DRAMA

Diário de Uma Camareira é adaptação intimista do livro de Octave Mirabeau

Léa Seydoux interpreta Celéstine, a camareira do título, e Vincent Lindon se destaca como Joseph

Luiz Carlos Merten/Agência Estado
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Publicado em 03/09/2015 às 17:15
Mares Filmes/Reprodução
Léa Seydoux interpreta Celéstine, a camareira do título, e Vincent Lindon se destaca como Joseph - FOTO: Mares Filmes/Reprodução
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Há um ano, Benoît Jacquot mostrou Três Corações em Veneza. Em fevereiro, já estava de novo na competição de Berlim com O Diário de Uma Camareira. No final da premiação havia críticos indignados com o júri berlinense por não haver premiado o ator Vincent Lindon, que faz Joseph. Em maio, Lindon foi à forra e ganhou o prêmio de interpretação em Cannes, por A Lei do Mercado, de Stéphane Brizé. Como eles conseguem? Filmar tanto, e obras de qualidade, disputadas pelos maiores festivais do mundo? O Diário de Uma Camareira estreia nesta quinta-feira (3/9), em São Paulo. É a terceira adaptação do livro famoso de Octave Mirabeau, que já havia sido transposto em filme anteriormente por Jean Renoir (Segredos de Alcova, 1946) e Luís Buñuel (1964). Léa Seydoux segue os passos de Paulette Goddard e Jeanne Moreau ao interpretar Celéstine, a camareira do título.

Está ótima, mas Lindon consegue estar ainda melhor como o hediondo Joseph. O ator e o diretor acompanharam a apresentação do filme em Berlim. Tiveram encontros com jornalistas de todo o mundo, incluindo o repórter do Estado. Léa não pôde prestigiar a exibição porque estava em pleno set de 007 Contra Spectre (é a nova bondgirl e o pivô dramático da nova aventura da série). Como no anterior 007 - Operação Skyfall, Sam Mendes assina a direção e Daniel Craig empunha a pistola de James Bond. Vem blockbuster por aí. O Diário de Uma Camareira tem outro perfil. É mais intimista, autoral. Vale lembrar que Jacquot e Léa estiveram juntos em Adeus Minha Rainha, em 2013, que também concorreu em Berlim.

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A primeira pergunta, inevitável: Não foi intimidador, para Jacquot, adaptar o livro filmado por dois grandes como Renoir e Buñuel? "Conhecia os filmes de ambos, mas nunca havia lido o livro de (Octave) Mirabeau. Embora Jeanne Moreau esteja extraordinária como Celéstine, não creio que seja um grande Buñuel, pelo menos tão grande como Bela da Tarde. O mesmo se pode dizer da versão de Renoir, que dirigiu o filme no final de seu exílio em Hollywood, durante a (II) Guerra. Mesmo não sendo um grande Renoir, o filme é muito interessante porque foi feito numa fase de transição, antes do seu retorno à França, revelando uma espécie de apreensão pelo país que ele temia reencontrar. Ao ler, finalmente, o livro, percebi que nenhuma das adaptações dava conta da complexidade política e social do texto. Mais que isso. Joseph, o dublê de chauffeur e criado de Vincent (Lindon) tem um discurso xenófobo e antissemita que tem tudo a ver com a época, o pré-guerra, mas que se encontra hoje na ordem do dia com essa ascensão das forças de direita na França, e na Europa, de maneira geral."

O filme divide-se claramente em duas partes: A primeira é centrada na atividade de Celéstine como camareira e a segunda na sua relação com Joseph, que revela o desejo da criada de romper com o estigma de classe e ascender socialmente. "Essa divisão foi intencional, do ponto de vista dramático, mas, embora esteja no roteiro, não tem contrapartida da mise-en-scène. Um colega seu falou que a câmera se move mais na primeira parte, mas não é verdade. O que ocorre é que o espectador termina, por assim dizer, por se acostumar com o movimento e não o nota mais. Mas o movimento da câmera, do ator é importante para mim porque me ajuda a expressar o ponto de vista de Celéstine da burguesia e também de Joseph".

O repórter destaca um movimento, em particular (a câmera sai de dentro da casa e acompanha Celéstine que segue uma direção no jardim e Joseph prossegue em outra). Como Jacquot consegue isso? "O movimento do filme é muito elaborado e consciente. Tenho travelling, câmera no tripé e na mão, combino as duas com a lente zoom e o movimento dos atores. Às vezes, vira um tour de force para fazer, mas eu gosto".

Como foi o reencontro com Léa (Seydoux)? "Léa é maravilhosa. Tem um perfil meio camafeu e se adapta maravilhosamente ao figurino de época, mas seu jogo (o estilo de representação) não poderia ser mais moderno e acrescenta à contemporaneidade que me interessa. Não faria sentido contar essa história de racismo e tensão social ficando preso ao código de época.

E Vincent Lindon? O próprio ator esclarece: "Já havia feito O Sétimo Céu com Benoît, nos anos 1990. Quando conversamos sobre o filme, ele disse que me queria no papel porque precisava de um ator simpático, aos olhos do público, porque o personagem é abjeto. Um ator menos palatável poderia deixá-lo caricatural, detestável. Meu desafio foi, como ele disse, atribuir certo charme a Joseph. Ele foi muito preciso nas cenas de sexo. A tensão social na sala, com os patrões, vai para a cama entre figuras da mesma classe. A dominação permanece."

*As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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