Brincante

Antonio Nóbrega: um homem ambivalente

Artista pernambucano radicado em São Paulo é homenageado do Festival de Circo do Brasil

Mateus Araújo
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Mateus Araújo
Publicado em 30/10/2014 às 6:05
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Artista pernambucano radicado em São Paulo é homenageado do Festival de Circo do Brasil - FOTO: Divulgação
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Em meio a um Sertão alaranjado, empoeirado, azulado e acinzentado, Tonheta mambembeia, carregando consigo poesia, sorriso, passos acrobáticos e cores que fazem o universo lúdico e extravagante de um grande palhaço brasileiro. Em Brincante – O filme, dirigido por Walter Carvalho, Tonheta é o fio condutor de versos e rimas feitos em imagem sobre a vida e a obra (coisas inseparáveis) do artista Antonio Nóbrega, o corpo físico daquele personagem, e o homenageado deste ano do Festival de Circo do Brasil. O longa-metragem de rica plasticidade, beleza musical e sensibilidade poética tem pré-estreia marcada para a próxima segunda-feira (3) no Recife e é uma das atrações do festival, que contará ainda com exposição, espetáculo e show de Nóbrega.

“Eu não consigo ainda captar a sensação do espectador. O filme parece comigo: não se fixa num lugar, não é uma ficção rigorosamente falando, nem apenas um documentário. Mas é um pouco de tudo isso. É um filme curioso”, diz o artista pernambucano sobre o filme, exibido pela primeira vez no Festival de Cinema do Rio de Janeiro, no início do mês, na sessão Première Brasil — Hors Concours Documentário. Dono de uma inesgotável versatilidade artística (no currículo ele assina ator, bailarino, cantor e compositor), Antonio Nóbrega é um homem ambivalente, como cabe a todo brincante – e como ele mesmo se classifica. “A palavra brincante tem este sentido: não só o do artista popular que faz sua atividade, mas que se diverte enquanto a faz. Usufruindo do ato de atuar e representar, ele brinca”, explica o artista.

Em 1976, quando estreou o espetáculo Bandeira do divino, Antonio Nóbrega deu os primeiros passos para a criação de Tonheta, que no futuro se transformaria no seu grande personagem. “Naquele momento, ele se chamava Mateus Presepeiro. Estava colado à figura do Mateus, personagem essencial dos folguedos populares, sobretudo do cavalo-marinho. Vem do Mateus essa marcar cômica corporal e estrutural de Tonheta. Como devo também, numa medida mais enxuta, aos velhos dos pastoris. Com destaque para o Velho Faceta, o seu Jones Francisco da Silva, que eu ia sempre assistir na praia do Janga, e de onde vêm as minhas expressões faciais”, explica. Unindo as referências populares a pinçadas de figuras como Otelo e Oscarito, das chanchadas, e de Charles Chaplin, da comédia musical, nasceu Tonheta.

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No filme Brincante, a dupla João Sidurino (Nóbrega) e Rosalina (Roseane Almeida, esposa de Nóbrega) faz o percurso Nordeste-Sudeste em um caminhão, levando uma espécie de teatro mambembe. “João é o ‘pai’ de Tonheta, ele que o cria e imagina. João é o alter ego de Tonheta. E eu sou o alter ego de João”, explica Nóbrega. Neste trajeto lúdico e bonito, o diretor Walter Carvalho conseguiu costurar as andanças e chegadas de Tonheta pelas brenhas e pela metrópole, fazendo do longa-metragem essa narrativa musical na qual sintetiza com precisão a história de Nóbrega.

O trabalho foi gravado em 20 dias, no interior pernambucano, no Recife e em São Paulo, mas há quatro anos o projeto já vinha sendo pensado. Essa é quarta parceria entre Walter Carvalho e Antonio Nóbrega. Antes, os dois já haviam assinado juntos DVDs de Nóbrega. O primeiro foi em 2002, Lunário perpétuo. “É bom dizer que o filme é do Walter. Eu sou apenas o fotografado. A ele pertence a obra. Walter é uma pessoa que, me parece, tem um respeito bastante grande pelo meu trabalho, do mesmo modo que eu tenho por ele”, pontua.

Confira a programação completa do festival:

 

A VOLTA DE TONHETA

Homenageado desta edição do Festival de Circo do Brasil, cujo tema é Somos Todos Brincantes, Antonio Nóbrega, que se diz lisonjeado com a celebração, vai presentear os recifenses com uma minimaratona de apresentações. “É uma honra, ainda mais se tratando de um evento cuja natureza é a atividade circense, porque meu trabalho guarda essa característica circense. Mesmo que indiretamente, o circo sempre esteve presente. Tonheta é de natureza circense. Ele é um palhaço um bufão”, diz o artista, que é tema de uma exposição fotográfica inaugurada amanhã, ao meio-dia, na Galeria Janete Costa, com imagens e curadoria de Walter Carvalho.

No sábado, Nóbrega apresenta o espetáculo Tonheta e companhia, às 20h, no Teatro Luiz Mendonça, com fragmentos de cenas e histórias vividas pelo seu personagem. E no domingo, na esplanada do Parque Dona Lindu, ele faz um show gratuito, no qual canta suas composições e revive um repertório com canções de Dorival Caymmi e Luiz Gonzaga. “São dois compositores importantes. Um, falava do mar, das batidas, dessa herança negra; o outro, falava do Sertão. Vai ser bom as pessoas me verem cantando o trabalho dos dois.” Na segunda-feira, no Cinema da Fundação, encerrando essa sua presença no Festival de Circo, Nóbrega participa da pré-estreia do filme Brincante. Neste dia, serão duas sessões: uma às 19h20 e a outra às 21h10.

Leia a matéria completa no Caderno C desta quinta-feira (30).

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