Terroir

Queijo de cabra para os chefs

A banqueteira Rafaela Suassuna ajuda a aprimorar os queijos produzidos pela família para a gastronomia local

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 28/03/2014 às 6:19
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Banqueteira de mão cheia, fiel escudeira e parceira da mãe, Jane Suassuna, no Bufê Porto Fino, Rafaela Suassuna agora é uma entre os chefes que cruzam a fronteira. Não se limita a cozinhar com o que encontra no mercado: está junto dos produtores para ajudar a desenvolver insumos com maior capacidade de diálogo direto com a gastronomia. “Mais de 70% dos ingredientes que nós, chefes, usamos, são de fora, de longe da cadeia produtiva local. Uma forma de gerar mais sustentabilidade é aproximar os cozinheiros de quem produz. Assim, eles podem sugerir a finalização de produtos que podem lhes ajudar a ter uma cozinha mais autoral e mais sustentável socialmente”, diz Rafaela, que acaba de se engajar na produção de queijos que a família de sobrenome notório mantém na cidade de Taperoá, região do Cariri paraibano.
Sim, Rafa é do clã do “tio Ariano” – escritor que mitificou Taperoá no clássico Auto da Compadecida. Seu primo, Joaquim Pereira Dantas Vilar, é o mestre queijeiro do pequeno e já famoso Laticínio Grupiara, que vem ganhando fama e prêmios pelo Brasil com queijos de cabra de deliberado acento sertanejo e “identidade armorial”. Entusiasta das cabras como esteio de autonomia econômica e lastro identitário do sertão, foi o próprio Ariano Suassuna quem fez o desenhe o para as embalagens. “Não é por uma questão de patriotada, mas nosso produto tem qualidade e pode ter independência. Podemos fazer um queijo próprio, sem ter que imitar os europeus. Não preciso dizer que meu queijo é do tipo cablanca, ele é feito com cabras noutro lugar, com outras condições”, diz Joaquim, que já coleciona cinco prêmios do Instituto Cândido Tostes, de Minas Gerais, um dos mais importantes centros de estudos de laticínios das Américas.
O queijo base da linha de produção de 1,5 mil toneladas mensais é o arupiara. Um queijo que, sim, pode ser comparado ao cablanca, mas que, sim, é bem diferente. Até porque tem menos concentração aromática e textura mais cremosa. “Amenizamos um pouco o cheiro porque muita gente tem resistência à força do queijo de cabra”, diz Joaquim, que sonha em ver o produto contemplado com um selo de denominação de origem. “Mas podemos aumentar, a depender da demanda do chef”, acrescenta Rafa. Ela explica a sua nova função: deixar os chefs à vontade para dar pitaco e desenvolver produtos customizados para usos específicos. Roberta Sudbrack, estrela da gastronomia carioca, por exemplo, pediu que aumentassem a concentração aromática, para trazer de volta justamente a força do queijo. “Roberta também sugeriu um queijo cortado com flor de sal defumado”, diz a Rafa que, na última terça, reuniu chefs em Casa Forte para apresentar receitas simples (veja nesta página) com os produtos do Grupiara. “É bom ter mais produtores abertos aos chefs”, diz o chef Joca Pontes, que tem mais de 50% dos ingredientes que usa desenvolvidos com produtores locais.
Uma característica fundamental dos queijos do Cariri é que eles são maturados por pelo menos 180 dias. Não em contato direto com o ar, mas embalados à vácuo. Assim, ganham complexidade sem perder gordura, peso ou ressecamento das cascas. Vendidos nas principais delicatessens do Recife ao preço médio de R$ 15 (R$ 230g), há também opções temperadas com ervas do semiárido como aroeira, alfazema e raspas de marmeleiro e da madeira cumaru - esse, de sabor densamente amadeirado. “Uma vez, chegou um francês lá no laticínio sugerindo que usássemos ervas da Provença. Nossa resposta foi recorrer às ervas do sertão”, diz o anticolonialista Joaquim Vilar.
 Laticínio Grupiara: (83) 8795-1857

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