CRÍTICA

Sniper americano traz complexidade ao cinema de Clint Eastwood

Filme concorre a seis Oscar e estreia nesta quinta-feira (19/02)

Ernesto Barros
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Ernesto Barros
Publicado em 19/02/2015 às 6:00
Warner Bros/Divulgação
Filme concorre a seis Oscar e estreia nesta quinta-feira (19/02) - FOTO: Warner Bros/Divulgação
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A três dias da cerimônia de entrega do Oscar, estreia nesta quinta-feira (19/02) o último dos oito longas-metragens indicados à estatueta de Melhor Filme: Sniper americano, de Clint Eastwood, que concorre em mais cinco categorias – Melhor Ator (Bradley Cooper), Roteiro Adaptado, Montagem, Edição de Som e Mixagem –, chega cercado de polêmica ao retratar a história do soldado mais letal da história do exército americano. De acordo com o Pentágono, o atirador de elite Chris Kyle, que serviu por 10 anos no grupo de elite da marinha Seals, matou 160 inimigos durante a guerra contra o Iraque, entre os anos de 2005 e 2009.

Sniper americano é 34º longa-metragem dirigido por Clint Eastwood, que completa 85 anos em maio próximo. Ícone do cinema mundial desde os anos 1960, quando protagonizou uma série de faroestes italianos assinados por Sergio Leone, ele construiu uma igualmente sólida carreira de diretor. Foi consagrado por duas vezes com o Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor por Os imperdoáveis, em 1992, e Menina de ouro, em 2002. Ligado ao Partido Republicano – em 2012, na convenção do partido, discursou para uma cadeira vazia, que representava o presidente Barack Obama – e representante da velha guarda de Hollywood, Eastwood sempre teve posições independentes.

Na ultima década, se interessou sobremaneira pelo passado dos Estados Unidos – A conquista da honra e Cartas de Iwo Jima, ambos de 2006, se completavam como olhares heroicos e humanos sobre a Segunda Guerra Mundial; e J. Edgar, de 2011, biografava uma das figuras mais polêmicas do país –, além de ter feito uma honesta tentativa de captar a realidade atual norte-americana, em Grand Torino, de 2008.

De certa maneira, esses três filmes prepararam Eastwood para fazer Sniper americano, uma biografia repleta de ambiguidades sobre um soldado que esteve na linha de frente de um conflito bélico cujo heroísmo geralmente é posto em questão. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, quase ninguém duvida que todas as guerras que os Estados Unidos patrocinaram e/ou se envolveram – principalmente no Sudeste Asiático e no Oriente Médio – foram condenáveis. O fato de Chris Kyle haver sido assassinado por um soldado veterano sequelado pelos combates no Iraque obrigou Clint a ser ainda mais corajoso. Pois, ao fim e ao cabo, erigir uma hagiografia sobre a vida um soldado com o currículo de Kyle é um ato de extrema coragem e liberdade da parte dele.

Adaptado da biografia homônima – lançada por aqui pela Editora Intrínseca – que Kyle ditou para dois escritores, o filme segue a risca fatos verdadeiros da vida do soldado, como também inventa outros, principalmente para facilitar uma identificação do personagem com a público ou mesmo para ajudar na construção dramatúrgica do relato. Mustafá, um atirador igual a ele, por exemplo, foi criado justamente para servir como nêmesis de Kyle, um inimigo tão letal quanto ele e que faz com que Sniper americano se assemelhe a um filme de vingança no estilo dos antigos westerns.

O filme mostra que poucos soldados foram tão exigidos no campo de batalha quanto Kyle, não obstante ele haver sido preparado para a guerra desde o berço, como evidenciam as duas primeiras sequências do filme. Na primeira ação dele em combate, o atirador é obrigado a matar uma criança e uma mulher que ameaçam um pelotão com uma bomba. Antes que essa ação se conclua, uma volta no tempo mostra como Kyle foi criado pelo pai, que explica para o filho que os seres humanos são divididos entre cordeiros, lobos e cães pastores. No caso de Kyle, ele seria um cão pastor, aquele que impede os lobos de devorar os cordeiros.

Preservar os companheiros que estão na linha de frente, portanto, se torna a obsessão de Kyle. Do alto dos telhados de cidadezinhas do Iraque, ele atira em soldados e cidadãos que põem a vida dos soldados em riscos. Com uma decupagem clássica e precisa, Eastwood acompanha todas as ações de Kyle, tanto nos quatro turnos de ação no Iraque, quanto na sua vida comum, principalmente na relação com Taya, a mulher com quem teve dois filhos e muitos problemas devido aos longos períodos que passava fora de casa. Bradley Cooper, que também produz o filme, demonstra um alto nível de preparação para o papel, assim como Siena Miller, no papel de Taya.

Apesar de um tanto esquemático, Sniper americano é um filme honesto, triste e doloroso, que capta como nenhum outro como a guerra é desumana, independente de derrotados e vencedores. Esteticamente, é daqueles filmes que joga o espectador no olho do furacão do combate, como na envolvente sequência em que Kyle, após concluir sua missão mais importante, é resgatado com outros companheiros em meio a uma tempestade de areia. Sniper americano é um filme de tirar o fôlego.

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