Uma das principais dificuldades dos festivais de cinema no Brasil é a manutenção de uma ideia de curadoria. O Festival de Brasília de Cinema Brasileiro, que abre hoje as Mostras Competitivas de Longas e Curtas-metragens, tem dado cabeçadas há pelo menos quatro anos. Nesta 47ª edição do festival mais antigo do País, tudo leva a crer que houve um freio de arrumação. A mudança mais nítida é que a categoria de longas não está mais dividida entre ficção e documentário. Mas a maior novidade é o alinhamento da curadoria, sob o comando da coordenadora-adjunta Sara Rocha, com uma leva de filmes que poder ser considerada representante de um novo cinema brasileiro.
Isso não quer dizer, entretanto, que esses filmes fazem parte de um novo movimento, nos moldes do cinema novo, por exemplo. Ao contrário do agrupamento que houve nos anos 1960 - notadamente no Rio de Janeiro, com a participação de cineastas nordestinos e cariocas -, o novo cinema brasileiro vem de toda parte. Por sua tradição de combatividade política, o Festival de Brasília tem sido uma espécie de ímã a captar tendências e novidades na produção brasileira. Este ano, os cineastas em competição não são figuras carimbadas nem medalhões do cinema nacional.
No máximo, os seis diretores presentes na Competitiva de Longas fizeram o caminho dos festivais alternativos, como a Mostra de Tiradentes, que privilegia a produção autoral e experimental. Um dos exemplos é o mineiro André Novais de Oliveira, que concorre com o Ela volta na quinta, em que o diretor atua ao lados dos pais e da namorada. Antes do seu primeiro longa, dois curtas instigantes - Fantasma e Pouco mais de um mês, premiados em festivais nacionais e internacionais - já apontavam André como uma das forças desta geração.
O mesmo se pode dizer da dupla pernambucana Gabriel Mascaro e Marcelo Pedroso. Codiretores do desbravador KFZ-1348 (2008), eles chegam a Brasília com seus primeiros longas de ficção. Há menos de dois meses, Ventos de agosto, de Mascaro, recebeu uma menção honrosa no Festival de Locarno e colecionou excelentes críticas da imprensa mundial. E Pedroso, com Brasil S.A., volta a tocar em temas fortes, como no virulento curta Em trânsito, numa tentava de analisar o modelo desenvolvimentista brasileiro.
Além desses três filmes, a competição será abrilhantada pelos documentários Sem pena, do paulista Eugênio Puppo, e Branco sai, preto fica, do brasiliense Adirley Queirós. Em ambos, os desvãos da violência policial e do sistema carcerário. O outro concorrente é Nó em pingo d´água, de Taciano Valério, paraibano residente em Caruaru, que conclui a Trilogia Cinza, iniciada com Onde Borges tudo vê e Ferrolho.
Entre os 12 curtas, que seguem o mesmo diapasão dos longas, dois são pernambucanos: Loja de répteis, de Pedro Severien, e Sem coração, de Nara Normande e Tião, já premiado na França, na Quinzena dos Realizadores. Com quatro filmes nas Mostras Competitivas, Pernambuco tem tudo para repetir a vitoriosa performance de 2012, quando Eles voltam, de Marcelo Lordello, e Era uma vez eu, Verônica, de Marcelo Gomes, dividiram o Candango de Melhor Filme.
O repórter viajou a convite da organização do festival.