Ele era mais um entre tantos cachorros sem nome e sem lar que vagam pelas ruas da cidade. Perambulava nas imediações da Rua Margarida, no bairro de Areias, Zona Oeste do Recife. Na manhã da última sexta-feira, enquanto dormia em uma calçada, foi atacado por um morador da rua que, bêbado e durante um acesso de fúria, deu-lhe duas facadas. Sangrando muito, o animal foi socorrido pelos vizinhos, que o levaram a um veterinário, onde levou pelo menos 30 pontos. Após denunciar o caso pelas redes sociais, durante o final de semana, defensores dos direitos dos animais conseguiram com que o cão fosse adotado, na noite da última segunda-feira. De um “totó” de rua e quase morto, ele sobreviveu, ganhou um nome e um lar. Agora se chama Vicente e mora no bairro de Guararapes, em Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife.
O animal não foi adotado por nenhuma família de classe média ou alta, e sim por uma garota de 18 anos que vive sozinha com a filha de seis meses em uma casa de apenas um cômodo. Bruna Leite depende da família e do ex-marido para sobreviver, mas não pensou duas vezes ao ver, em uma rede social, o caso do cão covardemente atacado na rua. Esse caso acontece pouco mais de dois meses depois que um cachorro chamado de Vitório/Pepi, no Recife, reencontrou os donos numa feira de adoção após sete meses separados. À época, a história comoveu muito nas redes sociais.
“Senti uma tristeza enorme quando vi as fotos e fui buscá-lo na hora. Desde muito pequena que eu cuido de gatos que pego na rua. É a primeira vez com um cachorro”, diz Bruna.
Embora os ferimentos não representem mais perigo, Vicente ainda está debilitado. O pelo é ralo, a aparência é de cansaço e o andar apresenta uma certa dificuldade. “Mesmo assim ele ainda quer explorar a rua, é meio fujão. Mas é um doce de animal”, comenta a dona. Bruna está sem emprego – parou de estudar quando engravidou de Kevelin Sofia – mas não teme as despesas com o novo integrante da família: alguns militantes da causa animal se ofereceram para ajudar com ração e remédios. Na manhã de ontem, Vicente tomou o primeiro banho de sua vida nova (talvez até de toda vida), na calçada de casa, ajudado por vários vizinhos.
Mas a solidariedade veio de antes, ainda no momento em que ele foi atacado. A doméstica Ana Maria Oliveira testemunhou a agressão, gritou para que o homem parasse e chamou a polícia. “Ele tinha batido na mãe e estava bêbado. Resolveu descontar a raiva no pobre animal”, conta.
Pessoas igualmente humildes, como o gráfico Ewerson da Silva e a doméstica Jaciene da Silva, ajudaram a salvar a vida de Vicente. Ewerson pediu R$ 50 emprestados a um primo, para levar o cão ferido a um veterinário, e Jaciene bancou, a duras penas, no cartão de crédito, os R$ 185 que custaram o procedimento de sutura no animal. “R$ 50 pra mim é muito dinheiro. Mas eu jamais iria deixar ele morrer daquele jeito”, diz Ewerson.
O agressor foi algemado e encaminhado à Delegacia de Polícia do Meio Ambiente, onde foi interrogado. A agressão foi registrada na Delegacia do Consumidor, como Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) contra Bartolomeu Assis dos Santos, que deve responder por maus tratos.