O frevo-canção Boneca, uma das faces do disco inaugural da gravadora Rozenblit, lançado para o Carnaval de 60 anos atrás, tem como co-autor o alagoano Aldemar Paiva, que assina a música com o maestro José Menezes. Aos 87 anos, Paiva continua com a memória afiada, ao relembrar sua primeira composição gravada, que o ligou por muitos anos à gravadora dos irmãos Rozenblit. “Eu trouxe a música Boneca de Maceió. Menezes fez o arranjo, orquestrou e nos tornamos parceiros. Depois dela tive outras músicas gravadas no selo Mocambo. Mas eu mesmo nunca gravei, porque minha voz para cantar nunca foi boa.”
A voz para falar, no entanto, foi uma das mais ouvidas no rádio pernambucano: “Eu vim para o Recife por causa de Chico Anysio. Ele recebeu uma proposta muito boa para sair daqui, só que o contrato dele tinha uma multa que ele não podia pagar. Ele estava apaixonada por Nancy Wanderley, sua primeira mulher, e queria ir de todo jeito. Arnaldo Moreira Pinto, da Rádio Clube, disse que liberava se ele encontrasse alguém para ficar no lugar dele”, continua Aldemar Paiva.
Ele ainda não conhecia Chico (os dois se tornaram grandes amigos), mas José Renato, o primeiro publicitário do Recife: “Tinha uma agência na Rua da Concórdia. Ele me conhecia do rádio alagoano, e me indicou. Lá eu ganhava uns dois mil cruzeiros, aqui me ofereceram oito mil. Não tinha como recusar”, diz Paiva.
No Recife, ele se tornou compositor de sucesso e homem de rádio ainda mais bem-sucedido. Foi o criador de um novo formato, um programa matinal, de notícias, entrevistas, sem script: “Eles tinham horário livre. Um dia, numa roda de conversa, lancei o desafio para fazer um programa com duas horas pela manhã. Foi assim que nasceu o Pernambuco, você é meu”. O nome do programa inspirou que Aldemar Paiva fosse co-autor de mais um clássico do frevo-canção: “A música surgiu depois do programa. Eu fiz a letra, “Terra boa, meu Pernambuco/que faz/frevo bom e maracatu/tem mais/banho em Beberibe/cachaça gostosa/mangaba cheirosa/ai! aii! ai/tudo isso minha terra tem” (cantarola).
A melodia é de Nelson Ferreira, de quem foi parceiro também em Brasil, campeão do mundo (1962), Caiu a sopa no mel (também com Sebastião Lopes), Elegia a Calheiros (1956) e Evocação nº 6 (1969), todas lançadas pelo Mocambo, da Rozenblit.
Aldemar Paiva trabalhou na gravadora como diretor musical, com Nelson Ferreira, de quem se confessa grande admirador: “Tinha uma diferença fundamental entre ele e Capiba. Um foi compositor, Capiba, e o outro compositor que conhecia piano a fundo, Nelson Ferreira”. Paiva conta que trabalhou na Rozenblit até que a gravadora começou a dar sinais de que não iria muito longe: “Eu fui deixando a Rozenblit aos poucos. Chegou uma época que ia lá e não tinha o que fazer. Aí parei. Mas a importância dela para a cultura pernambucana foi inestimável.”