A Rua Azeredo Coutinho, no bairro da Várzea, Zona Oeste do Recife, guarda um raro exemplar da memória arquitetônica da cidade. Trata-se do casarão que abrigou, entre as décadas de 50 e 60 do século passado, o Hospital Odontológico Magitot, primeiro do gênero na América do Sul, e único representante do estilo chalé romântico com dois andares na capital. Apesar de histórico, o imóvel está abandonado há mais de 40 anos. Proprietária do terreno desde 2013, a Prefeitura do Recife prometeu, no ano passado, construir uma mercado público no local, mas nada foi feito até hoje. Cansados da longa espera, moradores do bairro formaram o coletivo Salve o Casarão da Várzea, que realiza na manhã de hoje uma ocupação cultural do espaço, como forma de cobrar providências ao poder público.
Em 2015, o prédio foi classificado como Imóvel Especial de Preservação (IEP). Três meses depois, a prefeitura anunciou a construção de um mercado público no pátio externo do casarão. Um total de 55 boxes ordenariam o comércio informal instalado nas calçadas que cercam a edificação. Porém, oito meses depois, o cenário é praticamente o mesmo das décadas de esquecimento. O casarão continua com a estrutura comprometida, sem piso e telhado. As intempéries consomem o que resta das portas, janelas e gradis que “ornamentam” o imóvel. A única intervenção nesse período foi a remoção de entulhos no prédio e no terreno. Durante a semana, 20 agentes da Empresa de Limpeza Urbana do Recife (Emlurb) retiraram 40 toneladas de detritos. Mas não há qualquer sinal de obra de restauração.
Inconformados, a comunidade resolveu tomar uma atitude. Formado há um mês, o coletivo Salve o Casarão da Várzea se articula principalmente pelas redes sociais. “O objetivo é promover uma grande limpeza e ocupar culturalmente o local. Convocamos moradores, líderes comunitários e movimentos sociais para construir consciência política e soberania popular aqui na Várzea”, conta Gleison Luiz dos Santos, um dos representantes do coletivo. A primeira ação foi no dia 2 de abril e hoje, às 8h, o coletivo se reúne na área externa do casarão para promover ações de conscientização com oficinas de hip hop, atividades artísticas e criação de uma horta comunitária, além de nova limpeza do lugar. “É uma maneira de criar uma ligação da população com o imóvel”, frisa o também integrante do coletivo Santiago Matos. No Facebook, até ontem, 70 pessoas haviam confirmado presença no evento.
Segundo a Prefeitura do Recife, a revitalização está dividida em duas fases. A primeira é a construção do mercado, que já teve processo licitatório concluído, no valor de R$ 1,3 milhão. A segunda fase será o restauro do casarão. Não há prazo para o início das obras, já que aspectos técnicos seguem sendo discutidos pela Diretoria de Preservação do Patrimônio Cultural. Seu Bia, comerciante há 28 anos na calçada do casarão, continua na expectativa de dias melhores para o prédio. “A espera é grande. Fizemos cadastro, entra e sai prefeito, mas nada é feito”, desabafa.