acadêmica da Autarquia Educacional do Belo Jardim, Luzia Helena Castro, reforça a importância do programa para formar docentes. “As 13 autarquias pernambucanas desempenham um papel estratégico como formadoras de futuros professores. Já não é fácil encontrar jovens que queiram seguir o magistério. Sem bolsas será ainda mais difícil”, observa Luzia.
Na autarquia de Arcoverde, há 774 bolsistas de matemática, uma das áreas prioritárias do programa. “O Proupe trouxe um incremento fora do comum para as licenciaturas. Como é que o governo estadual diz que investe em educação e corta recursos para uma iniciativa que dá resultado e que fornece mão de obra em disciplinas carentes de professores como matemática?”, questiona o coordenador da disciplina, Jucelino Arcanjo.