UOL - O melhor conteúdo
Vinicius 100 anos

A arca de Noé ganha novas cores nos cem anos do poetinha

Canções infantis de Vinicius agradam a crianças e adultos

JOSÉ TELES
Cadastrado por
JOSÉ TELES
Publicado em 13/10/2013 às 6:00
Leitura:

Quando o compositor Paulo Soledade lhe pediu para criar os arranjos de duas canções infantis compostas com Vinicius de Moaraes, o maestro Radamés Gnatali, resmungou: “...Mas vê lá se não são como os do Bandeira, que nem gente grande entende”. Uma das canções, São Francisco, foi lançada, em 1954, por Sílvio Caldas. O mesmo Soledade seria um dos parceiros de Vinicius no projeto infantil Arca de Noé, um clássico, que foi regravado, assim como o original, por grandes nomes da MPB. A nova concepção do musical é de Susana Moraes, filha de Vinicius, Adriana Calcanhotto, Leonardo Netto, e produção de Dé Palmeira (ex-baixista do Barão Vermelho). 

No livro História de canções - Vinicius de Moraes, os autores, Wagner Homem e Bruno de La Rosa, lembram que o poeta não tinha muita paciência para crianças: “...nem mesmo com os filhos, dos quasi só se aproximava quando já estavam maiores. Certa vez, com Georgiana ainda pequena, Lila (mãe de Georgiana e Luciana), percebeu a inquietação de Vinicius, quandava daqui pra lá o tempo todo, querendo sair. Porém chovia e a inquieação aumentava. Lila então sugeriu: ‘Vinicius vê se faz um samba, você gosta tanto, quero ver se sai alguam coisa’. E saiu Quando tu passas por mim” (parceria cedida a Antônio Maria, retribuindo o que o pernambucano havia feito com Quando a noite me entende). Pois o poeta que que se inquietava com as garrulices de crianças, criou uma série de obras primas para o repertório da música infantil brasileira e italiana. A primeira delas, ainda em 1950, um poema para a cadela Gold, uma cocker spaniel dos filhos Pedro e Susana. A cachorrinha, seria musicado por Paulo Soledade, e anos mais tarde, por Tom Jobim.

Sua obra prima para o cancioneiro infantil, A arca de Noé, que está sendo relançado (pela Sony Music) inteiramente regravado tem como marco zero, a já clássica A casa (Era uma casa muito engraçada/nã otinha teto, não tinha nada...”). Recorrendo novamente ao citado História de canções: “Tudo começou duranteo péríodo em que Vinicius de Moraes trablhou na embaixa em Montevidéu e tornou-se amigo do artista uruguaio Carlos Páez Vilaró que, EM 1958, havia começado uma construção pouco convencional... o espaço conhecido como Casapueble, tornou-se um hotel com mais de 70 quartos, que levam os nomes de seus hóspedes mais ilustres. Além de Vinicius há uam série de outros homenageados como os atores Alain Delon e Robert de Niro, a atriz Brigitte Bardot e o atleta do século XX, Pelé”. Quando morava no Uruguai, Vinicius improvisava para as filhas o embrião de A casa: “Mas era feita com pororó/era a casa do Vilaró”.

O cantor e compositor italiano Sergio Endrigo gravou La casa com sucesso. Vinicius aproveitou as canções infantis já compostas com Paulo . Produzido por Sérgio Bartottti, também autor das versões para o italiano, e arranjos de Luiz Enrique Bacalov, foi lanado na Itália o disco L’arca - canzoni per banbini di Vinicius de Moraes, com as novas La papera (O pato), Piccinina (Menininha), Le api (As abelhas). AS canções foram gravadas por intérpretes diferentes. Estranhamente, A casa não estaria na versão brasileira original da Arca de Noé. Também ficou de fora uma das faixas de maior sucesso do L’arca: Il pappagallo. 

A arca de Noé seria o primeiro sucesso póstumo de Vinicius de Moraes, que morreria (no dia 9 de julho de 1980), antes do lançamento do álbum. O sucesso do primeiro volume levou a Ariola a lançar um segundo no ano seguinte. Os Trapalhões na Arca de Noé tem apenas inspiração no Arca de Noé de Vinicius. Não tem nenhuma faixa assinada por ele.

VERSÃO RECÉM-LANÇADA

“A regravação de parte das canções dos dois volumes do Arca de Noé surgiu de uma necessidade, expressada por Susana de Moraes, filha do poeta, de renovar o catalogo do pai, mesmo que ambos os discos estejam em catálogo até hoje”, quem diz isto é Dé Palmeira, ex-baixista dã formação original do Barão Vermelho, cuja experiência com discos infantis, vem da produção dos Partipim, de Adriana Calcanhotto, também envolvida no remake de Arca de Noé”. Palmeira comenta que muitas crianças não se identificam com parte dos artistas que participaram do disco trinta anos atrás: “Mas também não foi desejo da gente fazer uma coisa mastigada, fizemos de uam forma que vai demorar mais para digerir”.

Com isto ele quer dizer que os arranjos estão mais variados, a sonoridade é mais de cada artista, do que um conceito geral do álbum. Gal Costa gravou As borboletas com um arranjo e timbres que não estariam deslocados no repertório de Recantos, seu último álbum de estúdio, considerado um disco dificil. A abertura do novo Arca de Noé está mais “overture”, com cordas arranjadas pelo maestro americano Miguel Atwood-Ferguson para, em seguida, declamações de Maria Bethânia e Seu Jorge: “Com Arnaldo Antunes, por exemplo, sugeri fazer uma coisa mais radical para O peru, que é um bicho de figura meio estranha. Ele teve a ideia de um glu, glu, grave. Gal gravou com a banda que está com ela na turnê Recanto”, continua Dé Palmeira.

O leão com Caetano Veloso é um primor, de interpretação, e de arranjo. Um pagode baiano para agradar a qualquer faixa etária, assim como O pato, com Zeca Pagodinho, que virou um pagode irresistível. Pagodinho canta como o faria com um outro bom samba, sem apelar sem caricaturas. Enquanto Chico Buarque torna de O peguim um delicioso maxixe: “A letra de Vinicius tem subtextos, que as pessoas entendem do seu jeito. A criança vai crescendo e continua gostando. O genial destas músicas é isto, não é limitado às crianças”, comenta Dé Palmeira. Ele acha dificil que haja um show pela incompatibilidade de agendas dos intepretes: “Tanto é que foi complicado até mesmo a gravação, que levou seis só para agendar todo mundo. Talvez dê um especial de Tv, há conversas em torno disto, mas não tem nada certo”.

DISCO

O novo Arca e Noé mescla faixas dos dois álbuns originais, enfatizando as canções sobre animais. À exceções são São Francisco, e A casa, esta última por Vinicius de Moraes. O que passa meio despecebido é que este disco é de uma época em que não existia o politicamente correto que, hoje, obriga até a amaciar o Atirei o pau no gato. os animais quase todos das canções terminam nas panelas. Adriana Calcanhotto sugeriu que se poupasse o porquinho, talvez porque ele é esfacelado em partes: “Do rabo ao focinho/sou todo toicinho/ bota malagueta/ em minha costeleta/ numa gordurinha/ que coisa maluca/ minha pururuca/ é uma beleza/ minha calabresa/ no azeite fritinha”. Sem esquecer regimes e vigilância ao colesterol.

A casa, que está no disco com Vinicius de Moraes, nuam gravação encontrada na Internet, e restaurada, poderia ter sido cantada por João Gilberto, que pretendia cantar outra, e acabou sem entrar no disco. A primeira gravada por A galinha d’Angola, com Ivete Sangalo e O Buraka Sound System, grpo de kuduro de Angola: “O pessoal do Buraka não fez o kuduro tradicional de Angola, mas a variação do ritmo com ose faz hoej em Salvador”, ressalta Dé Palmeira. Outro integrante da ala popular é a dupla Chitãozinho & Xororó, numa ótima interpretação caipira, terçando vozes na moda A corujinha. Adriana Calcanhotto canta O elefantinho, a únic ainédita no projeto (embora já tivesse sido gravad por ela mesma). A mais antigas das canções, a A cachorrinha ganhou intepretação de luiza Jobim, filha de Tom.

Repertório

1. A arca de Noé - Maria Bethânia, Seu Jorge e Péricles 

2. O leão - Caetano Veloso e Moreno Veloso

3. O pato - Zeca Pagodinho 

4. O peru - Arnaldo Antunes 

5. O gato - Mart’nália

6. O pintinho - Erasmo Carlos 

7. A corujinha - Chitãozinho & Xororó 

8. As borboletas - Gal Costa 

9. A formiga - Mariana de Moraes 

10. A galinha d’Angola - Ivete Sangalo e Buraka Som Sistema 

11. O pinguim - Chico Buarque 

12. A cachorrinha - Maria Luiza Jobim 

13. O elefantinho - Adriana Partimpim (inédita)

14. As abelhas - Marisa Monte 

15. A Foca - Orquestra Imperial 

16. São Francisco - Miúcha e Paulo Jobim 

17. A casa - Vinicius de Moraes 

Últimas notícias