Amor incondicional

Mãe escreve carta para marcar o 1º ano com o filho adotado

"Tenho 45 anos e fui adotada pelo meu filho de 18 anos", diz a engenheira Viviane Nogueira. No texto, ela prova que amor não se escolhe. Apenas se sente.

Ciara Carvalho
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Ciara Carvalho
Publicado em 25/05/2017 às 17:59
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"Tenho 45 anos e fui adotada pelo meu filho de 18 anos", diz a engenheira Viviane Nogueira. No texto, ela prova que amor não se escolhe. Apenas se sente. - FOTO: Foto: Arquivo pessoal
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A engenheira Viviane Nogueira, 45 anos, mora em Belo Horizonte e, contrariando todas as estatísticas e padrões, adotou um jovem de 17 anos. Willams era um dos garotos que apareciam no vídeo de lançamento do Projeto Adote um Torcedor, fruto de uma parceria entre o Sport Club do Recife e a Vara da Infância e Juventude da capital. Assim que viu o depoimento de Willams na gravação, Viviane teve certeza que tinha achado seu filho.


Abaixo, a carta escrita para marcar o primeiro ano deste encontro

No dia que comemoramos o Dia Nacional da Adoção, neste ano de 2017, também comemoro uma data muito importante pra mim. Estou comemorando 1 ano que fui adotada. Isso mesmo, você não leu errado. Tenho 45 anos e fui adotada pelo meu filho de 18 anos. E acreditem, o perfil dele era totalmente “aberto”, coisa difícil hoje em dia em relação às escolhas feitas pelos pretendentes. E foi uma experiência maravilhosa, única e divina. Foi tudo muito natural e tranquilo.

Quando eu e meu marido começamos a frequentar o grupo de apoio de adoção de Belo Horizonte, há 7 anos, que tanto nos ajudou, foi exatamente quando meu filho foi abrigado pela primeira vez. Coincidência? Não. Ele e nós estávamos sendo preparados para o nosso grande e lindo reencontro de almas.


Assim como nós, pais, ele foi ouvido pela psicóloga, pela assistente social e pelo juiz da Vara da Infância e Juventude. Ele também tinha um processo. Mas com uma enorme diferença, ele não tinha que preencher uma ficha colocando um perfil para os pais que ele idealizava. Ele não falou para o juiz que queria uma mãe branca, parda ou negra, não colocou limite para minha idade, não disse que só aceitava ser meu filho se fosse filho único ou que aceitaria apenas um irmão. Ele não quis saber quanto estava escrito no meu contracheque ou o quanto tinha em minha conta bancária. Ele não disse que aceitaria somente pais que morassem na mesma cidade que ele e mesmo que fossem de outro Estado, outra cultura, ele queria esses pais. Ele não disse que eu, mamãe dele, tinha que ser saudável ou que tivesse apenas doenças tratáveis. Sequer questionou se eu iria dar trabalho ou testar o amor dele por mim. Sim, os pais com sua enorme insegurança de serem ou não aceitos pelo filho também testam o amor do mesmo. Ele queria apenas ser filho.

Ele, assim como eu, também estava ansioso, estava há anos esperando e já estava perdendo a esperança por estar completando 18 anos e ter que sair do abrigo para ir viver sozinho no mundo.

Nós, apesar da longa espera, pelo menos podemos esperar pelo filho no aconchego do nosso lar, sabendo que um dia ele chegará, sem nos preocuparmos em ter que sair de uma hora pra outra da nossa casa. E ainda contamos com o apoio de familiares e amigos. Imagina o sofrimento dele, o medo, a insegurança que permeava sua cabeça... É justo? Sem ao menos ter a certeza de que seria adotado e que um dia teria uma família para lhe acolher. Vivendo com pessoas, que apesar de todos os esforços, não lhe dão o amor de uma mãe, de um pai e de irmãos. Não tem quem lhes dê motivações para estudar, escolher sua profissão, não tem um beijo de boa noite, não tem colo, não tem carinho, muito menos amor. Muitas vezes não tem sua própria roupa, tudo tem que ser dividido com os colegas do abrigo.

Quando o juiz perguntou a ele:

- Se seus pais vierem sábado que vem (daí a uma semana) para te buscar, você quer ir? – ele respondeu:

- Se eles vierem hoje eu vou com eles.

Isso mesmo, por incrível que pareça, pra ele não precisava de estágio de convivência para ver se sentiria empatia por nós. Apesar de não saber se iria ver estrelinhas ou se teria borboletas em seu estômago, quando nos visse pela primeira vez; ele estava de coração aberto. Ele tinha certeza que ia dar certo, e que não iria perder a família que há tanto tempo esperava.
Agora, depois de ter se passado um ano, sem nunca viver no seio de uma família, sabe que em todos os lares, temos nossas diferenças e opiniões diversas. Que temos nossos defeitos e nossas dificuldades, e que nós, pais, também erramos. E mesmo assim, ele nunca pensou em nos devolver e falar para o juiz que não queria mais essa família. Que ele iria voltar para o abrigo e “escolher” outra família melhor. Ele sabe que não existe filho perfeito assim como não existem pais perfeitos. Aprendemos e nos apoiamos uns com os outros.

Mas tínhamos que cumprir as exigências da lei e fui ao encontro do meu tão sonhado e desejado filho. No estágio de convivência, tivemos muitas conversas, mas nenhuma exigência. Seus olhos vivos e brilhantes apenas demonstravam a pureza de sua alma. Eu, mamãe, chorava muito, pois não estava acreditando que aquele encontro finalmente acontecia. Mas ele foi paciente e carinhoso comigo. Naqueles 10 dias de convivência eu mal dormia à noite e andava de um lado para o outro sem acreditar que meu filho estava ali no quarto ao lado. Mas ele simplesmente dizia:

- Mamãe, se acalme, agora estamos juntos para sempre!

Diante de alguns contratempos durante a viagem, ele simplesmente sorria e falava:

- Vamos enfrentar juntos, mamãe!

Quanta maturidade do meu menino de 18 anos...

A adoção é uma via de mão dupla e para que tudo dê certo, os filhos precisam adotar os seus pais também. Infelizmente, ainda vivemos numa sociedade preconceituosa e no mundo da adoção não é diferente. Muitas vezes esses preconceitos vêm dos próprios pretendentes.

Sempre digo que é possível realizar o sonho de ser pai e mãe quando o filho chega adolescente. Na verdade, não existe adoção tardia. Toda adoção acontece no tempo certo, no tempo de Deus! A adoção não tem idade. O adolescente também consegue ser filho. Ele também precisa de uma família como todos nós. E ele tem sim muito carinho e amor para nos dar assim como os pais também têm.

Há tantos e tantos adolescentes querendo ser filhos, querendo uma mãe, um pai, uma família... É uma experiência única, singular, ser mamãe de um filho que nasce pra gente na adolescência... É tão maravilhoso e gratificante ser adotada por um adolescente...

Maternar é descobrir o maior e mais puro amor que existe no mundo, amor que cresce a cada dia sem esperar nada em troca, sem fronteiras, sem idade, sem limites, sem exigências!

Viviane M. A. Nogueira
Mãe de Willams A. Nogueira

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