O conjunto habitacional que a Prefeitura do Recife deveria construir no Pilar, comunidade pobre do Bairro do Recife, virou exemplo de desperdício de dinheiro público. Em dois anos (2010-2012), apenas 48 unidades residenciais, das 588 prometidas, foram inauguradas. Um outro bloco, com 32 apartamentos, teve a obra suspensa nove meses atrás. A construção inacabada, a poucos metros do prédio-sede da prefeitura, está sendo saqueada, pichada e usada como sanitário.
Nem a presença de vigilantes impede a depredação dos apartamentos. Levaram portas, pias de lavar prato, bacia sanitária, interruptores de luz, fios e torneiras. O mato toma conta do chão e das paredes do prédio, que se encontra com 90% da obra executada, de acordo com a Empresa de Urbanização do Recife (URB). Tábuas quebradas no tapume que cerca o terreno permite o acesso de qualquer pessoa ao local.
“A obra parou um dia depois das eleições de outubro do ano passado (para escolha do prefeito da cidade)”, afirma José Zacarias da Silva. Morador do Pilar, ele recebe R$ 151 por mês para complementar o aluguel de outra casa, enquanto espera o apartamento no habitacional.
De acordo com as famílias, não há mais iluminação noturna no local. Os vigilantes tomam conta do patrimônio desarmados e no escuro. “Estamos abandonados e estão roubando tudo dos apartamentos inacabados. É o dinheiro público sendo jogado fora”, destaca um morador que prefere não se identificar.
“Nossa situação está pior, as ruas continuam com esgoto correndo a céu aberto e as casas desocupadas para as obras viraram depósito de lixo”, lamenta Maria Lucinete Pereira de Oliveira. “Está tudo se acabando e isso é dinheiro do governo federal para investimento em nossa comunidade”, diz José Pereira.
Sem o costume de viver em apartamento, as famílias transferidas para o único bloco inaugurado fazem queixas da nova forma de moradia. “Apesar de ter coletor, o lixo é jogado pela janela e o mau cheiro é horrível”, reclamam.
Severina Alves de Santana, uma das ocupantes, quer alugar ou vender o apartamento. “A prefeitura disse que não pode, mas não dá para viver aqui, com barata, escorpião, mosca e muriçoca. A água que sai da torneira fede”, afirma a filha dela, Rosineide Francisca de Santana.
O gerente de Engenharia da URB, Vicente Perrucci, disse que achados arqueológicos impedem a continuidade das obras. “O cemitério encontrado aumentou, há mais esqueletos e nenhuma definição sobre o que vão fazer no lugar”, argumenta.
Localizado no lote 2 da obra, o cemitério fica numa quadra ainda sem novas construções iniciadas. O bloco inacabado e saqueado está no lote 1 e, segundo Vicente Perrucci, também esbarra nas escavações arqueológicas, para implantação da infraestrutura – drenagem, ligação domiciliar de esgoto e de água.
Arqueólogas da Fundação Seridó, que trabalham no Pilar, informam que a pesquisa no lote 1 foi concluída. “Nessa quadra, nós só vamos acompanhar o serviço da prefeitura, quando tiver início a implantação da infraestrutura”, informa a arqueóloga Ana Catarina Torres.
Pesquisadores da fundação e da Universidade Federal de Pernambuco encontraram 34 esqueletos no cemitério, possivelmente dos séculos 16 ou 17, na Rua de São Jorge. Conforme Perrucci, os danos causados aos apartamentos serão corrigidos pela empresa que executa a obra, sem prejuízo ao município.
O habitacional é custeado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Caixa Econômica Federal e PAC do governo federal, no valor de R$ 39.385.289,59.
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