ENTREVISTA

Pedro Américo de Farias fala sobre Graciliano

O escritor pernambucano fala sobre a obra do autor de Vidas secas por ocasião dos 120 anos de nascimento

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 27/10/2012 às 6:00
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Na entrevista abaixo, o escritor Pedro Américo de Farias fala sobre Graciliano Ramos, tema do seminário de que participou nesta semana.

JC - De que forma a obra de Graciliano pode dialogar com um leitor ou escritor contemporâneo?
PEDRO AMÉRICO DE FARIAS -
Acredito que a dificuldade de comunicação entre escritor e leitor, pertencentes ou não à mesma geração, em parte depende da eficiência do primeiro, outra parte do grau de informação do segundo quanto à construção literária que a obra apresenta. Penso que Graciliano Ramos, que prezava muito a imaginação e desprezava a mentira, interessa e agrada ao leitor de hoje, tanto quanto ao de sua época, pela seriedade com que tratava seus temas, todos muito pertinentes à vida humana, no limite entre o desespero e a resistência possível. O grande crítico literário Álvaro Lins, em um dos seus artigos sobre os personagens de Graciliano, trata todos eles como pessoas de 'vidas secas', que trazem consigo a angústia da condição humana. O leitor de hoje, que deseje encontrar em uma obra literária algo mais do que entretenimento ou consolo, bem como o escritor que busque, não um figurino a ser copiado, mas alguém que o ajude a refletir sobre a realidade e sobre a criação literária - que passa pela crítica da linguagem - têm muito a ganhar com a leitura ou releitura da obra (de preferência, completa) de Graciliano Ramos, que se pode considerar um dos mais honestos escritores brasileiros de todos os tempos, pelo respeito à criação artística e ao pensamento humanista.

JC - O que você aponta como traços de destaque da prosa do escritor alagoano?
PEDRO -
São muitos os traços que podemos destacar. Em poucas palavras, até para honrar o homenageado, convém lembrar o que possivelmente seria sua principal preocupação como escritor: a busca da palavra essencial; concisão não basta, é preciso que a palavra exprima da forma mais concreta possível o pensamento. A isso devemos acrescentar a ironia, inclusive a auto-ironia. Mas acho que quando Graciliano se autodeprecia, ao julgar-se incapaz de escrever qualquer coisa que valha a pena, ao depreciar cada uma de suas obras, tachando-as frequentemente de merda, porcaria ou coisa parecida, ninguém, em sã consciência pode acreditar que esteja praticando um haraquiri. Ao ler as suas 'autocríticas', sempre tenho a impressão de que, na verdade, ele estaria querendo dizer mesmo era o seguinte: Vocês aí, que escrevem tanta bobagem, com tanta facilidade, deviam ter mais responsabilidade e cuidar com mais respeito dos temas e da linguagem, criando obras mais consistentes, pois são formadores de opinião, mas também são artistas. Se Graciliano não pensava nisso, penso eu e digo por ele: não era de si mesmo que falava mal; certamente, sabem disso os mais inteligentes críticos estudiosos de sua obra.

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