SÃO PAULO – Era uma fria tarde paulista, na sede da Vevo Brasil, quando a cantora Ivete Sangalo surgiu toda de branco no salão da cobertura. Com uma saia esvoaçante, se posiciona na poltrona da qual encara de frente o batalhão de jornalistas de todas as partes do Brasil. “Peraê, não bate (foto) ainda! Pra pegar aquela foto e dizer ‘Ivete paga num sei quê’, não vou pagar”, disse a baiana, arrancando risos nos primeiros segundos de sua coletiva de imprensa para apresentar o novo trabalho: o CD duplo e DVD Ivete Sangalo – Acústico em Trancoso (Universal Music, 2016).
Para quem já gravou trabalhos em lugares grandiosos como a Arena Fonte Nova, o Estádio do Maracanã e o Madison Square Garden, em Nova York, executar um álbum acústico parece ser simples: basta um banquinho, violão, um local pequeno, pouca gente, silêncio e calmaria. Mas, quando se trata do furacão baiano Ivete Sangalo, até este formato recebe seu toque de “tirar o pé do chão”.
“Foi a primeira coisa que eu falei com os meninos. O formato do acústico ele é muito bem-vindo, mas não combina comigo. Então não seria honesto eu fazer uma coisa só porque é um formato, ainda mais que isso não combina comigo também seguir formatos”, explicou a cantora, que brinca: “Você pode ver nas fotos, mas alguém tem que gritar pro povo: É acústico! Mas é um Acústico de Ivete. Aviso logo!”, levando os jornalistas aos risos novamente.
Mesmo com toda a energia da cantora, o lado intimista de um acústico se revela no cenário escolhido para o DVD: o pequeno vilarejo de Trancoso, na Bahia, no palco aberto do Teatro L’Occitane, que quebrou a sua rotina de lugar para a música clássica e erudita para receber alguém de segmento completamente oposto. “Quando eu cheguei lá, fiquei emocionada, porque é a céu aberto. Nada mais acústico do que o barulho da própria natureza, é daí que a gente traz essas referências. E aquele mar, aquela floresta, aquele lugar, a terra batida, foi algo bem conectado com a ideia”, derrete-se Ivete.
Além de introduzir nesse show instrumentos como sanfona, cavaquinho, bandolim e piano acústico, a baiana se gaba por ter mais canções suas no projeto. Ao todo sete, num universo de 25 faixas. Entre as autorais, está Seus Planos, escrita por ela em parceria com Gigi, músico de sua banda. A letra faz menção indireta a Marcelo Sangalo, seu filho de seis anos, como fonte de inspiração. Ao explicar a composição, quase se deixou levar pela emoção na coletiva: “Nesse momento eu olhando pra ele, meio que vigiando assim, cada movimento, nessa meia hora, nessa uma hora aí, me veio essa letra: ‘Passar o tempo lhe admirando...’. E aí quando eu fui cantar, a gente lembra (pausa) desse amor doido, né? Porque é bom demais, né? Uma ‘inspiraçãozinha’ arretada”, declarou.
Mesmo com 22 anos de carreira e todo o seu prestígio, a cantora não se esquivou de falar de assuntos mais polêmicos como homofobia e violência: “O mundo está do jeito que está porque as pessoas não se libertam para o amor. As pessoas se prenderam no ódio, no julgamento. Não existe opinião, existe julgamento”, afirmou ela, no único momento em que sua voz ficou mais firme e, como ela mesma colocou, até um pouco exaltada. Mas isso não tirou o brilho de alguém que reafirma, neste projeto, o que tem de melhor: talento e versatilidade num novo modo de ouvir Ivete.
*O repórter viajou a convite da Universal Music.