Páginas rasgadas, textos riscados ou assinalados, capítulos inteiros arrancados. Essa é a realidade de alguns livros da biblioteca da Faculdade de Direito do Recife (FDR), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). As intervenções nas publicações comprometem o estudo de alunos cegos ou com baixa visão pois impedem a digitalização dos textos e posterior conversão em áudio. Para chamar a atenção do problema e conscientizar os estudantes, foi montada uma exposição no hall de entrada da faculdade, localizada na Boa Vista, área central do Recife.
A mostra, intitulada “Danos a tantos causados por poucos, preservar é preciso!”, fica em cartaz até 26 de março. Em quatro vitrines, foram colocados dez exemplares, dos quais cinco estão com páginas rasuradas, dois com folhas rasgadas, um com riscos e um com capiítulos arrancados. Ao lado de cada volume há dados bibliográficos (título, autor, ano, editora) e o valor da obra. Um deles está com edição esgotada e outro é importado. Todas as legendas estão também em braile.
“Atualmente são 25 livros retirados do acervo porque estão com esses problemas. Há mais volumes, mas esse número é o que identificamos até agora porque foram títulos solicitados pelos alunos que não enxergam. É um dano para os estudantes e uma violação do patrimônio público”, explica a coordenadora da biblioteca, Karine Vilela.
Como os exemplares estão fora de uso, há fitas de isolamento colocadas em cima das vitrines, numa referência à interdição dos livros. O prejuízo é estimado em R$ 2.500. “Para substituí-los levamos cerca de um ano”, diz Karine.
“Temos um scanner para digitalizar as obras. Depois, são enviadas para os alunos cegos. Por meio de um programa, o conteúdo é transformado em áudio para que eles possam estudar. Quando há trechos riscados, principalmente com marca-texto, o mais comum de acontecer, o equipamento não faz a leitura”, observa Karine. Estudam na FDR, hoje, duas alunas cegas e um com baixa visão.
“Precisei de um livro, no semestre passado, que não pode ser digitalizado porque estava riscado. Foi ruim porque fiquei dependendo de colegas para lerem pra mim e nem sempre há disponibilidade. O estudante só deve riscar se o livro for seu. Porque os da biblioteca são para todos os alunos estudarem”, comenta Ana Carolina Santos, 19 anos, aluna cega que está no 3º período do curso de direito.
ACERVO
É a terceira edição da exposição, realizada outras duas vezes, ano passado, no início dos semestres letivos. Embora a mostra possa ser contemplada por qualquer pessoa, os calouros são convidados a visitarem. “Quanto mais cedo alertamos os alunos para que não danifiquem os livros, melhor”, destaca a coordenadora da biblioteca. Segundo Karine, 13 estudantes são prejudicados semanalmente com a falta dos livros retirados de circulação.
A biblioteca tem 14 mil livros da Coleção Circulante, disponíveis para empréstimo; e 100 mil exemplares do Acervo Histórico, liberado apenas para consulta na FDR.
“Quem risca um livro presta um desserviço ao colega. Acabei de pegar um exemplar que estava riscado. De cada três volumes, em média ao menos um está marcado. Não consigo estudar com anotações que não foram minhas”, diz Wladson Moraes, 42 anos, aluno do 8º período de direito
“A tecnologia é importante, mas o livro não perde seu valor. É fonte de conhecimento. Já vi muitos alunos sem cuidar dos livros. O cuidado deve ser ensinado desde cedo, em casa”, afirma a bibliotecária aponsentada Leonice Ferreira, que por muito tempo cuidou do acervo da FDR.
“É um desrespeito riscar um livro. Vou à biblioteca duas ou três vezes por semana para pegar algum título emprestado. Quando o texto está riscado muitas vezes não dá pra estudar”, lamenta Moab Gouveia, do 3º período.