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Discos mostram como era o Ave Sangria ao vivo e no estúdio

Álbuns da lendária banda pernambucana saem em CD e vinil

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 08/09/2014 às 6:00
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Os Novos Baianos e o Ave Sangria foram os dois grupos mais originais do rock brasileiro dos anos 70. Ambos deram ao gênero um cara brasileira, no caso dos baianos, liquidificando com samba e choro. Enquanto os pernambucanos com o baião e métrica de cantoria de viola. Os Novos Baianos, depois de um mal acabado álbum de estreia em 1969, receberam o reconhecimento, em 1972, com o clássico Acabou chorare. O Ave Sangria pode ser reconhecido postumamente, com o atraso de 40 anos, com o relançamento do seu único álbum de estúdio, que tem o nome da banda por título, e do álbum duplo Perfumes y baratchos, registro do primeiro dos dois shows apresentados no Teatro de Santa Isabel, em 1974, depois dos quais o grupo debandou.
Os dois álbuns, saídos em LP e CD, têem selo Riphlandya, foram viabilizado pelo Funcultura, já que nem a a extinta Continental, pela qual o disco de estúdio foi originalmente lançado, nem a Warner, detentora do catálogo daquela gravadora mostraram interesse em mandar o álbum de volta às lojas (o primeiro album, foi teve um relançamento, em LP, 20 anos atrás, pelo selo Phonodisc).
A Continental, tradicional empresa, da família Byington, no mercado de discos desde o início do século 20, depois de faturar milhões com o fenômeno Secos & Molhados em 1973, abriu as portas para o rock nacional. Deu plenos poderes a um jovem de 23 anos, Carlos Alberto Sion, que no ano anterior tinha conseguido trazer um superstar do rock mundial para o Brasil, Alice Cooper, no auge da carreira. “A Continental, segundo Carlos Alberto, encarregado do setor jovem, encaminha-se para a faixa rock, seus novos contratados, A Bolha, O Terço, Paulo Bagunça e a Tropa Maldita, situam-se em áreas diversas, mas até certo ponto compatível de rock”, trecho de uma matéria no jornal alternativo Opinião sobre o surgimento de um rock brasileiro, mais adulto e sofisticado do o juvenil iê-iê-iê dos anos 60.
Sion empreenderia mais contratações, como os Almôndegas (RS), em que tocavam os irmãos Kleiton e Kledir, o Moto Perpetuo (cujo vocalista era Guilherme Arantes), Os Novos Baianos (antes da Som Livre), e o Ave Sangria. Se ele era idealista, os executivos da Continental visavam lucro rápido e fácil, como lhes deu o Secos & Molhados, cujo imenso sucesso do álbum de estreia, não foi correspondido no segundo LP. O grupo pernambucano que, curiosamente, foi indicado à gravadora por um integrante do Trio Irakitan, grupo vocal de boleros, podia competir no mercado da música regional sofisticada, um mercado aberto pelo Quinteto Violado, o que explica como o Ave Sangria soa tão bem comportado no álbum que gravou em maio de 1974, no estúdio Hawai, na Avenida Brasil, Zona Norte carioca.
Jovens de classe média baixa recifense, os integrantes da Ave Sangria, não tinham equipamento de qualidade, e receberam tratamento espartano, nos poucos dias que lhes foram dados para gravar o disco, produzido por Márcio Antonucci (falecido em janeiro deste ano), que formou com o irmão Ronaldo, a mais bem sucedida dupla da jovem Guarda, Os Vips. Ao contrário do que se disse dele, em 1974, Antonucci já era um produtor tarimbado, responsável por trilhas da TV Globo, discos de astros da jovem guarda, e de Os Novos Baianos (Novos Baianos F.C) e Luiz Melodia (o clássico Juventude transviada) Numa entrevista, publicada no blog Toques, (https://jconlineblogs.ne10.uol.com.br/toques/ , ele negou que a gravadora tenha sugerido que aparasse as arestas do som do Ave Sangria: “Não, não houve nada disso. O que houve é que o estúdio em que a gente gravou era muito ruim para rock and roll, e ai o som ficou meio amaciado”.
Perfumes y baratchos, mostra como era a banda ao vivo, meio hard rock, meio rock progressivo, com sutis doses de regionalismos, bem diferente do que se ouve no disco de estúdio, em que a voz de Marco Polo se destaca dos demais instrumentos, com exceção da guitarra de Ivinho (na entrevista Marcio Antonucci cita os dois como os integrantes que lhe chamaram atenção na banda). Um detalhe que marca o álbum, e que certamente tem a mão do produtor.
A reedição de Ave Sangria, o disco, tem a sofisticação que o grupo não recebeu na quatro décadas atrás. Como aliás, nenhum outro contemporâneo. O rock nacional ainda era um objeto não identificado, nem decodificado pelas gravadoras. Nem mesmo os Mutantes fizeram o sucesso que se imagina que tenha tido. Em seu tempo, a banda foi mais comentada do que ouvida, sobretudo pela ligação com os tropicalistas. O álbum em vinil, de 180 gramas, da Ripohlandya, tem capa dupla, com letras e encarte, com fotos raras, ao contrário da edição original, que teve até o desenho da capa, encomendado pelo grupo a Lailson, deturpado. Só não tem faixa bônus, já que a semana que a banda passou gravando no Rio só permitiu que fossem registradas onze canções, e um instrumental de Ivinho (Sob o sol de satã, remake fusion psicodélico do Hino Nacional).
(leia mais na edição de hoje do Jornal do Commercio)

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