O prédio tem terraços com vista para o mar, um vão livre de 56 metros de extensão sem apoio de pilares na parte central (um dos maiores do Brasil), salas imensas para exposições, restaurante e café. Bacana não é? O problema é que nada disso funciona. O segundo módulo do Cais do Sertão, museu interativo implantado no armazém 10 do Porto do Recife, permanece com a obra paralisada e sem previsão de recomeço.
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Se tivesse sido inaugurado no prazo prometido – dezembro de 2014 – moradores e visitantes do Recife estariam frequentando o lugar há nove meses. E não espreitando o prédio por uma abertura no tapume que cerca a edificação, na calçada da Avenida Alfredo Lisboa. Aproveitando esse espaço vazio, o JC percorreu a obra inacabada e viu as paisagens que as pessoas deixam de contemplar, até o centro cultural ficar pronto.
Do terraço, projetado para ser um restaurante, é possível admirar o Parque de Esculturas criado pelo artista plástico Francisco Brennand, nos arrecifes, para celebrar os 500 anos do Brasil; a entrada dos navios que atracam no Porto do Recife, a Praia de Del Chifre (paradisíaca vista de longe), o Sítio Histórico de Olinda com o casario e seus quintais verdes e os prédios tão urbanos do Pina e de Boa Viagem, na Zona Sul do Recife.
Isso se você estiver olhando para o mar. Basta se voltar para o lado oposto, onde fica a cidade, e a vista alcança os prédios históricos do Bairro do Recife, da Boa Vista e de Santo Amaro (Paço do Frevo, Praça do Arsenal e seus pés de palmeira, Assembleia Legislativa, Ginásio Pernambucano, para citar alguns) em contraste com edifícios altos e modernos de outros bairros da capital pernambucana.
Mas, por enquanto, só há vigas de ferro, reservatórios de água, tonéis, manilhas, canos, bancos, telas, tijolos espalhados pelo chão. Até a placa de identificação da obra desabou. O imóvel de 16 metros de altura e 5,5 mil metros quadrados de área está com a estrutura pronta e parte das instalações foram executadas (ar refrigerado e elétrica). É preciso completar e fazer todo o acabamento.
“Para terminar o prédio, no estágio em que a obra se encontra, serão necessários mais 12 meses”, diz uma fonte consultada pelo JC. “O prédio é grande e essa etapa restante é muito minuciosa”, explica. Falta, por exemplo, o revestimento do pisos e colocar os elementos vazados que cobrirão toda a fachada – escondendo os aparelhos de ar condicionado – e simulam o solo rachado do Sertão. Cada cobogó tem um metro quadrado.
No passeio pelo futuro centro cultural, os repórteres encontraram lâminas d’água no terraço panorâmico e nas varandas do segundo e terceiro pavimentos, que têm vista para o mar. Aliás, no segundo andar, uma sala com divisórias de vidro estava com duas lâmpadas acesas, mesmo sem nenhum uso no local.
Barracos que deveriam servir de apoio para as obras estão destelhados e sem as tábuas da parede. Provavelmente foram roubados, apesar da vigilância mantida pelo Porto do Recife. Caixas com capacidade para 15, 10 e 5 mil litros de água estão cheias, porém com as tampas quebradas. Dois elevadores já encontram-se instalados, à espera do público.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco disse que a obra teve início em 2011, mas não informa desde quando está paralisada. Sem entrar em detalhes sobre a continuidade do Cais do Sertão, a instituição argumenta que “com a crise econômica e as barreiras do governo Federal para a concessão de empréstimos aos Estados, a segunda etapa do projeto depende de redefinição de fontes de financiamento.”
De acordo com a secretaria, o governo está negociando a verba para concluir a obra com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O orçamento para os dois módulos é R$ 97 milhões, sendo R$ 18,5 milhões da União e o restante do Estado. Já foram usados R$ 57 milhões.
Uma parte da verba custeou o primeiro módulo do Cais do Sertão, que corresponde ao museu inaugurado em abril de 2014 com exposição de longa duração dedicada ao cantor Luiz Gonzaga (1912-1989). É um espaço de 2 mil metros quadrados de área e recebe uma média de 12 mil visitantes por mês.
Outro pedaço dos R$ 57 milhões foi aplicado no segundo módulo, que tem potencial para ser um grande centro de convenções cultural. A Concrepoxi Engenharia e Construtora Gusmão fizeram a primeira etapa. Os dois prédios serão interligados, formando uma edificação de 7,5 mil metros quadrados.
O Museu Cais do Sertão é administrado pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG), que acaba de prorrogar o contrato com o governo por mais dois meses, até dezembro de 2015. “Vamos participar do novo edital de licitação que será publicado pelo Estado, para escolha dos próximos gestores, outras organizações devem concorrer”, diz Ricardo Piquet, presidente do Conselho de Administração do IDG no Recife e Rio de Janeiro.