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Quinta Maria Izabel: um Douro com estilo

Vinhos do grupo JCPM em Portugal confirmam a excelência da região

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 21/08/2015 às 6:26
Heudes Régis / JC IMAGEM
Vinhos do grupo JCPM em Portugal confirmam a excelência da região - FOTO: Heudes Régis / JC IMAGEM
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No evento de apresentação dos vinhos Quinta Maria Izabel no Recife, esta semana, o enólogo Dirk Niepoort fez uma provocação. “Quero desconstruir nossas ideias clássicas de harmonização, quebrar a expectativa”, disse o português de origem holandesa, um dos mais requisitados e prestigiosos enólogos consultores do mapa europeu, ao servir o tinto da vinícola com o ceviche de peixe com mandioquinha, preparado pelo chef português Rui Paula. Embora intenso, rico e volumoso, confirmando a filiação tradicional com os vinhos do Douro, o tinto em questão tem taninos tão bem arredondados que não pareceu qualquer heresia tê-lo em companhia do prato peruano de peixes frescos que, via de regra, exige brancos de acidez elevada. Um tinto confortavelmente macio.


O Quinta Maria Izabel é um dos poucos, digamos, vinhos com DNA brasileiro produzido no Douro, joia da vitivinicultura mundial. Criada pelo grupo nordestino JCPM, tendo à frente os irmãos e sócios Reginaldo e João Carlos Paes Mendonça, a vinícola lança agora seus vinhos feitos na região com a Denominação de Origem Controlada mais antiga do mundo. Uma vinícola que já nasce grande: com 130 hectares de área, tem vinhas com 18 castas portuguesas distribuídas em 70 deles. Outros quatro hectares estão reservados para a produção de azeite.
A primeira produção libera um pouco mais de 50 mil garrafas. “Produzir vinho não é difícil. Difícil é produzir vinho de qualidade”, diz o empresário João Carlos Paes Mendonça, dono da imprescindível virtude da paciência para soltar os vinhos no mercado depois do tempo mínimo de evolução. Dessa produção inicial de 50,3 mil garrafas, 36 mil são de tinto, 8,9 mil de branco, 1,3 mil de rosé e 3,9 mil de Porto Vintage (afinal, estamos no Douro!).
Todas entram no mercado brasileiro por Pernambuco, o Estado onde elas primeiro estão disponíveis. O tinto, por exemplo, é da safra de 2012, um vinho com franca capacidade de guarda e potencial para uns bons 20 anos de adega. Se estará, provavelmente, no auge da sua plenitude aromática em mais dois anos, é um vinho já muito sedutor com sua juventude relativa em taça.


De vinhas com idades entre 20 e 30 anos, o tinto é um corte no qual dominam Touriga Nacional e Touriga Francesa, duas castas icônicas do Douro. A cor granada profunda indicia sua jovialidade, com aromas sedutores, generosos, de frutas vermelhas maduras, algo de café e um elegante floral, como algodão. A fruta, neste vinho, está muito elegante, com taninos perfeitamente arredondados, sem arestas. Um conforto.
Para desenvolver os vinhos, a Quinta Maria Izabel conta com a consultoria de Dirk Niepoort, um dos responsáveis por reescrever a história do Douro báquico. No começo dos anos 1990, ele integrou o grupo conhecido como Douro Boys, uma turma de jovens enólogos interessados em prolongar a história do Douro sem, contudo, deixar de alterá-la com autoralidade.


“Nós passamos quase dois mil anos fazendo o vinho do Porto, e ainda estamos definindo o que viria a ser o terroir do Douro”, diz o enólogo que, contra os caminhos mais fáceis, não faz coro a favor do discurso já unânime sobre as características de excelência correntes sobre o Douro. “Se eu quisesse fazer um vinho ao estilo (do poderoso crítico norte-americano) Robert Parker, faria com muita concentração, muita fruta, muito álcool. Mas quero vinhos mais elegantes”, diz. A boa acidez do vinho faz dele uma excelente companhia de mesa.
Numa região em que mesmo os tintos só começaram a se firmar nos anos 1990, depois de milênios de devoção quase exclusiva aos fortificados conhecidos como Porto, o branco da Maria Izabel surpreende de cara já pela elegância.


Amarelo palha, ligeiramente esverdeado, tem um nariz levemente cítrico, uma mineralidade evidente e uma certa cremosidade, com toques de baunilha. Um vinho gastronômico, capaz de enfrentar até carnes mais brandas, mas também facilmente contemplativo. Vai bem com frutos do mar e pratos leves.
Com acidez suficiente para peixes de boa gordura, o rosé tem notas de frutas vermelhas bem abertas, como cereja e framboesa. “No passado, meus amigos me diziam para não fazer rosé. Não consigo entender como um rosé não pode ser um vinho sério”, comenta Niepoort.


Para fechar o portfólio, naturalmente, há um Porto: um vintage ricamente aromático, de flores a frutas secas, com nozes e bom açúcar – mais um bom verbete na história dessa região, a mais antiga do mapa vinícola português, declarada Patrimônio da Humanidade em 2001.

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