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Depois que a Organização das Nações Unidas (ONU) defendeu a descriminalização do aborto em meio à epidemia de zika, que tem sido relacionada ao avanço dos casos de microcefalia, as discussões em torno do assunto ganham mais fôlego nas esferas legais, religiosas, éticas e médicas. Especialistas admitem que o tema é complexo, mas que precisa ser debatido com cautela. Um detalhe importante diante desse assunto está relacionado ao diagnóstico intraútero tardio da microcefalia, que geralmente tem sido dado após a 30ª semana de gestação, quando o aborto não é mais uma possibilidade.
“Nesse ponto, o termo seria interrupção prematura da gravidez. Nessas condições, o bebê vai nascer vivo. E quem é que vai decidir se ele vai continuar vivo ou não?”, questiona o coordenador de Medicina Fetal do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (Cisam), Pedro Pires. Para ele, a discussão é bastante ampla e, por isso, muitos questionamentos e dilemas éticos ainda devem aparecer. “O foco seria discutir o aborto nas pacientes que estão grávidas e sabidamente se infectaram pelo zika vírus no começo da gravidez. É uma outra discussão. Ainda assim, a infecção pelo zika na gestação não garante que o bebê vai ter microcefalia”, acrescenta o médico.
Um estudo publicado na quarta-feira (10), no periódico científico The New England Journal of Medicine, relatou o caso de uma jovem da Eslovênia, que foi infectada por zika em Natal (RN) no primeiro trimestre da gestação e optou por interromper a gravidez na 32ª semana, quando foi confirmado o diagnóstico de microcefalia. Foram detectadas sérias lesões cerebrais no feto. O procedimento foi permitido por dois comitês de ética (um nacional e outro do hospital onde foi atendida).
No Brasil, a legislação permite o aborto em três casos: gravidez resultante de estupro; situações em que há risco de morte para a mãe; e quando o feto apresenta anencefalia. O presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, dom Sérgio da Rocha, critica o aborto em casos dessa anomalia congênita causada pelo vírus zika. “Nós precisamos valorizar a vida em qualquer situação ou condição que ela esteja. Menos qualidade de vida não significa menor direito a viver ou menos dignidade humana”, diz.
Para a médica Helena Maria Carneiro Leão, coordenadora da Câmara de Bioética do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), o Judiciário será o primeiro a ter que se posicionar sobre a possibilidade de interrupção da gestação nos casos de microcefalia porque as solicitações para o procedimento serão uma realidade. “É uma situação grave e que precisamos enfrentar. É desagradável pensar nisso, mas devemos considerar o princípio da autonomia, da dignidade e da liberdade”, frisa Helena.