ENTREVISTA

Lourival Holanda: "Enquanto escrevem 'bonito', Graciliano escreve 'forte'"

O professor da Universidade Federal de Pernambuco fala ao JC sobre a obra do autor alagoano

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 27/10/2012 às 6:00
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Na entrevista abaixo, o professor da UFPE Lourival Holanda fala sobre Graciliano Ramos, um dos autores estudados no seu livro Sob o signo do silêncio.

JC - A obra de Graciliano é bastante diversa da de outros autores que entraram dentro do rótulo do modernismo regionalista. As questões que ele se fazia artisticamente eram de ordem diversa?
LOURIVAL HOLANDA -
O regionalismo em geral é paisagístico, mimético, tendendo a documentalismo. Regional resulta em redundância. Cedo se torna um estereótipo saturado. Em Graciliano é uma circunstância – só. Porque ele aposta numa linguagem-filtro (deixando de lado a borra do estereótipo) ele aprofunda nossa experiência humana (pode ser lido em qualquer lugar) – e alarga nossa experiência literária (em qualquer tempo).

JC - Um dos pontos mais ressaltados da produção de Graciliano é o seu cuidado formal. O que significava essa "angústia da forma", como dizia Álvaro Lins?
LOURIVAL -
Graciliano é muito exigente com a linguagem; ele sente que ela mascara muita coisa – por isso tenta desnudá-la, reduzi-la ao essencial. (Um risco: quando todo mundo escreve “bonito”, ele escreve “forte”. Encontrar um estilo assim angustia, certamente).

JC - Em Sob o signo do silêncio, você mostrar como o silêncio é um elemento da narrativa de Vidas secas (e, de forma diversa, também em O estrangeiro). Que intuito Graciliano tem com a "exploração" do silêncio nesse livro? É um traço que se estende para outras de suas obras?
LOURIVAL -
Graciliano, Flaubert, João Cabral: esses fazem uma conspiração do silêncio contra a alienação pela linguagem. A linguagem-filtro é uma escolha estética que subentende uma exigência ética. Eles pressentem que as formas do discurso manifestam o modo como se estrutura nosso universo intelectual. A sociedade priva Fabiano de uma linguagem que poderia fazê-lo reivindicar mais vida, mais sonho. Quase todos os personagens de Graciliano estão às voltas com o fato de escrever.

JC - Em que medida a obra de Graciliano continua dialogando com o contemporâneo - tanto a partir dos leitores como dos escritores e da crítica?
LOURIVAL -
A cultura virtual está redescobrindo uma coisa esquecida na mídia contemporânea: as formas breves, a linguagem concisa, a economia verbal – e a objetividade.  O twitter pode ser uma escola de concentração, de adensamento expressional. [Nem é tanto uma ruptura da tradição, mas uma volta a ela: de Baltazar Gracián a Valéry ou Nietzsche]. Todo “twitteiro” deveria ler Graciliano: uma lição, cada vez mais oportuna, de economia verbal – contra tanta desatenção e descaso com a linguagem, visitar Graciliano tonifica. Com certeza.

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