Yanaya Juste, a Ya, é uma das fundadoras do projeto Arrete, grupo feminino de destaque dentro da cena hip hop pernambucana. Aos 28 anos, atua como MC, grafiteira, estilista e videomaker, participando ativamente da composição das letras que entoa nos palcos. Em entrevista ao Jornal do Commercio, ela relembra o passo a passo da trajetória com o rap, as conquistas e o machismo ainda presente no gênero musical que abraçou como profissão.
JC – Como foi o seu primeiro contato com o Rap?
YA JUSTE – Foi na adolescência, entre 13 e 14 anos. Comecei a aprender sobre rimas quando entrei para o grupo Irmanada, no Recife. Estudei a métrica dos versos, refinei minhas poesias. Em 2007 fui morar em João Pessoa (PB), onde ganhei o prêmio de artista revelação do ano durante o 1º Festival de Rap da Paraíba. Gravei discos, fui uma das artistas a receber o prêmio Preto Ghoes, ofertado pelo Ministério da Cultura (MinC) e pelo Governo Federal e participei do fórum de música da cidade. Em 2012, resolvi que era hora de voltar pro Recife e continuar meu trabalho aqui. Foi quando me juntei a Weedja Lins e Nina Rodrigues (companheiras no Arrete) e gravamos o clipe da música Arrete Não, que acabou dando nome ao grupo que temos hoje.
JC – Qual a influência do lugar em que mora na música que faz?
YA JUSTE – É fundamental. Eu cresci transitando entre os bairros de Prazeres e Candeias, onde vivo hoje, berços da cultura hip hop em Pernambuco. São duas comunidades que, como muitas outras de Jaboatão dos Guararapes, estão cercadas por homens e mulheres que escutam e fazem rap, dançam break ou grafitam. Pessoas de uma geração anterior à minha, que foram pioneiras e continuam a inspirar os que chegaram depois.
JC – O machismo ainda é muito presente no hip hop? Algum episódio em particular impulsionou sua vontade de escrever e cantar sobre emancipação feminina?
YA JUSTE – Eu sou filha de pai francês, artista plástico, e mãe filósofa, que desde cedo me incentivaram a ter contato com todo tipo de expressão artística. Tive uma educação muito libertária, nunca ouvi da minha família que não poderia fazer algo por ser mulher. Na medida em que cresci, percebi que o mundo de fora não era tão igualitário quanto o da minha casa, e achava inacreditável que mulheres tivessem a autonomia tolhida por causa de seu gênero. Acabei passando por um relacionamento com um companheiro abusivo e entendi que essa é a realidade de muitas mulheres. Dentro da cultura de rua, do hip hop, ainda existem homens que olham torto para nós, mas, aos poucos, temos tomado nosso espaço e mostrado que somos tão boas quanto eles. Quebrar essa opressão é importante, por isso, no Arrete, usamos elementos como sarcasmo e ironia para dizer que estamos aqui.
JC – Quais mulheres do rap te inspiram?
YA JUSTE – Há muitas rappers inspiradoras fazendo e cantando suas rimas em todo o país. A Flora Matos (de Brasília), a Lurdez da Luz (SP) e, principalmente, a Karol Conka (PR), que chega sem baixar a cabeça e afirma: sou mulher, sou negra, e cheguei para ficar. Eu acho incrível! Mas claro que há artistas de outros gêneros musicais que estão sempre nos meus pensamentos e acabam sendo refletidas de alguma forma no meu trabalho, como a Nina Simone, que foi uma mulher forte e corajosa, além de uma artista fantástica.
JC – E você, considera-se influência para outras mulheres? Qual a recepção, principalmente das adolescentes, ao seu trabalho?
YA JUSTE – Creio que minhas companheiras de grupo e eu temos papel importante junto às outras mulheres que fazem parte da cena da cidade, de elevar a autoestima das mais novas e mostrar que a mulher nordestina e periférica tem que ser ouvida. Recebemos um retorno muito bom, tanto nos shows, com muita gente cantando nossas músicas, quanto pela internet, e tem sido maravilhoso. Há alguns meses, algumas meninas criaram um fã clube para nós e percebemos que nossa mensagem as tem tocado de verdade. Costumo falar que também estou muito feliz com o momento atual da produção feminina no rap e espero que cada vez mais outras se sintam à vontade para seguir os próprios passos.