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Naná Vasconcelos lançou Saudades há 40 anos

Disco é considerado um dos melhores de sua obra

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 27/01/2019 às 9:56
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Disco é considerado um dos melhores de sua obra - FOTO: foto: JC Imagem
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Depois de anos ausente do País, Naná Vasconcelos consolidou uma carreira internacional, com Airto Moreira, Dom Um Romão e Djalma Correa, para citar os mais conhecidos, estabelecendo a percussão brasileira como referência no jazz. Em 1980, ele veio ao Rio de Janeiro para se apresentar, com Egberto Gismonti, no Rio Jazz Monterey Festival. O público assistiu aos dois como se estivesse numa missa, em silêncio, Egberto Gismonti (que também tocou com banda), numa viola, e Naná num berimbau. Depois da apresentação, uma salva de palmas ensurdecedora da plateia.

Juvenal de Holanda Vasconcelos, crescido em Sítio Novo, Olinda, não ficou de ego inflado pelos elogios e adulação recebidas. Pelo contrário, lamentou que enquanto gravadoras estrangeiras se ofereciam para gravá-lo, as nacionais o ignoravam. “Esta é a minha terra, eu gostaria de morar e trabalhar aqui, fazer a minha música. Eu estou com um conjunto meu de percussão, e uma gravadora alemã, a ECM, me disse ‘quando seu trabalho estiver pronto, é só avisar que nós gravamos’. Eu gostaria muito de ouvir isso de uma gravadora brasileira. Agora eu moro em Nova Iorque, estou trabalhando lá e fazendo turnês pelos Estados Unidos, Europa e Japão. Eu gostaria de ter a mesma condição de trabalho aqui. Minha ideia é gravar aqui o meu próximo disco, porque o material está aqui. Minha ideia é tocar na rua, com percussão, para o povo, em praça pública”, disse Naná na época.

 Ele não gravaria o próximo disco no Brasil. Só o faria 14 anos mais tarde, o álbum Contando histórias, de 1994, lançado pela Velas. Em 1980, Naná Vasconcelos divulgava o disco Saudades, considerado um de seus melhores álbuns, gravado em março de 1979, no Tonstudio Bauer, em Ludwigsburg, na Alemanha Ocidental (na época o país ainda estava dividido em dois lados considerados opostos), com a participação de Egberto Gismonti, e da Stuttgart Radio Symphony Orchestra, dirigida pelo maestro Mladen Gutesha. O disco foi lançado pela ECM, gravadora fundada pelo alemão Manfred Eicher no ano de 1969.

 Lançado no Brasil pela Warner, depois da vinda do músico para o Monterey Jazz Festival, Saudades faz 40 anos em 2019. Não é um disco fácil, para tocar no rádio. Tampouco a ECM tinha uma catálogo radiofônico, seus discos são biscoitos finos para paladares requintados. Naná Vasconcelos lançou vários discos pela gravadora, trabalhos solo, e com Egberto Gismonti, com Pat Metheny, com o Codona, grupo formado por ele, Collin Wallcott e Dom Cherry.

Saudades, que ganhou quatro estrelas e meia, num máximo de cinco, da crítica da Downbeat, é uma trilogia não intencional, com África Adeus, gravado na França, em 1972, e Amazonas (1973). África Adeus foi gravado na França, lançado pela Saravah, pequena gravadora do músico e do produtor Pierre Barrouh, que fez Naná voltar ao Brasil achando que o disco interessaria às gravadoras nacionais.

Num almoço na casa de Jorge Amado, em Salvador, Naná conheceu André Midani, então poderoso chefão da filial brasileira da Phillips. Ele alegou que não poderia lançar o África Adeus, porque era de outra gravadora, mas sugeriu que o percussionista gravasse disco no Brasil, este provavelmente mais acessível. “E me disse, se você tivesse outro: Eu disse: tenho. E foi quando fiz o Amazonas. Isso porque eu estava impressionado aqui no Brasil com a Transamazônica. Pensei: ‘estão rasgando e destruindo o Amazonas’. Foi um disco que antes de sair, quando eu regressei à França, percebi que cheguei em um momento errado, porque ninguém queria a música instrumental”.

 MEMÓRIA

África Adeus só teve uma edição brasileira em 2015, o disco original com um livro, projeto contemplado num edital da Funarte. Os primeiros discos de Naná Vasconcelos, no entanto, não tiveram a mesma sorte. A exceção será Saudades, que também será relançado com um livro em 2020. A notícia foi antecipada por Patrícia Vasconcelos, que se mudou para Nova Iorque, com Luz Morena, sua filha com Naná Vasconcelos. Ela estuda psicologia e pretende desenvolver uma tese com o trabalho de Naná como Musicoterapeuta.

A memória do legado do marido é o combustível que a move. O casarão em que morava com o músico e a filha no Rosario, Zona Norte do Recife, está fechado. No Recife está parte da parafernália instrumental de Naná Vasconcelos, que incluía de caxixis africanos, a um aparato percussivo que o músico batizou de Penibac e as Bacias Volantes, composto por penicos e bacias,  uma de suas últimas invenções, criada, em 2015, quando já se submetia a tratamento médico.

 Recentemente nos Estados Unidos foram encontrados instrumentos que se consideravam perdidos. Foram adquiridos pelo músico Rich Stein, que os devolveu a Patricia Vasconcelos. Um dos motivos da mudança para Nova Iorque deve-se às facilidades que os EUA oferecem para lidar com os direitos da extensa obra de Naná Vasconcelos. Ela negocia atualmente o relançamento do álbum Naná Vasconcelos e Augustin Pereira Lucena, gravado em 1971, o título mais raro da discografia do percussionista, que será lançado na Alemanha.

Naná Vasconcelos – Saudades é um livro assinado pelo inglês Dan Sharp, e será publicado na Inglaterra: “Não é apenas sobre o disco, mas sobre a carreira de Naná entre 1970 e 1980”, esclarece Patrícia. A respeito de uma exposição sobre o músico, no Musical Instrument Museum, no Arizona, Patrícia faz uma correção: “Saiu na imprensa que eu vou colocar todos os instrumentos no museu do Arizona. Não serão todos. O Curador do Museu foi aí, na minha casa, e eu disponibilizei apenas três instrumentos para eles poderem dar inicio a elaboração de um espaço para Naná, no museu, agregado também a vídeos e imagens etc.

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