O Hospital psiquiátrico Ulysses Pernambucano, no bairro da Tamarineira, Zona Norte da cidade, está mergulhado no caos. Um dia a dia em que já conviviam a falta de medicamentos e precárias condições de higiene para funcionários e pacientes, passou a ganhar o indesejado reforço do fantasma da insegurança. Sem receber salários há quatro meses, os vigilantes da unidade estão em greve branca há cerca de um mês. Dão expediente para proteger o patrimônio, mas deixaram de auxiliar médicos e enfermeiros na contenção de pacientes com distúrbios mentais graves. O resultado é um previsível medo dos profissionais de saúde para realizar alguns procedimentos, como administrar medicamentos injetáveis. “Sem contar que um paciente violento é uma ameaça para outros, não só para os funcionários”, conta uma médica, em reserva.
A falta de segurança provoca transtornos já na emergência da unidade. Pacientes que chegam em estado de surto dificilmente podem ser medicados sem a ajuda dos seguranças. “Acontece muitas vezes de as famílias dessas pessoas também ficarem desesperadas com a situação e passarem a nos xingar”, revela outra médica do hospital. Uma paciente chegou a tentar agredir uma médica dentro do pátio enquanto a reportagem do JC estava no local. Não havia seguranças para evitar o pior. Sorte que ela foi acalmada por outras pessoas.
Também está prevista para a próxima segunda-feira a paralisação das equipes que fazem a limpeza da unidade, o que vai piorar um quadro que já não é dos melhores. Em alguns locais do pátio é possível ver fezes e restos de alimentos. Outro problema crônico do hospital é o acesso irrestrito de gatos a quase todas as dependências. É possível vê-los na emergência, enfermarias, pátio e até mesmo na copa. “Já vi um animal pular sobre a mesa e roubar o pedaço de carne que uma paciente comia. Também aconteceu de um deles tirar a sonda que alimentava com leite outro paciente, só para tomar o líquido”, relata um outro médico. Também faltam remédios indispensáveis para acalmar pacientes em estado de surto, como Diazepam e Haldol. E para completar o quadro, apenas nas duas últimas semanas, três pessoas fugiram de uma das cinco enfermarias da unidade.
Com a vigilância em ponto morto e um enorme terreno cheio de árvores, que à noite fica às escuras, surgiu outro problema. “Já houve assaltos a médicos e funcionários, dentro das dependências do hospital”, revela uma das plantonistas. A falta de segurança fez com que os doze médicos que fazem residência no Ulysses Pernambucano fossem proibidos de realizar algumas atividades práticas exigidas para a formação profissional de psiquiatra. “Não dá para arriscar a integridade das pessoas”, pondera um médico.
Apesar dos problemas, os profissionais garantem que não vão desistir de lutar por melhores condições para a unidade. “O Ulysses Pernambucano é um patrimônio da saúde mental, não pode ficar na condição em que está. A gente espera que as autoridades sejam sensibilizadas e cuidem para que tanto nós, funcionários, como os pacientes tenham dias melhores”, finaliza uma das médicas da equipe.
O Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), deverá entregar ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE), na próxima segunda-feira, um relatório sobre as condições do Hospital Ulysses Pernambucano, a Tamarineira. O Cremepe visitou a unidade psiquiátrica na última sexta-feira (14) e sua direção ficou estarrecida com o que viu. “A situação é preocupante em vários sentidos. Não há segurança para o trabalho dos profissionais de saúde, a higiene é precária, não existe extintor de incêndio ou rota de fuga na emergência, além de não haver sequer um laboratório no hospital”, comenta André Dubeux, vice-presidente da entidade.
Também chamou a atenção a grande quantidade de gatos circulando livremente por todo o hospital, inclusive deitados em macas destinadas aos pacientes. “Também avisamos aos setores de vigilância ambiental sobre o risco que é ter esses animais circulando livremente no local”, completa Dubeux. Para o vice-presidente, a segurança ainda é o maior problema. “Uma emergência psiquiátrica é um local conflituoso por natureza. É preciso dar, tanto aos profissionais de saúde quanto aos próprios pacientes, condições mínimas de convivência”. Há duas semanas, uma dupla de policiais da reserva é designada todos os dias para auxiliar na emergência do hospital. “Mas falta a convivência que os vigilantes têm e que facilita o trabalho”, comenta uma médica plantonista do hospital.
Por meio de nota, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) afirma que “não tem medido esforços para regularizar o repasse às empresas terceirizadas que prestam serviço” ao Hospital Ulysses Pernambucano (HUP) e que vem dialogando com a empresa Rima – responsável pela segurança da unidade – para que a situação “seja resolvida de forma responsável, sem prejudicar os funcionários”. Ainda de acordo com a nota, a SES tem solicitado apoio da Polícia Militar para que a segurança nas unidades seja reforçada.
A direção do hospital informa que já trabalha em um plano de requalificação e recuperação da estrutura de diversas áreas da unidade. Sobre os gatos nas dependências da unidade, a direção esclarece que já notificou os órgãos competentes e vem tomando medidas para solucionar o problema. Segundo a SES, além de orientar familiares de pacientes e funcionários para não alimentar os animais, telas de proteção estão sendo instaladas para impedir a entrada dos felinos na área interna do HUP. A direção também solicita que a população não abandone seus animais no terreno da unidade.