Exposição

Para conhecer o artista Gilberto Freyre

Mostra enfoca relação de Gilberto Freyre com as artes plásticas através das amizades e de desenhos, pinturas e textos

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 22/03/2016 às 6:18
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    Gilberto Freyre inaugurou, no Brasil, um ramo de pensamento no qual aspectos da vida mais ordinária e cotidiana seriam tanto ou mais importantes que os fatos grandiloquentes para explicar as dinâmicas de nossos padrões sociais. O cozinhar, o vestir e, dentre tantos outros, o pintar e desenhar poderiam também nos explicar. Sobretudo a partir dos anos 1930, Freyre começou a publicar uma série de artigos em que defendia que o uso respeitoso da luminosidade do Nordeste poderia, como de fato aconteceu, pavimentar uma pintura vigorosamente afirmativa e original. “Nossos pintores têm vivido alheios à paisagem, que os desorienta sem dúvida pela dessemelhança de cor e de luz da europeia em cujo contato sua técnica se oficializa languente”, escreveu ele, como a principal voz de contraponto ao sotaque excessivamente paulistano do modernismo brasileiro.


    O que pouca gente sabe é que o homem que refletia sociologicamente sobre a pintura também manipulava lápis e pincéis. Com a abertura, hoje, na Caixa Cultural, no Recife Antigo, da exposição Gilberto Freyre: Vida, Forma e Cor, o público poderá perceber a faceta de artista plástico do homem que deu, ao Nordeste, a mais bem desenhada noção que a região tem de si. Aluno de pintura de Telles Jr. antes mesmo de ser alfabetizado, pintou até os últimos dias de vida.

    Proposta pela Fundação Gilberto Freyre e patrocinada pela Caixa, a exposição conta com 174 obras, entre telas, painéis, correspondências, esboços, e diversos documentos que reconstituem os bastidores da produção artística de Freyre e seus parceiros-artistas. O desenho mais antigo é de 1905 e os mais recentes chegam à década de 80.
    A mostra não traz um recorte específico da produção visual de Freyre - nem tem a pretensão de elegê-lo a artista. “Mais do que dizer se Freyre era ou não artista – questão secundária inclusive para ele próprio, que se definia como escritor – o que queremos mostrar é como esse pioneirismo de Freyre de misturar arte e ciência foi uma característica duradoura em toda a produção dele”, esclarece Clarissa Diniz, que assina a curadoria da mostra junto com Fernanda Arêas Peixoto, Jamille Barbosa e Leonardo Borges.

    De fato, Freyre parece ter sido bem mais imagético em sua socioantropologia de apelo sensorial ao explicar a formação do caráter brasileiro do que em sua produção pictórica. De tons pastel e traços simples, seus desenhos interessam menos por qualquer inovação formal - a própria luz do Nordeste tão presente na obra do amigo Cícero Dias parece ali ser ignorada - pela temática. Homem que não distinguia arte e ciência social, Freyre tem na sua obra visual reflexões recorrentes sobre o tema que ergue e justifica sua obra: o desenvolvimento dos padrões sociais do Brasil a partir do patriarcalismo engordado pela cana sacarina responsável por viabilizar a colonização portuguesa no Nordeste.

    São quatro os módulos da exposição. Em Imagens e Imaginação, podemos ver como o imagismo lastreia o metabolismo intelectual de Freyre em caricaturas, cadernos de desenhos para os netos, cartas desenhadas. No módulo Escrever Imagens, há a relação quase indistinta entre escrita e imagem para Freyre, com alguns excertos que podem comprovar a não-dicotomia. Em Parcerias, é possível observar a relação profícua de Freyre com os artistas responsáveis por ilustrar seus livros, num desfile de obras que ganharam vida própria como o painel de Cícero Dias para Casa-grande & Senzala. No último módulo, o Gilberto Freyre crítico de arte vem à tona através de seus textos.
Gilberto Freyre: Vida, Forma e Cor . Até 8 de maio, de terça a sábado, das 10 às 20h. Na Caixa Cultural, Av. Alfredo Lisboa, 505, Marco Zero. Fone: 3425-1915.

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