Saúde

'Voltaremos a ter epidemias; é grave', alerta pediatra sobre riscos da baixa cobertura de vacinas

Médico defende a vacinação como uma das maiores conquistas na saúde pública. Nesta entrevista, ele alerta para a necessidade de uma mobilização que derrube as ameaças à imunização

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 10/03/2019 às 12:36
Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
Médico defende a vacinação como uma das maiores conquistas na saúde pública. Nesta entrevista, ele alerta para a necessidade de uma mobilização que derrube as ameaças à imunização - FOTO: Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
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Presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco (Sopepe), o médico Eduardo Jorge da Fonseca Lima, 54 anos, defende a vacinação como uma das maiores conquistas na saúde pública. Nesta entrevista, ele alerta para a necessidade de uma mobilização que derrube as ameaças à imunização.

Eduardo Jorge da Fonseca Lima é presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco (Foto: Bobby Fabisak/JC Imagem)

O movimento antivacina, que tem crescido em todo o mundo, é uma das principais ameaças à saúde?

EDUARDO JORGE DA FONSECA – É uma mobilização feita por quem rejeita completamente a imunização. É um grupo pequeno que faz muita zoada. Mas os hesitantes são a nossa maior preocupação, pois representam uma fatia maior da população. São pessoas que tomam algumas vacinas, recusam outras e adiam a imunização. Esse é um grupo que precisa ser trabalhado e convencido, bem mais do que os que são antivacinas, pelos quais pouco podemos fazer porque são muito radicais; é como se fosse uma seita. E o pior: eles existem em todos os países desenvolvidos.

Qual o perfil das pessoas que recusam totalmente as vacinas?

EDUARDO JORGE – Um estudo investigou o que as pessoas pensam desta afirmação: “De modo geral, penso que as vacinas são seguras”. No mundo inteiro, 13% discordam dessa afirmação. Na França, contudo, 41% não concordam com a proposição. Isso faz perceber que o fenômeno independe de classe social, nível de desenvolvimento de um país e escolaridade. Outro estudo revelou que, entre o grupo que não leva os filhos para se vacinar, a percepção é de que a não imunização é capaz de evitar riscos à saúde. Ou seja, é um conceito equivocado de que proteger é não vacinar. E assim vêm os mitos; é preocupante. Duvido que esse movimento pare. Dessa maneira, vamos voltar a ter epidemias de doenças erradicadas como pólio, que pode ser controlada facilmente quando a cobertura vacinal é alta. Se a taxa baixa e aparecem casos importados (de outros países), a doença volta porque a população não está devidamente imunizada. Na Itália, por exemplo, houve o maior surto de sarampo dos últimos 30 anos, em 2017 e 2018. Estudaram as crianças doentes e perceberam que não tinham se vacinado. Os pais alegaram a não imunização por medo de autismo ou outros danos.

Conscientização

A tríplice viral, então, foi erroneamente acusada de causar autismo?

EDUARDO JORGE – Tudo começou com um médico inglês que publicou um artigo associando essa vacina ao autismo. Isso deu um estrago enorme. Posteriormente, descobriu-se que esse médico estava a serviço de uma indústria de laboratório. Ele perdeu o registro profissional, e a revista científica que publicou o trabalho teve que retirar o conteúdo. Em seguida, vários outros estudos, com mais de 500 mil crianças que foram acompanhadas por 15 anos, revelaram que a incidência de autismo entre as vacinadas foi praticamente a mesma do que a taxa encontrada nas que não foram imunizadas. Ou seja, há hoje comprovação de que a vacina não leva ao autismo.

Se as vacinas ainda continuam rodeada de mitos, nos quais a população acredita, qual a postura que profissionais devem ter para fazer a conscientização?

EDUARDO JORGE – Os médicos e demais profissionais de saúde geralmente não são treinados para ter argumentos convincentes. Então, precisamos trabalhar nas melhores evidências e perguntar às famílias quais são os medos que elas têm sobre as vacinas. Devemos esclarecer os questionamentos item por item. É preciso conversar mais com a população e não esperar que os pacientes apresentem receios. Podemos nos antecipar e perguntar se eles têm dúvidas sobre a imunização. Se esse diálogo não existir, corremos o risco de os pais saírem com a receita do consultório e não sentirem segurança. A nossa missão é fazer um debate de forma mais corajosa com as famílias.

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