Exposição

Rinaldo Silva e a claridade como metáfora para a expansão

Artista plástico usa a luz e seus simbolismos para discorrer sobre o tempo, a vivência, o aprendizado

Flávia de Gusmão
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Flávia de Gusmão
Publicado em 22/03/2016 às 8:00
Ricardo B. Labastier/JC Imagem
Artista plástico usa a luz e seus simbolismos para discorrer sobre o tempo, a vivência, o aprendizado - FOTO: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
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Do momento em que os olhos se abrem para a luz que os fere pela primeira vez – do ventre escuro para um ruidoso e multicor exterior – ao instante em que ela se apaga, no cerrar das pálpebras, com a morte. O que existe nesse ínterim é tudo e, ao mesmo tempo, nada. A vida inteira – que parece uma eternidade diante de nós nos primeiros anos – e o que resta dela, na reta final, quando pensamos que somos apenas a ínfima parte de um todo.

Guardada a Pupila se Abre ao Luzeiro, a exposição que o artista plástico Rinaldo Silva inaugura hoje, às 19h, para convidados, na Arte Plural Galeria, é um estudo sobre o tempo e seu deslocamento, tendo todos nós como passageiros. Alguns são testemunhas atentas, outros mal percebem a paisagem que se descortina e sucede.

Dito assim, pode parecer que vamos nos deparar com um desfile sombrio e reflexivo sobre a efemeridade da condição humana. Reflexivo, sim, sombrio, jamais. Essa não é a marca que o artista empresta ao seu trabalho, sempre lúdico, com paleta em tons vibrantes e muito veloz. Como se quisesse aprisionar o tempo, a pintura gestual de Rinaldo se espalha pela tela com a celeridade de quem procura anotar tudo o que lhe é dito. A mão buscando se equiparar à velocidade do raciocínio verbal proveniente do jorro de pensamentos, nem sempre ordenados.

Podemos dizer que a exposição “começa” diante dos quadros Visão do Nada 1 e 2, em acrílica sobre tela, que, de costas um para o outro, mostram o autor, nascido em 1961, e um de seus irmãos, que veio ao mundo um ano antes, ainda na pouca clareza da infância. As obras surgiram a partir de uma fotografia feita pelo pai, quando eles tinham entre 6 e 7 anos de idade. Sobreposto aos desenhos dos meninos, vemos outro, que inferimos ser o pai. O fotógrafo e seu objeto. Uma vida que olha para outra como se no espelho da perpetuação. Também uma forma de questionar o hiato estabelecido entre aqueles primeiros anos e hoje, depois de quase meio século ter escoado. Eles, agora transformados em pais. Onde estão aquelas pessoas? São as mesmas sob o efeito do tempo?

Ainda remexendo no baú dos objetos guardados – uma espécie de freezer do tempo transcorrido – vemos a série de reproduções digitais sobre papel de algodão, que traz o mesmo título da exposição. São provas escolares, datadas de 1967, guardadas pela mãe do artista e, depois, por ele mesmo, que mantém em seu acervo pessoal uma considerável memorabilia.

Ela fica à espera do sopro criador. Algum momento temporalmente indefinido, quando Rinaldo servirá como catalisador da reação entre o passado e o presente que, misturados, se ressignificam. Esse instante é definido pelo artista sob o calendário do “Quando chega a hora de mexer”. Marcação que remete a outro elemento ligado ao tempo: a sincronicidade.

Os exames receberam uma técnica translúcida que permite ver, sob o desenho recém-aplicado por Rinaldo, as marcas daquilo que foram originalmente: instrumento de medição de um certo tipo de conhecimento. Como se cobertas por uma “pátina de presente”, reconhecemos a letra tremida e infantil, as respostas docemente inocentes às questões propostas e até o nome da professora que as submeteu: Marilúcia Sampaio. O que não está devidamente registrado, se perdeu na névoa da memória: terá sido do Grupo Escolar José Vilela, do Colégio Santa Catarina ou do Eucarístico? Educandários por onde Rinaldo andou para aprender.

E assim segue Rinaldo, ao longo de 13 pinturas, sete esculturas, cinco desenhos e duas gravuras, nesta mostra que tem a curadoria do filósofo Alex Calheiros, professor da UnB. Do seu universo, emergem, ainda, as onipresentes “cabeças”, das quais partem as representações simbólicas das grandes forças da nossa existência: o filosófico, o divino, o carnal.

Guardada a Pupila se Abre ao Luzeiro, de Rinaldo Silva – Vernissagem hoje, 19h, para convidados. Arte Plural Galeria (Rua da Moeda, 140, Bairro do Recife

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