Só um filme maior do que o cinema pode virar um evento de proporções históricas. Este filme é Shoah, obra-prima do cineasta francês Claude Lanzmann. Em hebraico, o termo significa catástrofe ou calamidade. No Brasil, foi visto apenas em festivais. Em seu lançamento, em 1985, entrou para a história do documentário por dois motivos: a longa duração – nove horas e meia – e a recusa do diretor para utilizar imagens de arquivo para ilustrar o sofrimento do povo judeu nos campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
“É um filme incontornável sobre a questão do holocausto”, resume o curador de Artes Visuais da Fundação Joaquim Nabuco, Moacir dos Anjos, que há quatro anos coordena uma série de eventos sobre as tensões entre a arte e a política, como a Mostra Cães sem Plumas, ainda em curso.
Para exibir um filme de tal magnitude, o Cinema da Fundação organizou duas sessões, tendo em mente também o conforto dos espectadores. Hoje, às 13h, Shoah é exibido com um intervalo de uma hora duração – entre 18h e 19h – e duas paradas de 10 minutos, na metade de cada uma de suas duas partes. Depois, nos dias 8 e 9 de dezembro, é exibido em duas partes, a partir das 18h30, com um intervalo de 10 minutos semelhante à primeira sessão.
Restaurado há dois anos em 4K, Shoah teve sua reestreia no Festival de Berlim do ano passado. As exibições foram acordadas com a Why Not Productions, que detém os direitos de exploração comercial do filme. O evento tem o apoio do Consulado Francês e do Instituto Moreira Salles, que cedeu as legendas em português.
Realizado ao longo de 11 anos, cinco dos quais apenas na montagem, Shoah é um filme que se apoia na memória dos sobreviventes dos campos de concentração, como também das lembranças das pessoas que testemunharam o extermínio dos judeus. Jornalista experiente, Lanzmann leva sobreviventes, espalhados por várias partes do mundo, para revisitar os campos e contar suas histórias. “Ele questiona a representação de algo tão bárbaro quanto o holocausto ao negar qualquer possibilidade de usar fotos antigas de câmeras de gás e corpos empilhados, numa ideia contrária à do filósofo Georges Didi-Huberman, que gerou muitas discussões”, explica Moacir.
Com o auxílio de tradutores, Lanzmann conversa com sobreviventes dos campos de concentração de Treblinka, Chelmno, Vilna e Auschwitz – no Leste Europeu, em áreas usurpadas da Polônia –, onde mais de seis milhões de judeus perderam a vida. Para Simone de Beauvoir, Shoah exprime o indizível em rostos e palavras.