Inquieta e intensa, Joana Lira entende sua arte como um processo em constante transformação. Acredita, por exemplo, em ciclos de dez anos: após esse período, sente que fecha uma gestalt e se lança em busca de outras inspirações. Ao longo de uma década (2001 a 2011), a foliã inveterada foi responsável pela identidade visual do Carnaval do Recife, projeto com o qual estreitou ainda mais suas relações afetivas com a cidade natal. Ela celebra esse marco em sua carreira com a exposição Quando a Vida é Uma Euforia, que é aberta terça-feira (15), às 19h, no Cais do Sertão.
Longe de uma mostra retrospectiva, a proposta da artista e da curadora Mamé Shimabukuro é de propor uma imersão nas possibilidades afetivas da celebração popular. Para tanto, elas reuniram os trabalhos criados pela pernambucana para a Festa de Momo, mas ressignificaram as obras, tanto em termos de tamanho – algumas originais chegavam à monumental dimensão de 30 metros –, quanto de narrativa. A exposição, que já passou pelo Instituto Tomie Ohtake (SP), conta ainda com projeções de vídeos e intervenção sonora, com direção musical de Maurício Badé.
“Este é um projeto que estamos gestando há oito anos. Sou muito detalhista e minha dedicação a esses trabalhos foi total. Inicialmente, a ideia é que fosse uma exposição contemplativa, mas Mamé, com quem tenho uma relação profissional e de amizade há 20 anos, propôs outro lugar. Nos interessou pesquisar o Carnaval enquanto experiência”, conta a artista visual.
Para a curadora, as criações de Joana para o Carnaval são imbuídas das vivências da artista como pernambucana e foliã. Ela identifica ainda transformações estéticas na obra dela ao longo desses dez anos.
“Joana colocou para fora sua relação com o Carnaval, repleta de memórias afetivas. Antes, as cores dela eram todas terrosas e, quando vejo esse acervo de dez anos, percebo como as cores são vivas, como são as cores das culturas envolvidas, que trazem alegria. São trabalhos que se expandem, com diferentes suportes, como a madeira, telas, paredes”, explica Mamé.
Joana reforça que chamar a curadora paulista para o projeto ajudou a trazer um olhar de fora para a festividade que é tão arraigada à cultura pernambucana. Sua intenção é que quem seja daqui se identifique com o que encontra na exposição e que os de fora captem o espírito da festa.
“O Carnaval é uma festividade quase ritualística, de um suor que limpa a alma. A ideia que propomos na exposição, de um percurso, como Mamé fez ao visitar a festividade e o Recife, é para que o visitante mergulhe nesse universo multicultural”, enfatiza a artista.
Para criar esse mosaico, a exposição tem diferentes núcleos, que dialogam e se complementam. São eles: Pertencimento, Fantasia, Manifestação, Transcendência e Mulheres. A presença das figuras femininas, inclusive, é uma constante no trabalho de Joana Lira.
Um dos desafios, segundo Joana e Mamé, foi fazer fluir as relações de escala das obras. Assim, além de imagens de grande porte, com cerca de quatro metros de altura, também foram adaptadas peças em proporções menores, quase como relicários, evidenciando a força desses trabalhos independente do tamanho.
No vão externo do Cais do Sertão, foram montadas estruturas que, além das obras, funcionam também como bancos, uma forma, segundo Joana de perpetuar a proposta original de intervenção urbana dos trabalhos.
“Quero que as pessoas ocupem, dialoguem com essas obras, e também que entrem o museu, entendam que isso aqui é delas e que a cultura é viva”, disse.
Mamé reforça ainda que a exposição tem incentivo da Lei Rouanet, o que permitiu a gratuidade de todas as ações. "Fazer cultura no Brasil é muito difícil. Ações como essa querem aproximar as pessoas de sua própria cultura, reforçar que isto é delas", disse a curadora.
TROCAS
A exposição propõe ainda outras atividades gratuitas. A primeira delas, uma conversa com Mestre Nico, acontece quarta-feira (16), das 15h às 16h, no auditório É do Povo. No domingo (20), às 18h, Maurício Badé promove uma troca sobre a experiência sonora da exposição, dentro do Espaço Umbuzeiro.