TEATRO

Nova edição de Auto da Compadecida traz ilustrações de Dantas Suassuna

A peça mais famosa de Ariano Suassuna foi interpretada pelo filho do escritor paraibano

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 03/07/2018 às 21:36
Dantas Suassuna/Divulgação
A peça mais famosa de Ariano Suassuna foi interpretada pelo filho do escritor paraibano - FOTO: Dantas Suassuna/Divulgação
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Mesmo antes de nascer, já estava marcado que o artista plástico Dantas Suassuna teria uma relação especial com uma das obras do seu pai, Auto da Compadecida. Foi o sucesso da peça, escrita em 1955, que fez Ariano Suassuna comprar a sua famosa casa na Rua do Chacon, onde Dantas nasceria e o autor moraria até seu encantamento, em 2014. A partir daí, em encenações, adaptações e leituras, o texto não deixaria de acompanhar o filho, hoje responsável por cuidar da obra do pai.

O texto mais famoso de Ariano, adaptado para TV e para o cinema, ganhou agora uma nova edição pela Nova Fronteira. Parte do processo de republicação das obras de Ariano após a sua morte, o título era um dos que tinha o texto bem definido por Ariano ainda em vida. Ainda assim, ganhou o cuidado gráfico do novo projeto editorial, feito por Ricardo Gouveia de Melo, e ilustrações inéditas de Dantas.

Para forjar a sua versão da famosa história de João Grilo e Chicó, Dantas mergulhou no que foi, no início de sua trajetória, a base do seu trabalho, como as xilogravuras do cordel e a arte rupestre. “Voltei a isso já como um artista amadurecido”, comenta.
Quando, em 2013, conversou com seu pai e com Carlos Newton sobre o projeto de Ariano para reunir em uma só editora a obra que produziu, ouviu do pai que deveria fazer ilustrações para a peça. Era uma aproximação do legado que, por muito tempo, manteve distante para desenvolver uma caminho artístico próprio.

“Quando ele estava vivo, eu não chegava muito perto da obra do meu pai. Ele já estava ali para trabalhar com o seu universo. Com o encantamento dele, eu me senti no direito de continuar o que ele fez”, conta Dantas. Nesta sexta (6/7), ele inaugura a nova ala do Cais do Sertão com uma exposição intitulada Avoenga. O nome, que significa o “direito de herdar”, é preciso: o artista criou mais de 20 pinturas baseada nas imagens do livro Ferros do Cariri, de Ariano.

Carlos Newton Junior, crítico literário e responsável pela organização da obra de Ariano, conta que o autor fez algumas modificações em vida no texto do Auto da Compadecida. “Com o tempo, ele foi revisando a obra dele. Ariano escreveu o Auto quando tinha 28 anos, era o texto de um jovem. Já perto dos 80 anos, revisou o texto, enxugou trecho, tirou palavras”, conta o pesquisador.

Para o crítico, o Auto é a principal peça de Ariano, “ainda que ele considerasse a sua preferida A Farsa da Boa Preguiça”. “É o Auto que dá a Ariano uma dimensão nacional, que indica o caminho do teatro dele, baseado no cordel e no cancioneiro popular. Ele já havia feito isso antes, mas essa é a peça mais elaborada na carpintaria teatral, é o carro-chefe da obra dele”, explica Carlos.

CENSURA

Em tempos de cancelamento de uma peça teatral por pressões políticas e religiosas, como é o caso de O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu, vale lembrar que, embora hoje seja vista como um clássico, a peça de Ariano já foi acusada de ser anticlerical e até teve uma adaptação cinematográfica censurada, A Compadecida, de 1959. Na época, Ariano expressou ao JC estranheza com a decisão: “padres, frades, bispos e outros religiosos se pronunciaram de modo favorável ao trabalho, desconhecendo assim os aspectos anticlericais apontados pelos censores”. “A perseguição se dava pela peça ter um Cristo negro e pelas críticas à Igreja. Ariano dizia que a Igreja não eram seus homens, e sim os seus santos”, comenta Carlos Newton.

O próximo projeto com a obra de Ariano é a publicação de uma caixa com quatro volumes com o teatro completo de Ariano, incluindo textos inéditos. Os livros vão se dividir entre comédias, tragédias, entremés (peças curtas, de um só ato) e traduções. São vinte peças e três traduções no total, com uma iconografia das montagens e uma cronologia do autor. Os dois planejam a obra ainda para este ano.

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