“É uma foto que não era para capa/Era a mera contracara, a face obscura/O retrato da paúra quando o cara/Se prepara para dar a cara a tapa”, versos escritos por Chico Buarque inspirado na fotografia que lhe foi tirada numa delegacia de polícia quando ele, adolescente, foi preso por puxar um carro, com um colega. A foto que não era para a capa (e está na capa do álbum Paratodos) é uma das 210 imagens que ilustram o livro Revela-te, Chico (Bem-Te-Vi Produções Literárias), uma fotobiografia do cantor e compositor carioca, organizada pelo pernambucano Augusto Lins Soares, com textos de Joaquim Ferreira dos Santos. No formato capa dura, um livro de arte, com 240 páginas, e que custa R$ 145.
Quando foi anunciada sua publicação, em plena polarização política, durante a campanha presidencial, insinuou-se que o artista se valeu da Lei Rouanet para produzir o livro, que não tem nada a ver com Chico, senão ser ele o tema da obra. O organizador, por sinal, nem sequer conversou pessoalmente com Chico Buarque sobre: “Falei apenas com Mário Canivello, assessor dele. Como seria um livro de imagens tive que pedir autorização, que foi dada. Mas não precisava falar com Chico porque iria usar fotos que já existiam. Ele não iria posar para as fotografias. Mandei um livro para ele, mas não conversamos”, conta Augusto, que propôs em 2016, à editora, a publicação de um livro de arte:
“Como gosto muito de fotografias, pensei numa fotobiografia, coisa que há muito pouco no Brasil. Um livro que contasse a vida de alguém nas fotos, e daí pensei em Chico. Conversei com Canivello para que Chico autorizasse, e fui em busca das fotos. Já havia começado uma pesquisa em arquivos de jornais”, explica. A princípio tem-se a impressão de uma empreitada fácil. Afinal poucos artistas brasileiros de sua geração foram tão fotografados quanto Chico Buarque. Porém o organizador não queria contar a história pictórica do cantor com fotos que todo mundo conhece:
“Realmente encontrei muita coisa, nos arquivos dos jornais, no Instituto Antonio Carlos Jobim, que está digitalizando um acervo de Chico, no Museu da Imagem e do Som, nos jornais, com fotógrafos, mas mesmo as conhecidas, eu optei pelas sobras, as que não tinham sido publicadas”, diz Augusto Lins Soares. Ele já foi das redações das revistas Bravo e Casa Vogue, e colaborou, entre outros, nos livros Jean Manzon: retrato vivo da grande aventura (2007), Olho da rua: o Brasil nas fotos de José Medeiros (2006), e Brasil: um século de futebol (2006):
“Sou do Recife, me formei em arquitetura, fiz Comunicação Visual na UFPE, e em 1994 fui para São Paulo fazer um curso e fiquei por lá durante 25 anos. Estou de volta ao Recife, mas eventualmente fazendo trabalhos em São Paulo”, conta Augusto.
CONCEITO
Revela-te Chico é um painel múltiplo iniciado com retratos de Chico Buarque, seguindo uma linha de tempo: “Esta parte traz os retratos, uma imagem valendo por mil palavras. Apenas fotos, autor e ano em que foi tirada, começando com o retrato do artista quando um jovem de 22 anos, ídolo nacional, nas paradas com A Banda. Chico posa com violão, lagoa Rodrigo de Freitas ao fundo. Foto feita por David Andre Zing para um perfil do artista na revista Realidade em 1966, termina com foto de Léo Aversa, de 2017, quando Chico se preparava para cair na estrada com o show Caravanas.
Entre elas há preciosidades, feito uma foto feita em Roma, em 1969, por Cristiano Mascaro. Aqui se mostra as marcas nítidas do tempo no artista, exatamente pela ausências de textos explanatórios”. Segue mais uma timeline fotográfica de uma vida inteira. Francisco Buarque de Holanda de calças curtas, de farda da escola, num momento descontraído com o pai, Sergio Buarque de Holanda, com a mãe, e todos os irmãos e irmãs divertindo-se na neve italiana em 1954, em Roma, onde a familia morou.
“Era ótimo aluno de português, a professora Miss Tuttle despediu-se dele em mensagem profética: ‘Quando o tempo passar e você estiver crescido vou procurar contos e romances escritos por F.B de Hollanda”, escreve Joaquim Ferreira dos Santos no texto-legenda de fotos que mostram Chico Buarque no Colégio Santa Cruz em Roma (uma escola americana).
Uma foto muito rara mostra Chico e colegas do colégio mineiro em que ele aos 14 entrou para um grupo católico superconservador, os Ultramontanos, foi resgatado rapidamente pelo pai, e mandado para outra escola mais amena. Boa parte das fotos deste “capitulo” do livro veio do Instituto Antonio Carlos Jobim e do Museu da Imagem do Som.
“Quis também que artistas plásticos contemporâneos dessem sua interpretação pessoal de Chico, mas um trabalho de memória. Chico não iria posar para eles. Alguns artistas não aceitaram o convite sem o artista posando. Consegui uma miscelânia de regiões e gerações diferentes, de J.Borges (o pernambucano das xilogravuras e folhetos de cordel), ou Paulo Bruscky, veteranos, com gente muito nova. O único briefing que passei para ele foi: um retrato de Chico”, diz Augusto, que incluiu nesta pinacoteca buarquiana, um Di Cavalcanti (1897/1976). Um retato que Di pintou de Chico em 1972. Como define Augusto Lins Soares, no curto texto de abertura de Revela-te Chico, o livro é “uma chicobiografia buarquiana para guardar e recorda