Investigando mortes de rappers, 'Unsolved' satisfaz frustrando

A série 'Unsolved' gira em torno das investigações dos assassinatos dos rappers Tupac Shakur e Notorious B.I.G; confira crítica

Foto: USA Network/Divulgação
Os rappers são para muitos, referência mundial quando o assunto é hip hop - FOTO: Foto: USA Network/Divulgação

Unsolved, lançada na Netflix em junho, é uma das produções mais frustrantes no catálogo do serviço de streaming. A série consegue ser instigante na maior parte de seus dez episódios, traz um roteiro hábil em manipular de forma equilibrada três linhas do tempo conectadas, tomando como base fatos da investigação de dois crimes que marcaram a cultura pop nos últimos 20 anos, alvos de variados documentários, livros e reportagens. A resolução da trama  ainda é bem amarrada, mesmo frustrando. É possível que a frustração possa fazer parte de uma excelente experiência narrativa?

Entendamos. A trama de Unsolved gira em torno dos assassinatos dos celebrados rappers americanos Tupac Shakur (Marcc Rose) e Notorious B.I.G (ou Biggie Smalls, interpretado por Wavvy Jonez) em um intervalo de seis meses entre 1996 e 1997. A série dá conta de duas investigações, a primeira é feita em 1997, liderada pelo detetive Russel Poole (Jimi Simpson), membro do departamento de homicídios da Polícia de Los Angeles, inicialmente escalado para investigar apenas o caso de Biggie.

A outra investigação é iniciada em 2006 com o detetive Greg Kading (Josh Duhamel), que precisa montar uma força-tarefa federal para resolver o caso após Voletta Wallace, mãe de Biggie, processar as forças policiais por tentar encobrir a participação de policiais no assassinato do filho.

Acompanhando ainda a relação entre os rappers antes do assassinatos, o roteiro da obra precisa costurar essas três linhas do tempo, que vão se tornando complexas com o surgimento de nomes e conexões dentro dos dois casos, ao mesmo tempo em que lida com as tensões surgidas antes dos crimes. Assim, é abarcada a rixa entre rappers da Costa Oeste norte-americana, representada na figura de Shakur e da gravadora Death Row Records, e da Costa Leste, encabeçadas por Biggie e pela Bad Boy Records, que logo vai se ligando aos confrontos da guerra entre as gangues Bloods e Crips, além do possível envolvimento da polícia nos casos.

Narrativas cruzadas

É nessa costura em que se encontra um dos principais méritos de Unsolved, trabalhando bem tanto com paralelos, como em contrastes, fazendo um bom trabalho em não confundir o público com o volume de informações. A direção consegue estabelecer visualmente as diferenças entre as três linhas do tempo e a montagem é exitosa em realizar a transição entre esses momentos, com certeiros raccords inteligentes e orgânicos.

A relação entre Biggie e Pac é filmada com dimensões de tela diferente do restante da narrativa, contando com a presença de letterbox, aquelas faixas pretas que ficam nos cantos superior e inferior da tela. A investigação nos anos 2000 conta com uma iluminação mais natural, enquanto a dos anos 1990 aparenta ser mais filtrada, com fontes de luzes presentes no quadro recorrentemente.

Essa condução se mostra eficiente, mesmo que vez ou outra se perca um pouco em dramas que pouco acrescentam ao desenvolvimento geral, mas ainda assim o equilíbrio geral funciona. As investigações constituem na parte mais pragmática da narrativa, em que os dramas pessoais dos investigadores são mais explorados apenas quando impactam em suas condições de investigação, com Duhamel e Simpson aproveitando bem esses momentos mais pessoais quando aparecem.

Entretanto, é na história entre os rappers em que há os respiros mais subjetivos, até mesmo poéticos, além das perfomances mais sublimes. Marcc Rose, que já havia interpretado Shakur em uma rápida participação em Straight Outta Compton: A História do N.W.A, provou aqui que seu trabalho vai muito além de sua chocante semelhança física com o rapper falecido, compondo um Shakur que parece estar sempre tentando equilibrar a raiva com sua racionalidade.

Aparentemente mais sereno é o Biggie de Wavvy Jonez, entretanto consegue expressar uma mesma raiva em sua fala pausada e menos agitada. As atrizes Aisha Hinds e Sola Bamis entregam uma doçura misturada com dor nos papéis das mães dos cantores.

E, mesmo com todos esses pontos, a experiência final é a da frustração. Não que a produção não prepare o público, a começar pelo nome da série, Sem Solução, em tradução livre, e os letreiros no fim de cada episódio, apontando que mesmo após 20 anos, ninguém foi condenado. Talvez seja esse um dos aspectos mais positivos de Unsolved, a capacidade de conseguir instigar com o desenrolar da trama, mesmo já sabendo que a resolução não será das mais satisfatórias, assim como não foi nos assassinatos de Big e Shakur.

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