Crítica

'O Mistério do Relógio na Parede' traz filme infanto-juvenil pelas mãos de diretor do horror

Dirigido por Eli Roth, conhecido por obras violentas como 'O Albergue', 'O Mistério do Relógio na Parede' tenta mostrar versatilidade do diretor

Rostand Tiago
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Rostand Tiago
Publicado em 20/09/2018 às 9:17
Foto: Universal Pictures/Divulgação
Dirigido por Eli Roth, conhecido por obras violentas como 'O Albergue', 'O Mistério do Relógio na Parede' tenta mostrar versatilidade do diretor - FOTO: Foto: Universal Pictures/Divulgação
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Os créditos iniciais de O Mistério do Relógio na Parede, que estreia hoje no País, podem causar uma surpresa quando surge em tela a pessoa que ocupa o cargo de diretor. O nome Eli Roth é logo associado à representações fortes de violência e sangue no cinema, sendo reconhecido por dirigir obras como O Albergue e sua sequência, populares mundialmente por suas cenas de tortura e horror gráfico. Agora, Roth tenta se mostrar versátil de uma forma brusca, assumindo um filme infanto-juvenil e transformando sua costumeira nauseante brutalidade em uma leve aventura fantasiosa, mostrando até conseguir ter uma boa mão para isso, mas que carece de uma noção melhor de relações humanas.

Roth busca na literatura do norte-americano John Bellairs o material para sua adaptação, no livro homônimo de 1973. Aqui acompanhamos o recém-órfão Lewis (Owen Vaccaro, um clone de Jacob Tremblay ) indo morar com seu tio, o excêntrico Johnatan (Jack Black), após perder os pais em um acidente de carro. Seu novo lar ainda abriga a misteriosa Florence Zimmerman (Cate Blanchett) e reflete a aura mística que circunda seus novos tutores. Não demora muito até que o garoto descubra que ambos são feiticeiros, almejando também ser um, enquanto tenta desvendar os mistérios que habitam aquele lugar, principalmente o tique-taque de um relógio que parece estar preso nas paredes.

Mundo fantástico, interações nem tanto

Todo esse universo é bem concebido pelo design de produção empregado, mesclando bem a visualidade de uma típica cidade norte-americana dos anos 1950 com o misticismo fantástico daquela casa que é magicamente viva, conseguindo separá-la do mundo ao redor, já que lá é o foco da maior parte das ações importantes. Vitrais e móveis rústicos, além de sombras fortes, dão a sensação de se estar em um antigo castelo medieval no meio dos Estados Unidos.

Entretanto, a montagem se apresenta um tanto quanto apressada para a contemplação que gere um maior deslumbramento desse espaço, exemplificando no curto plano quando há o primeiro vislumbre do hall de entrada da residência, sem dar tempo de uma devida absorção de alguns detalhes.

Aliás, pressa é o elemento que mais compromete a narrativa da obra. Mesmo que o principal trio de atores desempenhem ótimas performances, com a altivez de Blanchett, a inocência de Vaccaro e Jack Black sendo, bem, Jack Black, Roth é incapaz de construir de forma sólida tanto a relação entre essas pessoas, como alguns aspectos de suas personalidades.

A dinâmica entre Lewis e Johnatan ocupa uma duração na tela muito menor do que deveria, passando por cima de qualquer potencial conflito que ambos poderiam ter nessa nova convivência. Assim, nos momentos finais, entraves entre ambos surgem abruptamente, com uma rápida discussão acerca das responsabilidades que o feiticeiro tem sobre o garoto, com tudo sendo resolvido artificialmente.

A pressa também deixa artificial o processo do aprendizado do jovem na artesania de se tornar um feiticeiro, quando ele parece dominar as técnicas em apenas algumas cenas rápidas, principalmente quando se leva em conta a explicação sobre a complexidade de se aprender o ofício. Essa rapidez acaba tornando necessário diálogos expositivos para esclarecer certas situações que teriam mais força caso fossem trabalhadas antes.

O oposto dessa pressa vem na forma de flashbacks que, quando não são mal colocados, são desnecessários ou longos demais. Por mais oscilante que seja o enredo, com seus momentos de humor que ora funcionam, ora não, problemas de lentidão no ritmo até não se fazem tão presentes, excetuando essas inserções de memórias que dão atravancadas no compasso do filme.

Ou seja, se temos um universo visualmente coerente, apesar de alguns excessos de computação gráfica não muito convincentes – a maquiagem digital vista na participação de Kyle MacLachlan é pavorosa –, ainda com premissas interessantes, O Mistério do Relógio na Parede perde sua força por não conseguir lidar bem com as pessoas que o povoam, sem relações sólidas entre si e deficitária de alguns minutinhos a mais para desenvolver melhor as dimensões de suas personagens. Afinal, o problema da filmografia de Eli Roth nunca foi o tipo de filmes que ele faz, mas sim como eles os faz.

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