Demorou, mas finalmente aconteceu. Os tradicionais filmes sociais europeus carregados de realismo e culpa que sempre aparecem no Festival de Cannes fizeram sua estreia no evento nesta segunda-feira (18), abrindo a segunda semana de competição.
E, talvez prevendo esse subgênero e pelo fat de o filme estar em cartaz na França, os jornalistas e convidados evitaram ir de manhã cedo assistir ao francês La Loi du marché (A Lei do mercado), de Stéphane Brizé, premiando o drama com a primeira sessão esvaziada da programação oficial.
Deve ter sido uma troca vantajosa, por exemplo, se escolheram prestigiar a segunda parte de As mil e uma noites, do português Miguel Gomes, exibido na Quinzena dos Diretores, no mesmo horário.
"La Loi du marché é basicamente um filme de um personagem apenas, um senhor de meia idade (Vincent Lindon, ótimo) tentando se reajustar ao novo mercado de trabalho depois de ser demitido.
Durante 93 minutos de close-ups, acompanhamos a vida de Thierry cuidando do filho com problemas mentais, tendo aulas de dança de salão, passando por sabatinas humilhantes, pedindo empréstimos e, por fim, a vida no novo emprego como segurança de loja.
Brizé faz o típico longa para fazer o europeu elitista se sentir culpado, mas revela uma realidade que deixaria o brasileiro de baixa renda feliz: o banco empresta 2.000 euros (poderia ser mais, mas ele recusa), Thierry tem uma casinha na praia que precisa vender -um apartamento próprio-, cursos grátis de reciclagem e seu filho está prestes a ir à universidade.
No fim, troca a análise do personagem pela velha lição de moral -e isso é o que diferencia dos mestres do gênero, os belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne- é jogada sem sutileza na cara do espectador.
Talvez emocione quem viva em uma realidade distante da realidade, mas La Loi du marché não deve cair nas graças em territórios com problemas bem mais sérios. E, ironicamente, essa é a lei de mercado.