Maratona cênica

Feteag chega à 29ª edição com espetáculos questionadores

Com programação no Recife e em Caruaru, curadoria investiu ainda em atividades formativas

Márcio Bastos
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Márcio Bastos
Publicado em 16/10/2019 às 11:51
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Com programação no Recife e em Caruaru, curadoria investiu ainda em atividades formativas - FOTO: Divulgação
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O Festival de Teatro do Agreste (Feteag) inicia sua 29ª edição com uma programação marcada pela pluralidade e por colocar em pauta questões relacionadas às vivências das minorias, na contramão do obscurantismo e da censura que assombram a esfera federal. Com curadoria de Fábio Pascoal e Marianne Consentino, o evento abre suas atividades, todas gratuitas, com o espetáculo Martin Luther Propaganda Symposium (Suíça), dias 16 e 17 de outubro, às 19h, no Teatro Barreto Júnior. A mostra de Caruaru tem o pontapé inicial 17 de outubro com Josefina la Gallina Puso Un Huevo en La Cocina, do Vaca 35 (México), às 20h, no Teatro Rui Limeira Rosal. Na capital pernambucana, as atividades seguem até este domingo (20). No Agreste, as peças acontecem até o dia 26 deste mês.

Assim como nas edições anteriores, este ano o Feteag continua o investimento não só na fruição de espetáculos, mas também nas ações formativas. Além de debates, oficinas e residência artística, o festival busca reforçar a Mostra Estudantil, estreitando os laços com a Universidade Federal de Pernambuco. A intenção, também, é aproximar o público da produção universitária, que, assim como a cultura, é alvo de ataques por parte do Governo Federal.

É nesse contexto questionador, com trabalhos autorais e de fôlego, que o suíço Boris Nikitin apresentará três encenações, todas com legendas em português, começando por Martin Luther Propaganda Symposium. O espetáculo aborda de forma inventiva questões filosóficas da contemporaneidade. Enquanto um coral (formado por artistas locais, que tiveram treinamento há algumas semanas) entoa evangelhos e canções de Natal clássicas, o ator Malte Scholz provoca o público com questões sobre liberdade.

“Sou fascinado pelos conceitos de propaganda, falsificação e imitação há muito tempo. Para mim, eles indicam o aspecto produtivo da realidade, mas também da fé. Por um lado, a realidade é sempre o resultado da manipulação pelas forças que têm os meios de produção para proliferar as normas que são úteis para eles. Mas, ao mesmo tempo, lembro disso porque a realidade não é fixa, também posso ter um impacto nela. É muito importante não esquecer isso. A peça é uma apropriação ateísta de um sermão evangélico (...) Todo o sermão é sobre o ato de crer, ou ainda, a decisão de acreditar, que pode ser uma decisão muito radical, como sabemos. No sentido positivo e destrutivo. Interessa-me onde a crença religiosa e a crença/ideologia sistêmica ou política se cruzam. Por que e como acredito nessa realidade que me cerca? Por que aceito sua violência? Como posso lidar com isso? Como eu posso lutar contra isso? Para mim, essas são questões fundamentais que costumavam ser também os fundamentos do cristianismo. A peça é uma maneira de reler os Evangelhos procurando por seu potencial político subversivo. Ao mesmo tempo, gosto de fazer um sermão sério em um teatro. Isso é realmente absurdo. Mas também é real. Todas as perguntas da peça são realmente importantes para mim. Gosto de brincar com essa ambivalência. E eu gosto da travessura que existe nisso”, afirmou Boris em entrevista por e-mail.

PROJETOS

Além de Martin Luther..., ele apresenta Hamlet e Tentativa de Morrer, dia 18 de outubro, às 19h e 21h, respectivamente, no Teatro Barreto Júnior; e 20 de outubro, às 19h e 21h, no Teatro Rui Limeira Rosal, em Caruaru. Em Hamlet, ele não adapta o texto de Shakespeare, preferindo investigar o personagem a partir de seu caráter subversivo e fundindo-o à história da performer Julia*n Meding, que está em cena.

“Nunca é realmente claro o que está acontecendo com ele. Está realmente ficando louco ou está apenas fingindo? Ele está falando sério ou está jogando um jogo irônico? Ele é ou não é? Essa ambivalência é muito interessante e pode ser também vista quase como uma estratégia política. Ele subverte as regras da realidade, começando a brincar com elas. Nossa peça é um retrato de Hamlet e, ao mesmo tempo, de Julia*n Meding”, explica. “Nosso Hamlet é uma figura dupla. Ele é e não é o mesmo tempo. Não dizemos ‘ser ou não ser’, mas ‘ser e não ser ao mesmo tempo’”.

Já Tentativa de Morrer é um solo com o próprio Boris em cena. Nele, o ator, diretor e dramaturgo aborda a doença do pai, que sofria de esclerose lateral amiotrófica, doença do sistema nervoso que enfraquece os músculos e afeta as funções físicas, e suas próprias questões.

“Após o diagnóstico, meu pai disse a mim e aos meus irmãos que ele estava pensando em um suicídio assistido. É uma forma de eutanásia, legal na Suíça. Existem associações que facilitam essa opção para pessoas com doenças letais. Agora, dizer aos seus filhos que você pensa em se matar é provavelmente um dos maiores tabus que você pode imaginar. No entanto, no nosso caso, mudou muito – para melhor. Acho que o seu último ano foi o ano mais aberto e íntimo que passei com meu pai (...) Na peça, combino esta história com minha própria saída do armário como gay, há 20 anos. A peça toda é sobre essas duas histórias, sobre esse ato de mostrar que alguém está na frente dos outros, sobre o risco e os potenciais que existem neste ato. É, antes de tudo, uma peça sobre vulnerabilidade, que aprendi a ver não como algo que temos que esconder, mas como uma habilidade. Trabalhar nesta peça me deu a oportunidade de aprofundar-me em perguntas e experiências que todo mundo tem: como lidar com doenças e morte? Como lidar com a perda de entes queridos? Como lidar com o medo de se expressar, o medo dos outros, o medo de si mesmo? Enquanto trabalhava nela, e após o sucesso da peça, percebi que esse é o privilégio, mas também o dever de ser um artista: dedicar tempo a trabalhar em questões fundamentais e que a maioria das pessoas não tem tempo para se concentrar, porque estão ocupadas com a vida cotidiana. Mas artistas podem fazer isso. Eles fazem isso por si mesmos, mas podem fazê-lo também pelos outros”, enfatizou.

CONFIRA A PROGRAMAÇÃO COMPLETA DO 29º FETEAG:

Quinta-feira, 17 de outubro
Josefina la Gallina puso un huevo en la cocina - VACA35 (México)
Hora: 20h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Sexta-feira, 19 de outubro
Adaptação do Teatro de Açucar – França/Brasil
Hora: 20h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Apenas o Fim do Mundo – Grupo Magiluth de Teatro (Recife)
Hora: 17h e 20h
Local: Museu do Barro

Sábado, 20 de outubro
Hamlet (Suíça)
Hora: 19h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Tentativa de Morrer – Suiça
Hora: 21h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Domingo, 21 de outubro
No silêncio da Palavra
Hora: 20h
Local: Academia das Cidades, Bairro São João da Escócia


Segunda-feira, 22 de outubro
Cartas – Coletivo Caverna (Recife)
Hora: 20h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Terça-feira, 23 de outubro
Mulher Barro – Naomi Silman (Campinas)
Hora: 11h e 16h
Local: Marco Zero de Caruaru

Soledad: A terra é fogo sob nossos pés – Hilda Torres (Recife)
Hora: 20h
Local: Marco Zero de Caruaru

Quarta-feira, 24 de outubro
Mulher Barro – Naomi Silman (Campinas)
Hora: 11h
Local: Marco Zero de Caruaru

Opá, uma missão – Lívia Falcão (Recife)
Hora: 20h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Sopro D'Água – Gabriela Holanda (Olinda)
Hora: 22h
Local: Teatro Licio Neves

Quinta-feira, 25 de outubro
Meia Noite - Orum Santana (Recife)
Hora: 20h
Local Teatro Rui Limeira Rosal

Das coisas dessa Vida – Ricardo Fagundes (Salvador)
Hora: 22h
Local: Teatro Licio Neves

Sexta-feira, 26 de outubro
Antílope – Flávia Pinheiro (Recife)
Hora: 17h
Local: Teatro Lício Neves

Julienta Mais Romeu – Grupo Asavessa de Teatro (Natal)
Hora: 20h
Local: Estação Ferroviária de Caruaru

Mostra Estudantil
Terça-feira, 22 de outubro
Memórias da Emília – Grupo de Teatro Ená Iomerê (Colégio Diocesano de Caruaru)
Hora: 10h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Quarta-feira, 23 de outubro
Um menino num rio chamado tempo - Núcleo de Pesquisa em Teatro para Infância/UFPE (Recife)
Hora: 10h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Quinta-feira, 24 de outubro
O dia em que os gatos aprenderam a tocar Jazz - Curso de Teatro da UFPE (Recife)
Hora: 10h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Sexta-feira, 25 de outubro
O que é? O que é? - Curso de Teatro da UFPE (Recife)
Hora: 10h
Local: Teatro Rui Limeira Rosal

Atividades Complementares
Mediação Cultural – Lições de um Palco sem Fim
Mediadora: Arary Marrocos
Data: 14 a 18 de outubro
Local: Escolas da Rede Pública de Ensino de Caruaru

Sábado, 26 de outubro
Lançamento do Livro – Mágico Alakazam, 50 anos de Alegria e Sucesso
Autor: Moisés Monteiro de Melo Neto (Recife)
Hora: 16h
Local: Academia Caruaruense de Cultura Ciências e Letras

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