Maestro Spok/Entrevista

Maestro Spok: "O frevo entrou em Nova Iorque pela porta da frente"

O músico faz um balanço da segunda turnê da SFO nos EUA

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 04/11/2014 às 6:00
Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
O músico faz um balanço da segunda turnê da SFO nos EUA - FOTO: Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem
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"Eu quero é o frevo em Nova Iorque”, preconizou o compositor Carlos Fernando, numa entrevista concedida ao Caderno C, em 1982. O frevo tocou em Nova Iorque 30 anos depois, timidamente, é certo, na primeira turnê americana da Spokfrevo Orquestra, que, em 2012, passou por mais cinco cidades dos EUA. Domingo, a SFO encerrou em St Louis, Missouri, a segunda turnê pelos Estados Unidos,com quatro concertos, numa das salas mais requintadas do país, ano Lincoln Center, e se apresentou em outros quatro estados, num total de dez shows, e ainda confirmou participação no Rock in Rio USA, em maio de 2015. 

No ônibus, que levava a orquestra de Iowa ao Missouri, para o final da Turnê USA 2014, o maestro Spok, via Gmail, concedeu entrevista sobre a turnê, a importância de entrar  no mercado americano com uma música que até no Brasil ainda é pouco conhecida, os próximos planos da orquestra, terminando a conversa, com versos improvisados em decassílabos, mostrando sua veia para a cantoria de viola, uma de suas paixões.

JORNAL DO COMMERCIO - Spok, qual o balanço que você faria desta segunda turnê americana?

 SPOK - O resultado está sendo excelente, combinando palcos consolidados como a Berklee School of Music em Boston e o Jazz at Lincoln Center em Nova Iorque, com locais menores como Iowa City. Independente do lugar, a reação das pessoas tem sido sempre excelente.

 JC - A turnê de 2012, foi mais ou menos o começo desbravamento de um mercado fechado. Nao apenas fechado, mas bastante seletivo. Como vocë compararia as duas turnês?

 Spok - Eu diria que a primeira turnê foi um ensaio pra uma jornada que está ainda começando. Nessa segunda, tivemos oportunidade de tocar em palcos extremamente importantes, como os mencionados anteriormente. Acho que demos uma passo a frente de um caminho ainda longo a ser percorrido.

JC - A orquestra já esteve até na China, Índia, participou de eventos importante, e de grandes festivais na Europa. Mas lembro você comentando que seria realizar o grande sonho ter acesso ao mercado da música nos Estados Unidos.

 Spok - Sem dúvida, tocar nos EUA sempre foi um sonho meu e de todos da orquestra. Aqui é o berço do jazz, das escolas que sempre estudamos e admiramos, então, tocar para uma plateia acostumada a ver apresentações instrumentais e causar o impacto que acreditamos estar causando é maravilhoso. Carlos Fernando dizia que o frevo deveria chegar a Nova Iorque. Eu entendo o que ele quis dizer. Acho que desta vez, acho que o frevo foi pra Nova Iorque pela porta da frente.

 JC - Wynton Marsalis, foi quem abriu as portas para a SFO nos EUA. Não lhe pareceu que a primeira turnê foi como se ele pretendesse que a orquestra fizesse uma espécie de estágio, tocando em lugares menos badalados?

 Spok - Não sei se isso foi uma intenção de Marsalis, mas é fato que, para a montagem da segunda turnê, recebemos uma carta de recomendação dele e do Jazz at Lincoln Center, o que nos abriu muitas portas para o fechamento das datas que estamos fazendo. O respaldo de uma instituição como a dele foi fundamental, porque, como você mesmo disse, o mercado americano é muito fechado e seletivo. Desta vez, tocamos numa das salas principais do Jazz at Lincoln Center e pudemos ensaiar lado a lado com a Orquestra da casa e de Marsalis. Inclusive, estávamos ensaiando na sala ao lado da deles e fomos convidados para assistir ao ensaio, assim como eles iam nos assistir no intervalo. Tudo isso é muito bacana. O mesmo aconteceu nos dias do show - estávamos tocando simultaneamente em salas no JALC e sempre nos cruzávamos, e tivemos oportunidade de conversar. Os músicos da orquestra do Lincoln Center e Wynton Marsalis chegaram a tocar para nós no backstage. E estamos felizes em poder recebê-los no Recife, o que vai acontecer em abril de 2015, fechando o ciclo. 

JC - Então os quatro shows no Lincoln Center foi como se a SFO marcasse seu lugar no circuito musical americano?

Spok - Eu não diria que tanto assim, mas com certeza abriram-se várias janelas. Tivemos uma excelente repercussão na mídia, com crítica positiva de mais de meia página no New York Times, fomos vistos por músicos como George Coleman e Will Calhoum, isso tudo é uma prova que estamos conquistando nosso espaço e despertando curiosidade sim no circuito americano, mas não diria que já temos um lugar marcado, seria muita pretensão de nossa parte achar que sim.

 JC - Mas vocês já começaram tocando para uma plateia seleta, de músicos e estudantes da Berkelee, foi uma estreia emblemática. Como a plateia de especialistas reagiu diante do frevo da SFO?

 Spok - É muito curioso ver a reação inicial das plateias americanas, até as mais especializadas, ao nosso show. Nossa formação é de uma big band, então eu acho que eles esperam ouvir um tipo de música que não é a que nós tocamos. Quando começamos as apresentações, com dois frevos fortes (Spokiando eMoraes é Frevo), a impressão que eu tenho é que as pessoas ficam surpresas. Tipo, “meu Deus, isso é uma big band, mas que música é essa? De onde veio?” À medida que o show progride, notamos que as pessoas vão interagindo mais com a música, ao mesmo tempo que a orquestra vai ficando mais à vontade. Especificamente sobre a apresentação na Berklee, foi muito emocionante para nós, que sempre sonhamos em tocar e estudar em uma instituição como aquela. Após a apresentação, fomos abordados por diversos professores que vieram perguntar sobre o frevo.

Maravilhoso a sensação ouvir de todas das pessoas que assistem às apresentações e nos abordam depois do show dizendo que estão com vontade de ir ao Recife conhecer o frevo. Esse despertar da curiosidade é muito bacana e importante.

JC - A orquestra costuma receber convidados nos shows no exterior, mas como foi receber um gigante do jazz, como o trombonista Wycliffe Gordon? Ele apreendeu o frevo de cara, ou precisou de algumas aulas pra entender o espírito da coisa?

 Spok - Antes de qualquer coisa, assim que soubemos que iríamos tê-lo como convidado no nosso show, foi uma felicidade geral, todos sempre fomos fãs dele. Músicos como Wycliffe Gordon não precisam de muita coisa pra pegar o espírito de qualquer tipo de música. É um caso de um talento diferenciado, de um cara que não precisa de muitas “aulas” pra aprender nenhum tipo de música. Agora, a colaboração entre ele e a orquestra foi maravilhosa. Um músico com a estrada e o talento que ele tem, nos leva a descobrir novos horizontes da liberdade musical, de que não é preciso necessariamente ser metódico para se enquadrar num gênero específico, mesmo no frevo. Ele é o tipo de músico que preza pela liberdade, no momento que ele entendeu a linguagem, ele vai embora sozinho. E um músico do naipe dele não precisa de muitos ensaios pra chegar nesse ponto. No show foi assim: ele nos levava e a gente levava ele. Incrível.

(Leia entrevista na íntegra na edição impressa do Jornal do Commercio )

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