O holandês Paul Verhoeven, 77 anos, que estava há uma década sem fazer um longa-metragem, causou o maior frisson na manhã deste sábado, no Festival de Cannes. Seu novo filme, o thriller erótico e perverso Elle, estrelado por Isabelle Huppert, caiu nas graças dos críticos. Pelo que se viu após a sessão, habemus Palma de Ouro. Mas será que George Miller e seus colegas de júri vão dar a Palma para um filme tão politicamente incorreto quanto Elle?
Como sabemos, a disputa pelo prêmio máximo de Cannes não está nada fácil. Embora os dos últimos dois dias não tenham sido dos mais impactantes, Elle elevou a temperatura do festival ao nível estratosférico. Adaptado de um romance de Philippe Djian (Betty Blue), o filme tem como protagonista a executiva Michele (Isabelle), que comanda uma empresa de games com as atitudes mais grosseiras. Seus empregados, claro, a odeiam.
Mas, antes de ficarmos sabendo disso, assistimos a ela ser estuprada por um homem mascarado e vestido todo de negro. Ao contrário de ligar para os parentes e sair correndo atrás da polícia, Michele toma um banho e vai encontrar o ex-marido e um casal de amigos para jantar. Como se dissese que estava com dor de dente, diz foi estuprada. A partir desse caso, uma série de eventos vão tropeçar no caminho dela, inclusive o homem que a atacou.
Michele, no entanto, se comporta como nada a abalasse. E sabemos porque ela é do jeito que é. Imagine ser filha de um homem monstruoso, que assassinou 27 pessoas num só dia e foi condenado à prisão perpétua. Verhoeven não se importa muitas se nós, espectadores, teremos um mínimo de empatia com ela. Mas ele sabe, mais do qualquer cineasta, como nos mostrar o pior do ser humano, demasiadamente humano.
Dono completo de seu filme e em forma perfeita, o diretor de RoboCop e Instinto Selvagem mostra que liberdade de criação é vital para qualquer cineasta. E não ter censura, principalmente ao analisar seres humanos, é um caminho para chegar mais perto da verdade, qualquer que seja ela. Verhoeven contou com a colaboração do produtor francês Saïd Bem Saïd, o mesmo de Aquarius, para esse retorno triunfal.
The Salesman
O penúltimo longa exibido na Seleção Oficial foi o drama franco-iraniana The Salesman, de Asghar Farhadi, que não causou a mínima comoção. De certa maneira, o cineasta de A Separação (Urso de Ouro em Berlim, em 2011, e Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, em 2012) e O Passado (Prêmio de Melhor Atriz para Bérénice Bejo, em 2013, em Cannes) mostrou que seus filmes repetem uma única fórmula. Aqui, ele traz novamente a história de um casal aparentemente feliz que vai se desentender e colocar o casamento em xeque.
No caso, um professor, que também é ator interpreta uma versão de O Morte de um Caixeiro Viajante, de Arthur Miller, vira uma espécie de justiceiro moral. A mulher, também atriz na peça, sobre uma agressão de um idoso, numa atitude aparentemente banal. O que vem a seguir é a mesma fórmula vista em seus dois últimos filmes.
Cerimônia de premiação
Como a entrada de Elle no páreo, a disputa pela Palma de Ouro ficou mais acirrada. Agora, há pelo menos uns cinco filmes na luta. Aida estão na corrida o alemão Tony Erdmann, de Maren Ade; o brasileiro Aquarius, de Kleber Mendonça Filho e o americano Paterson, de Jim Jarmusch. A cerimônia de apresentação acontece neste domingo (22-5), às 19h15 (14h15 no Brasil).
O repórter viajou numa parceria entre o JC, o Instituto Français e a AESO-Barros Melo.