Disco

Johnny Hooker conceitual e ainda correndo por fora da raia

No disco ele é cantor e ator dramatizando e carnavaizando paixões

JOSÉ TELES
Cadastrado por
JOSÉ TELES
Publicado em 23/02/2015 às 13:31
Leitura:

No título do disco a passionalidade já se explicita: Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito. O disco é de Johnny Hooker, cantor, compositor e ator recifense, que nunca escondeu ser pretensioso e corre por fora da raia da música que se faz na cidade, sem se ligar a grupos da cena. Sua cena é ele mesmo: "Prefiro ser independente de galeras, que sempre acabam em panelinhas. A turma de São Paulo, a turma do Rio, a turma tal do Recife só gostam do som delas, todos ouvem os mesmo tipo de música. Eu faço música popular, com refrão e quero que seja curtida por todas as classes. Isto também se deve ao fato de que os músicos recifenses são meio machistas. Quando estava no meio deles sempre rolava certo estranhamento com a minha figura, com as minhas performances".

A entrevista foi concedida por telefone, do Rio de Janeiro, onde Johnny Hooker mora desde que participou da novela global Geração Brasil, na qual emplacou uma canção na trilha sonora, Alma sebosa, cujos versos iniciais da letra deram título ao disco, lançado ontem na loja digital iTunes. Durante a semana aporta em outras plataformas, como o Spotfy ou Amazon. O CD físico somente aterrissa nas lojas em abril. Com exceção de três faixas (feitas com Pedro Pena, em São Paulo), as demais foram gravadas ao vivo no Estúdio Fábrica, no Recife, por Cristiano Lemgruber. "Banquei o disco com os direitos que ganhei com a música que entrou na novela", conta Hooker, que terá mais uma canção, Amor marginal, na próxima novela das nove: "Ela não estava no repertório inicial do disco. Acrescentei por causa desta coisa da novela", diz sem nenhum prurido de purismo sobre a concessão, como não teve em incluir expressões ditas chulas na letra de Macumba, que tocou na novela das sete, nem nos figurinos com que se apresenta.

John Donovan desde adolescente já não temia se expor. Em 2004, fez uma performance, cantando em inglês, como um dos concorrentes do festival Microfonia, promovido pela Aeso. Estava com 16 anos. Quatro anos mais tarde, na terceira participação no citado festival, levou o primeiro lugar com a banda Candeias Rock City. Sua carreira foi num crescendo desde então, como músico e ator. A participação no elogiado Tatuagem, filme do diretor pernambucano Hilton Lacerda, cantando a música Volta, acabou também lhe rendendo o convite para a novela da TV Globo, "Eles tinham um núcleo no Recife e queriam atores locais. DJ Dolores, que estava trabalhando na música da novela, mostrou ao pessoal um clipe de Volta, e eles me chamaram para um teste".

TREVAS E LUZ

Eu vou fazer uma macumba pra amarrar, maldito é um disco conceitual, cujo leit motiv é o amor, a paixão, idas e vindas, vãos e desvãos, canções de uma passionalidade de tango argentino. "É uma história com começo e fim. O personagem vai do fundo do poço à superfície, das trevas à luz, em duas partes. A primeira é a exposição da dor, a segunda a expurgação da dor, com uma música que é o interlúdio", explica Johnny Hooker. O cantor ressalta que o disco é também é seu reencontro com a música brasileira. "Minha geração cresceu com a MTV, que era bem americanizada, minhas primeiras músicas tinham letras em inglês. O disco é também resultado disto, de um revival que acontece com a MPB, a internet ajudou a trazer de volta esta música para o lugar que ela merece. O pessoal passou a curtir Jards Macalé, Sérgio Sampaio, a redescoberta do Ave Sangria. No Recife, acho que isso começou com o manguebeat, que fez a gente se olhar no espelho", comenta o cantor.

As 11 canções do álbum (uma delas, Macumba, repetida numa versão em espanhol) são amarradas num conceito, mas curiosamente não foram compostas para este trabalho, nem com o intuito de serem capítulos de uma mesma história: "A pedra fundamental do disco foi Volta, que é antiga. Quando Hilton Lacerda me convidou para o filme, vi que tinha muitas música de dor de cotovelo. Peguei essas, juntei com mais recentes, como Você ainda pensa e Boato. Tenho um queda por discos assim, como Back to black, de Amy Winehouse, ou In the wee small hours, de Frank Sinatra", conta Johnny Hooker. Diferente do LP de Sinatra, de 60 anos atrás, que é considerado primeiro disco conceitual, com canções que refletem desamor, solidão, fossa, boêmia, o de Johnny Hooker, na segunda parte carnavaliza a dor, com ska, axé, rock e frevo.

As canções nas duas partes são na primeira pessoa, dirigidas a alguém. Vão do choro convulso ao grito lancinante, depois vão do desabafo ao regozijo: "As músicas não foram feitas para uma pessoa especificamente, mas para várias. Aliás, quando a gente começa a fazer não se sabe bem onde começa, o que é inventado e o autobiográfico. Em uma das músicas, Boato, é uma garota lésbica que está na primeira pessoa. Boyzinho, a do interlúdio, é como se um orixá do desejo, que está observando toda aquela dor, interferisse e mudasse o rumo da história", explica Johnny Hooker. A turnê de lançamento do disco começa agora em março, pelo Nordeste, com shows no Recife, em João Pessoa e em Fortaleza. "Este ano vou ter como me dedicar mais à música. No ano passado, a participação na novela exigiu muito de mim, tive pouco tempo para shows, e o personagem que fazia dificultou que eu fixasse minha imagem junto ao publico, usava até cabelo com dreads", comenta Hooker, que faz o estilo glitter e glam, mas tropicalizado, como Edy Star, com David Bowie sendo uma de suas maiores referências dos anos 1970.

(leia matéria na íntegra na edição impressa de hoje do Jornal do Commercio) 

Últimas notícias