"Não é sobre a natureza. É sobre o ser humano e sobre como a gente lida com a natureza. Eu não trabalho com a natureza idílica. O trato que dou sobre o tema está em onde a gente mexe na natureza", afirma o artista Rodrigo Braga sobre a obra que ele tece há anos - ou cultiva, para se aproximar do termo escolhido pelo curador Daniel Rangel, fotógrafo agricultor. Isso tudo é visível na exposição Agricultura da Imagem, montada no Museu do Estado de Pernambuco (Mepe), sete anos após a última exposição individual dele no Recife. A mostra será inaugurada nesta quarta-feira (2/8), às 19h, com audiodescrição dos quatro vídeos e Libras (como parte da mostra será promovida uma oficina de mediação ministrada pela audiodescritora Liliana Tavares, mais informações ao final deste texto).
O intervalo entre a exposição Ciclos Alterados, realizada em 2011 no Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães (Mamam), com curadoria de Paulo Herkenhoff, e a que o público pode visitar até o dia 7 de setembro não significa que o artista esteja apartado de Pernambuco. Agricultura da Imagem inclusive reflete os caminhos percorridos nos últimos anos por este manauara de nascimento que, após vários anos morando e produzindo no Recife, passou a viver no Rio de Janeiro. "Sempre volto aqui, na mostra há obras feitas no Sertão, no litoral de Pernambuco", destaca Rodrigo.
"Eu me desloco bastante. Digo que meu ateliê tem sido muito mais no espaço externo do que dentro dele. Aqui temos obras feitas na Amazônia, na Floresta da Tijuca, nos Estados Unidos, na França", continua ele.
E, assim como o próprio artista, Agricultura da Imagem também passou por diferentes paragens. Foi montada primeiro no Sesc Belenzinho, em São Paulo, e depois foi levada para o Rio de Janeiro e Fortaleza. Ao longo do circuito, foi vista por aproximadamente 220 mil pessoas. "Ela é a maior exposição que fiz até então e, para cada passagem, mexemos um pouco e a atualizamos com obras novas. Lá em São Paulo tinha trabalhos feitos de 2009 a 2014. Aqui, a seleção vai até 2016", esclarece Rodrigo.
Em meio às fotografias e vídeos há um conjunto de pedras, fósseis, objetos como anzóis e ossos que o artista recolheu nessa caminhada. Vale dedicar um tempo à observação de detalhes como a textura do bronze sobre a pedra e as formas dessa coleção de itens para compreender que eles não estão ali como uma memorabilia. Isso não seria errado, mas há uma ponte entre eles e o que é mostrado nas paredes do museu.
A exibição de um grande número de obras favorece a compreensão de como os temas aparecem em novas configurações, assim como o exercício visual de identificar conexões entre as imagens. Há formas, texturas e substâncias que se encontram pelas mãos do artista, em sua proposta de deslocar e justapor elementos para criar suas composições, ou ainda pela ação da natureza. Em uma das fotos, por exemplo, Rodrigo dispõe pequenos ossos de animais sobre uma pedra, seguindo as ranhuras criadas pela água, pelo Sol e os ventos há milhares e milhares de anos.
Por falar em água, ela é um elemento muito presente em Agricultura da Imagem, amalgamada à terra. Está nas fotos do Arquipélago das Anavilhanas, em que uma luz tênue delineia a vegetação, um peixe e as margens do Rio Negro. Está nos próprios animais aquáticos e nas ilhas, que Rodrigo sugere com seus "peixes-ilha" emergindo da água depositada em um buraco cavado na terra ou no que ele encontrou em uma rocha litorânea.
Também está na Dead Horse Bay (Nova York), local em que eram depositados os corpos de cavalos mortos no século XIX, onde Rodrigo gravou o vídeo Olho de Cavalo. Outra obra audiovisual, Florão da América, pensada para uma projeção em grandes dimensões, foi feita em Paquetá, no Rio de Janeiro. O artista aparece num barco e começa a fincar bandeiras nas pedras que saem da água. "O vídeo dialoga com as ilhas anteriores e com a História do Brasil. Com a conquista das pedras, finco bandeiras, como se tomasse para mim aquele lugar metaforicamente. Algo que o ser humano faz o tempo todo", compara Rodrigo.
Nas obras mais recentes do conjunto, novamente surge a água. Na área externa do Palais de Tokyo, onde realizou uma exposição individual em 2016, o artista dispôs algumas pedras calcárias. "São pedras como as que constroem Paris. Quando você anda pela cidade, pode notar que os fósseis marinhos estão bem visíveis. Comparo Paris a um grande castelo de areia, com a coloração da areia que existia a milhares de anos", sugere o artista.
Nestas imagens, assim como nas fotos de uma composição mimética feita com folhas e peixes ou em outras mais alegóricas, como a obra em que urubus sobrevoam uma árvore amazônica, Rodrigo interfere na paisagem. "Mesmo sendo apresentadas como fotografias, minhas obras começam a ser elaboradas em um processo muito plástico, de manipulação do material", acrescenta.
Um modo de agir que remete à figura do fotógrafo agricultor evocada pelo curador Daniel Rangel. "Segundo o renomado artista canadense Jeff Wall, o fotógrafo agricultor é aquele que constrói suas imagens a partir de ideias concebidas previamente. Conceito oposto ao do ‘fotógrafo caçador’, (...) que captura o instante que vê", esclarece ele em seu texto.
ACESSIBILIDADE
Quinta-feira (2/9), às 13h, no Mepe, tem início a oficina sobre mediação para pessoas com baixa visão ou cegas ministrada pela audiodescritora Liliana Tavares. Estudantes, pesquisadores e educadores de outros espaços expositivos podem se inscrever. Para isso, basta enviar um e-mail com o assunto Inscrição - Oficina com Liliana Tavares para fioacoes@gmail.com.