SALGUEIRO – Numa época em que a música brasileira passa por transformações e os jovens cada vez mais escutam estilos que parecem “descartáveis”, em Salgueiro, no Sertão Central, há uma turma de crianças e adolescentes fazendo o caminho inverso. Eles estão aprendendo teoria musical, lendo partituras e fazendo apresentações abertas à população. Eles integram o elenco da Orquestra Sinfônica Conviver – nascida dentro do Programa de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, da Secretaria de Desenvolvimento Social do município.
Iago Martins, 16 anos, Isaias Pereira, 11, Tayrine Farias, 17, Bruno Eliseu, 13, e Camila Rodrigues, 14, jamais imaginaram que um dia fossem tocar com desenvoltura bateria, trompete, sax tenor, flauta transversal e violino. Muito menos pensaram que um dia fossem ser aplaudidos de pé. Em comum, todos são jovens de origem humilde, moram em bairros da periferia e frequentam escolas públicas.
Todos faziam parte de outros projetos do Conviver e começaram a iniciação musical pela flauta doce. Quando a proposta da orquestra foi delineada, eles fizeram testes de aptidão para definir os instrumentos com os quais tivessem afinidades. Hoje a orquestra conta com 32 músicos aprendizes com idades entre 10 e 18 anos.
“Já gostava de flauta doce e após assistir a um vídeo com um músico profissional tocando e falando sobre flauta transversal me interessei. Agora quero ir além”, diz, entusiasmado, Bruno Eliseu, morador do bairro Santa Margarida, que sonha em ser advogado, mas sem deixar a música de lado. Ele gosta de ouvvir clássicos da MPB e um pouco de sertanejo.
Eclética, Tayrine Farias, moradora da Cohab, gosta de vários estilos, desde que sejam alegres e dançantes. Gosta muito do sax tenor. Para ela, é um instrumento difícil, que aguça a sensibilidade de quem ouve e toca, seja qual for o ritmo. “Quando deixei a flauta doce e o sax chegou às minhas mãos, fiquei encantada. No começo achei difícil, mas agora estou me familiarizando”, diz a garota que para o futuro pretende cursar administração.
Todos chegaram meio que de “para-quedas”, como eles mesmo dizem, na formação da orquestra. Desde julho começaram a ter aula de teoria musical três vezes por semana. O maestro Jacson Anjos diz que tem sido um processo delicado e cuidadoso, que nenhum desses jovens perdesse a motivação. “Começamos do zero, mostrando a necessidade de cada instrumento numa orquestra e as funções específicas em cada estilo musical", observa o músico.
Na rotina de aulas, eles estudam três vezes por semana teoria musical e durante dois dias ficam livres com seus instrumentos para colocar a prática em dia. Na estreia para o público, mergulharam no universo nordestino a partir de Luiz Gonzaga. Depois visitaram clássicos da MPB. Em dezembro, cumpriram uma agenda de apresentações com canções de Natal e mostraram o talento em shows na Catedral da cidade, na Upae de Salgueiro e no Lar São Vicente de Paulo.
Com a proximidade do Carnaval, os jovens agora vão encarar o universal do frevo e marchinhas. Segundo o maestro, as aulas nesse período serão focadas em Capiba, Antônio Maria, Maestro Duda, Spok, Alceu Valença, Carlos Fernando entre outros. “Todos estão entusiasmados por que vão tocar pra massa. Eles estão fazendo história”, completou o Jacson Anjos.
O PROJETO
Com apenas seis meses de formação, a Orquestra Sinfônica Conviver já apresenta bons resultados dentro da sua proposta, que é desviar os jovens da situação de risco como a prostituição, acesso às drogas, abuso sexual e, principalmente, trabalho infantil. A orquestra é apenas uma das diversas ações coletivas dos serviços do programa Conviver, desenvolvido com recursos do Governo Federal, incluindo a contrapartida e execução da Prefeitura.
Além de crianças e adolescente, os idosos também são contemplados em atividades do programa, que inclui oficinas de música, percussão, teatro e artes plásticas. De acordo com a diretora de Assistência Social do município, Regina Ribeiro, a meta é neste semestre chegar a um número estipulado pelo projeto de 1.005 pessoas atendidas.
“De certa forma mobilizamos uma rede que envolve os órgãos de proteção. Há casos em que vamos buscar essas pessoas assistidas quando há denuncias, enquanto outros chegam por indicação de instituições ou voluntários. Quando elas são amparadas, passamos a acompanhar a rotina distante ou perto da família e ai encaixamos cada pessoa nessas ações", ressalta. A Orquestra Conviver, por exemplo, conta com mais de 30 pessoas, mas pode ganhar novos talentos.