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“Particularmente, não poderia viver sem a minha arte. Mas nunca coloquei ela acima de tudo. Se, por outro lado, ela me é necessária, é porque ela não pode ser separada dos meus companheiros e me permite viver, tal como sou, no nível de todos”. A frase do escritor francês Albert Camus (1913-1960) ao receber o Nobel da Literatura, em 1957, é uma boa síntese da sua atuação em vários fronts, da ficção ao teatro, do jornalismo à filosofia: para ele, o posicionamento ético era tão fundamental quanto a arte e a política, justamente porque se confundia com a própria vida.
Nesta quinta (7/11), o mundo todo comemora o centenário do autor franco-argelino, um dos principais nomes do século 20. Largamente prestigiado em vida, o escritor que afirmava ser o suicídio a grande questão do seu tempo teve uma trajetória produtiva e curta, interrompida por um acidente de automóvel – Camus faria o percurso de trem e trocou de ideia em cima da hora. A obra mais conhecida, entre clássicos como A peste e A queda, é o romance O estrangeiro, de 1942, da chocante frase inicial que transborda uma indiferença angustiante: “Hoje morreu a minha mãe. Ou talvez ontem, não sei bem”.
O livro faz parte do seu “ciclo do absurdo”, iniciado com o ensaio O mito de Sísifo e concluído com a peça Calígula. Como aponta o professor de Letras da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Lucilo Varejão Neto, essa noção em Camus dialoga com sua ideia de um mundo silencioso, impassível diante das nossas angústias e questões. “O absurdo é a filosofia que procura mostrar o desencontro entre o homem e o mundo”, aponta o autor de De Mersault a Meursault: visões do absurdo.
O filósofo e professor francês radicado em Pernambuco Oussama Naouar, também da UFPE, destaca que Camus é um dos casos de “um escritor celebremente desconhecido”. “Ele acaba sendo um autor que todos conhecem, mas que ninguém volta a ler. Existem mais comentários do que de fato pessoas retornando ao texto”, opina o pesquisador, convidado pela Aliança Francesa para uma conversa informal sobre Camus no próximo dia 29. “O que o move é a crença e a certeza de que a literatura nos diz algo, que aponta coisas que outras disciplinas não podem fazer”.
Para o crítico e ensaísta Lourival Holanda, é importante ressaltar tanto o trabalho de linguagem de Camus – tema do seu livro Sob o signo do silêncio, que analisa a concisão da linguagem de francês e de Graciliano Ramos – como sua preocupação com a dimensão ética na literatura e na filosofia. “A preocupação ética é uma constante. Mas, ao mesmo tempo, uma feroz necessidade de guardar independência de julgamento. Sempre foi contra os extremismos – ‘as almas fracas e odientas’ segundo ele. Sartre pontifica a partir de supostas certezas; Camus é um homem inquieto, que avança sondando, buscando – nisso está mais contemporâneo, mais perto de nós”, comenta o professor da UFPE. O diferencial, então, seria a preocupação do posicionamento do homem diante das questões práticas e também atemporais do homem. “A originalidade de Camus não é filosófica: é ética; desespero e grandeza”, define Lourival.
Leia a matéria completa no Jornal do Commercio desta quinta (7/11).