Havia uma menina no palco, um Brasil, um Sertão, uma Bahia, um Pernambuco. Havia Portugal, amor, lembranças e, claro, sincretismo. Na última quinta-feira, quando abriu a oitava edição da Festa Literária Internacional de Pernambuco (Fliporto), Maria Bethânia não só era uma poetisa como também a atriz que ela teima em dizer que não é, na leitura poética Bethânia e as palavras.
Bethânia costuma dizer que tudo que aprendeu com relação à postura cênica, deve à diretora e atriz Bibi Ferreira. Em Bethânia e as palavras ela ratifica o comentário com sua precisa e emotiva interpretação.
Vestida de blazer branco, com uma calça azul marinho, pulseiras de ouro no braço esquerdo, ela fez suas orações e foi à cena, saudou Iansã e Fernando Pessoa. A mão que ergueu (uma das grandes marcas de Bibi) pontuou a primeira frase de muitas que dispararia durante a apresentação.
Primeiro, ela era uma nordestina saudosista, guiada por Ascendo Ferreira (“Vou danado pra Catende”), cantarolando Luiz Gonzaga (“Só deixo o meu Cariri / no último pau-de-arara”). Depois, surgiu a Bethânia que falava do amor, da solidão, dos sentimentos. Sob a simples mas enfática iluminação, com óculos de grau que se revezavam entre estar no rosto e nas mãos, a intérprete leu textos de Clarice Lispector, Guimarães Rosa e Fernando Pessoa, no compasso do violão de Carlos César e do pandeiro de Paulo Darflin.
O olhar sereno e o sorriso da baiana levavam o público a Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano. Dos versos do poema Ciclos, de Nestor de Oliveira, seu professor ginasial, às cantigas e pontos do candomblé, a Maricotinha louvou Nossa Senhora, encontrou com o Menino Jesus, e enfim chegou ao desejo de liberdade. Havia Castro Alves brotando de Bethânia e havia Mário de Andrade gritando dentro dela.
Para encerrar, Maria Bethânia cantou Antônio Maria e emocionou com Reconvexo. Ergueu as mãos, pulou e agradeceu. Agora, ela só volta ao Recife em janeiro, dia 25, para seu novo show Carta de amor, que estreia amanhã no Rio de Janeiro, com a direção musical de Wagner Tiso.
Leia a matéria no Caderno C deste sábado (17).