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Diomedes, Luiz Lins e Mazili: O ano lírico do hip hop pernambucano

Conheça a PESQUAD, selo pernambucano de hip hop que vem sendo o marco divisório na produção do gênero

JEFFERSON SOUSA
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JEFFERSON SOUSA
Publicado em 27/11/2017 às 13:00
Foto: Leo Motta/ JC Imagem
Conheça a PESQUAD, selo pernambucano de hip hop que vem sendo o marco divisório na produção do gênero - FOTO: Foto: Leo Motta/ JC Imagem
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“Sejam bem vindos ao classic, nigga! O Aprendiz, baby...”, canta o rapper pernambucano Diomedes Chinaski na primeira linha de Cocada de Sal, A Teoria, terceira e uma das mais intensas músicas do seu novo EP, Re$$entimentos II, lançado na última sexta-feira (24). Se não houvesse a barreira cultural e territorial entre Brasil e países de língua inglesa, provavelmente nomes como Tyler, The Creator e MF Doom estariam ligando para parabenizar toda a equipe da PESQUAD e o paulistano DJ Caique pelo projeto, afinal, como previsto por integrantes do Hip-Hop nordestino em 2016, “2017 é o ano lírico” e aqui está mais um exemplo dele.

Subintitulado de A Origem do Sofrimento na Alma dos Compassas, o EP explora as influências do jazz, soul e funk que Diomedes e Caique compartilham. “Ele já trabalhava muito com sampler [método de retirar e adaptar trechos de outra música] e eu sou apaixonado pela energia de algumas músicas de décadas passadas, então deu muito certo", iniciou Chinaski, em entrevista ao TV JC (disponível aqui), onde também explicou que o projeto nasceu após o beatmaker convidá-lo para integrar o álbum Coligações Expressivas 4 (2017). “Para eu participar do disco, ele me enviou vários instrumentais, sendo que foram tantos, que não consegui fazer só uma música, fiz várias, surgindo, a partir daí, a ideia desse EP colaborativo”, ressaltou.

Fã declarado do Tyler, as 6 inéditas do EP de Diomedes flertam sonoramente com elementos do último álbum do californiano, Flower Boy, porém, as letras do pernambucano, transitando no limbo do seu redemoinho de problemas íntimos e cotidianos extremamente bairristas, jogam sua obra em um resultado autêntico que dispensa comparações: “Peça Cyclone, cordões, gírias e oitões/ Novinhas, bregafunk, futebol, pichações/ seguimos sem o sol na escuridão eterna”, canta, com uma voz enfurecida, na terceira faixa.

Nos comentários das músicas no YouTube, alguns fãs relatam traumas pessoais que se assemelham com cada canção. Por exemplo, ainda em Cocada de Sal, A Teoria, onde Diomedes canta “Meu bairro ninguém fica rico igual nos filmes/ É apenas sangue, por isso já nem chamo crime/ É sempre PM gordo, sempre brega lotado/ O filho de alguém morto e grana pro advogado”, um usuário assinando como Luiz Henrique conta que viu dois colegas sofrerem abuso de policiais militares na última quarta; já outro, Júlio César, presta luto a um amigo sem explicitar a causa da morte. Em síntese, com participações musicais de Miró da Muribeca, A Orquestra Imaginária, Zaca de Chagas – membro da “Chave Mestra”, grupo com Moral, Faraó, Louco do Texas e Diomedes –, Luiz Lins e Romariz, e identidade visual de Rostand Costa, Re$$entimentos II é uma obra dedicada ao universo do próprio autor mas, através de sua sinceridade e profundidade, provoca familiaridade.

Ouça o novo ep de Diomedes e DJ Caique aqui:

PESQUAD

PESQUAD é o nome que mais se ouve quando o assunto é Hip Hop na região, pois, além de Diomedes, o selo do beatmaker Mazili ainda conta com Luiz Lins, Gustto e Jnr Beats. Desde sua fundação, em 1 de agosto de 2016, o serviço intenso não deu trégua, assim como os resultados positivos. “Ano passado foi quando comecei a levar a série o que eu fazia enquanto produtor musical, investindo em equipamentos e procurando firmar parcerias. Sem demora, as primeiras músicas já começaram a estourar, como Sulicídio, 999 (de Baco Exu do Blues), Dexunego (de Diomedes), Jamais (de Luiz Lins) entre outras”, contou Mazili.

Sulicídio foi uma diss – música direcionada para atacar ou se defender de uma pessoa ou grupo ­– feita por Diomedes e o baiano Baco Exu do Blues em resposta a um notável número de rappers sulistas que vinham ofendendo a cena nordestina, no qual ocasionou em um grande alvoroço e impulsionou a visibilidade das produções dos dois lados.

Um fenômeno recente do selo é o pernambucano Luiz Lins, com aproximadamente 2 anos de carreira, o cantor de R&B vem alcançando repercussões surpreendentes com a popularidade de suas músicas. O maior exemplo é A Música Mais Triste do Ano, produzida por Mazili e com guitarras de Moral, ela foi lançada há 5 meses atrás e já contabiliza 9 milhões de visualizações no YouTube e mais de 2,5 milhões de execuções no Spotify. “Tanto o processo das músicas quanto da maioria das coisas que escrevo é muito natural, procuro não fazer nada complicado para não perder o sentimento e só focar na técnica”, iniciou Luiz, passando um curto tempo em silêncio, e continuou: “Eu tenho dificuldade de me expressar e isso reflete em tudo na minha vida, então eu acabo demorando para escrever, também porque eu só acabo quando o resultado realmente soa bom para mim”, concluiu.

Assinado por Mazili e pelo próprio Luiz, a produção do primeiro disco de Lins está em andamento e tem previsão de sair no primeiro semestre de 2018. “As músicas giram em torno do mesmo universo, mas não estou preso em nem uma estética, estão bem livres, as letras e os beats estão bem abertos, tudo está em construção”, revelou Luiz. Perguntados sobre o futuro do R&B no País, Luiz exaltou a facilidade que o gênero tem em se comunicar com outros ritmos, mas não deixou de pontuar a falta de artistas produzindo na área: “eu mesmo não tenho disco na rua, ainda”.

"Isso tudo é só o começo", garante Mazili. Possuindo em torno de 60 milhões de cliques - somando todos os conteúdos em plataformas digitais -, o trio da PESQUAD faz parte de uma ascensão ímpar do Hip-Hop nacional onde, de maneira independente, estão criando novas possibilidades para o futuro fonográfico e cultural do Estado.

Confira entrevista de Diomesdes Chinaski, Luiz Lins e Mazili na TV JC:

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