Num mundo em que a expressão “crise hídrica” é pronunciada com uma frequência cada vez maior, descobrir formas de reaproveitar a água, evitando seu desperdício, é uma pauta inadiável. A boa notícia, no Dia Mundial da Água, que é celebrado hoje, é que um passo nesse sentido está sendo dado pelo programa Cidade Saneada, do governo do Estado, em parceria com a iniciativa privada, representada pela Odebrecht Ambiental. O projeto prevê o aproveitamento da água de esgoto para uso nos próprios serviços de manutenção da rede.
A ideia é tratar o esgoto separando o que é sólido do líquido, e depois purificar o resultado. Com isso, obtem-se uma água que não é potável, mas que é utilizada nos serviços de desobstrução da própria rede de esgoto. Antes disso, a tarefa exigia o uso de água própria para consumo humano. Com essa atividade, a economia que o sistema tem por dia é de 100 mil litros de água, o que equivale ao consumo diário de 700 pessoas. O resultado da purificação do esgoto também pode ser usado em tarefas domésticas como jardinagem e lavagem de calçadas, mas ainda está restrito às próprias estações da Compesa. Atualmente, existem duas unidades de tratamento de esgoto no Grande Recife: na comunidade de Dancing Days, no bairro da Imbiribeira, na Zona Sul da capital, e em São Lourenço da Mata.
O processo dura cerca de nove horas e envolve muita química e engenharia. O esgoto bruto, vindo das residências, chega à estação e passa pelo processo conhecido como gradeamento, onde ficam retidos os objetos sólidos encontrados na rede. São sacos plásticos, roupas, preservativos, absorventes, entre outros. De lá, passa para o equipamento conhecido como RAFA, ou reator anaeróbico de fluxo ascendente. É um compartimento fechado, onde bactérias que não precisam de oxigênio tratam de decompor as impurezas do esgoto. O material segue, então para quatro filtros biológicos, e de lá para a estação elevatória de esgoto. O penúltimo passo é o pavilhão de desinfecção, onde cada mil litros de água de esgoto recebem 40 quilos de um cloro especial. A partir daí, está pronto para abastecer os caminhões-pipa. Cada veículo tem capacidade para 3 mil litros, valor que é suficiente para seis desobstruções diárias da rede. Para encher o tanque vazio de um caminhão são necessários cinco minutos.
A utilização da água de reúso é uma tendência em países desenvolvidos, mas que ainda está engatinhando no Brasil. “É preciso uma tubulação específica para esse tipo de efluente, o que demanda um grande investimento em estrutura. Ou seja, falar disso, no Brasil, não é nem para médio prazo: é para muito longo prazo mesmo”, afirma o diretor de novos negócios da Compesa, Ricardo Barretto. Segundo ele, seria preciso uma mudança na legislação das próprias construções, que teriam de se adequar à nova realidade, com outra tubulação em seus projetos.
Mas há a boa notícia. O governo está mapeando pontos onde existe uma grande demanda por água que não seja necessariamente potável, como os pólos industriais, que realizam lavagens pesadas e resfriamento de máquinas de grande porte. “É o caso do Porto de Suape, no Litoral Sul, de Goiana, na Zona da Mata, e até mesmo do pólo têxtil do Agreste, em Toritama e Santa Cruz do Capibaribe. Estamos estudando como podemos levar a água de reúso para esses locais. A economia seria enorme”, acrescenta Barretto. A tendência é que a própria Compesa passe a utilizar a água em suas próprias dependências.