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Mendonça Filho enfrenta resistência da classe artística

Extinção do Ministério da Cultura causa revolta na classe artística e é desafio para Mendonça Filho

JC Online
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Publicado em 14/05/2016 às 5:36
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Extinção do Ministério da Cultura causa revolta na classe artística e é desafio para Mendonça Filho - FOTO: DIVULGAÇÃO
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A nomeação do deputado federal Mendonça Filho para o Ministério da Educação e Cultura (MEC) pelo presidente em exercício Michel Temer dividiu a opinião de produtores pernambucanos. Reconhecido como gestor e pela sua habilidade para o diálogo, por alguns, é críticado por outros por ter participado da tropa de choque que afastou a presidente da República Dilma Rousseff.

Além de ter que contornar a resistência de caráter político, Mendonça Filho tem um enorme desafio pela frente: a revolta da classe artística, insatisfeita com a extinção do Ministério da Cultura, que foi fundido com o poderoso Ministério da Educação.

O ministro da Educação e Cultura foi vaiado na tarde de sexta-feira, ao se apresentar aos servidores da Cultura. Mendonça Filho procurou acalmar os servidores garantindo que vai preservar os órgãos vinculados aos MinC, a Lei Rouanet e programas do antigo MinC.

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Veja abaixo a repercussão da nomeação da classe artística pernambucana e o que espera de Mendonça Filho à frente do MEC.

 

Marcelo Melo, do Quinteto Violado

 Eu espero que o novo ministro tenha sensatez e garra. Ele sempre foi alguém muito guerreiro, buscou na política os objetivos que tem e estava lutando muito para essa mudança acontecer. Espero que ele tenha sensibilidade para ter um projeto bom nessa junção de educação e cultura. O Quinteto Violado tem trabalhos com cultura e educação a partir da valorização da música brasileira, com uma contribuição feita ao long ode 45 anos de trajetória. Mendonça Filho é uma pessoa sensível a coisas como essa. Estou feliz que ela esteja com essa responsabilidade no governo. O desafio será o equilíbrio. No momento em que ele tem dois ministérios associados, com um gigantesco como o da educação, ele lida não só uma uma quantidade imensa de pessoas da educação, mas tem que ter a sensibilidade necessária para valorizar também a cultura. Os governos separavam as pastas para dar autonomia para as áreas e, quando há a fusão, é preciso saber equilibrar, até porque a cultura tem um orçamento menor. Não tenho nenhuma preocupação com a fusão dos ministérios, acredito que o caminho é fazer com que marchem juntos. O que eu pediria a ele é que tivesse uma visão da cultura como um processo que anda de mãos dadas com a educação. É muito necessário que a formação das pessoas seja complementada com a associação à cultura da identidade. E parabenizo e desejo a ele boa sorte no ministério.

 

Helder Aragão de Melo (DJ Dolores), músico

 Estou tentando responder as questões, mas a minha premissa de que estamos num equívoco enorme não me permite ir em frente: é tudo tão absolutamente desanimador que, nesse exato momento, não consigo ter nenhuma expectativa positiva. Daí, as perguntas me trazem um enorme vazio pois não acredito que teremos um diálogo entre o povo e o Estado como se construía lentamente até pouco tempo atrás. Sinceramente, espero estar profundamente errado na minha avaliação mas é isso que tenho agora.

 

Paulo André Pires, produtor

Espero do ministro entendimento de tempo/espaço em que vivemos, especialmente o futuro próximo com as Olimpíadas, que podem servir de vitrine mundial pra nossa cultura, eu acredito muito no turismo cultural, o turismo de experiências é o futuro do turismo, isso nos sobra, mas não há estratégia. Espero que a fusão sirva pra implantar a lei da música nas escolas, que chegue principalmente nas escolas públicas. Espero que dê continuidade a programas estratégicos, como os pontos de cultura, editais e uma reformulação da Rouanet.

O desafio principal é a resistência da classe cultural à extinção do MinC. A salvação do Brasil está na educação, lá na base. Não educação sem cultura, ainda mais em um país com a grandeza e riqueza cultural do Brasil. A cultura não deve ser prioridade numa fusão, a educação demanda muito mais verba e atenção, mas não deveria ser assim, é lamentável que tenham decidido assim.

Eu não me preocuparia se fosse por um projeto muito maior, que envolvesse a juventude, a formção cultural, o acesso a cultura, mas principalmente levar cultura as escolas. Nós temos a produção, o conteúdo, faltam as estratégias. As rádios públicas estão mofadas, atrasadas no tempo/espaço, infelizmente não contamos com elas pra formar público, então a música que compra espaços reina no país e a nossa identidade, nossa cultura, fica pra trás, pois não conseguimos mostrá-la ao povo, que se "forma" pelas TVs abertas. Espero que essa decisão possa ser revertida em um futuro próximo, pois o caminho não é esse, isso é um retrocesso gigante.

Pediria ao ministro que revisse essa decisão, que ajudasse a dar a dimensão cultural que o Brasil tem e merece projetar, com a fundamental existência de um ministério. Depois de tanto investimento na Copa e Olimpíadas, precisamos nos projetar mundialmente com o que temos de melhor, além de praias e clima tropical, nossa cultura. Pediria que dialogasse com os movimentos culturais, as associações, mas principalmente que com quem faz e produz cultura nesse país. O diálogo e entendimento dos gargalos é fundamental pro ministro.

 

Mozart Neves Ramos, ex-secretário de Educação e Cultura do Governo Mendonça Filho

 A minha experiência com Mendonça nos 4 anos de governo Jarbas/Mendonça é que o atual ministro é um homem muito trabalhador, de grande energia e muito focado. Apesar de relativamente jovem, tem muita experiência na gestão pública. Acho que ele terá grandes desafios pela frente, afinal são duas pastas com agendas muito pesadas que, agora, vão estar sob a mesma gestão. Do ponto de vista operacional é muito complexo porque são agendas que muitas vezes têm demandas diferentes. No âmbito estadual é uma fusão que até funciona com mais facilidade, mas se tratando de um ministério é mais complicado. Essa, no entanto, não foi uma escolha de Mendonça, mas do núcleo duro do (presidente interino) Temer. Será um desafio para Mendonça, que exigirá esforço redobrado, mas se ele conseguir um bom time, o desafio fica menor. Confio na capacidade de trabalho dele. Mendonça ouve muito as pessoas e também é muito pragmático. É um ótimo gestor.


Sidney Rocha, escritor

 O que se esperar de um governo montado sobre injustiças e que não respeita o voto nem a Constituição? Que não considera a Cultura como algo estratégico? Voltamos ao século passado. Escritores, atores, músicos, cineastas, todos perderam espaço importante, com essa visão reboquista da cultura. Mas é um padrão dos governos golpistas calar a cultura e o povo. Enquanto as nações mais desenvolvidas admitem a cultura no centro do desenvolvimento, o Brasil agora dá muitos passos para trás, somente porque uma laia de pilantras tem medo quando o Brasil caminha para frente. Perdem-se valiosos avanços na secretaria das mulheres, da igualdade social, nas políticas dedicadas às populações indígenas, veremos um grande retrocesso no reconhecimento das diferenças, temas onde o MinC ajudou a avançar nesses anos. Ou seja, é um desmanche de um projeto político sólido para colocar nada no lugar. Adeus às políticas de leitura, aos incentivos ao livro (o MEC tem prioridades bem distintas das do MinC pra falar só nesse tema). O que espero? Há quinze dias ocupei uma escola com estudantes e pedi desculpas a eles porque minha geração, de algum modo, fracassou na luta. Mas não cobrarei menos deles, agora, e de nós todos, na recuperação do que deu tanto trabalho construir. 

 

Maria Paula Costa Rêgo, bailarina e coreógrafa 

 Espero que ele dê continuidade a uma política cultural que foi implantada nos últimos treze anos e foi importantíssima. Na gestão de Gilberto Gil (durante o primeiro governo Lula), houve a valorização da diversidade da cultura brasileira e o reconhecimento da importância da regionalidade. Espero que o governo interino entenda que essa valorização não pode diminuir. Acredito que a fusão dos ministérios não é benéfica porque Educação e Cultura precisam de equipes distintas. Qualquer política pública tem que ser um avanço e não um retrocesso, porque, apesar dos muitos desafios, tivemos conquistas importantes. Espero que ele honre os compromissos da outra gestão, pague e mantenha os editais, fortaleça as câmaras setoriais, o Plano Nacional de Cultura etc e ouça a classe artística e não pare o processo de evolução cultural e artística porque é um setor essencial para a economia e para a vida cotidiana do povo. 

 

Romildo Moreira, gestor público

 Trabalhei com Mendonça durante sua gestão como governador, entre 2006 e 2007 e me surpreendi com o nível intelectual dele, além da disponibilidade que ele mostrou em prol da cultura. O Circuito Pernambucano de Artes Cênicas, iniciado com Jarbas, foi fortalecido por ele que, como gestor, tem uma capacidade grande de ouvir as pessoas e procurar entender aquilo que ele não conhecia bem. Acho que ele pode fazer uma gestão extraordinária no ministério, mantendo os programas que precisam ser mantidos e também melhorar o que estava quase parado na gestão anterior. Mas, como se trata de uma gestão de transição, acredito que não haverá grandes inovações. Entre os desafios dele está mostrar a que veio para a classe, que o olha com uma certa desconfiança, além de estabelecer a importância da cultura no governo interino. Porque, como sabemos, a cultura é a primeira a sofrer quando há crises políticas e econômicas. No futuro, espero também que tanto Educação, quanto Cultura voltem a ter seus ministérios.

 

Pedro Vilela, produtor e diretor teatral

 É difícil apontarmos o que esperamos deste novo ministro, porque na verdade nunca tivemos interesse por este novo governo. Para nós, ele é ilegítimo e não foi colocado no poder pelas urnas. Qual a contribuição que Mendonça deu, por exemplo, no âmbito local? Trabalho no ramo da cultura há 16 anos e nunca vi nenhum interesse do mesmo em ao menos escutar o setor, quanto mais fazer algo por ele. A fusão dos ministérios nos faz regredir 31 anos, época em que a cultura conseguiu finalmente sua autonomia ministerial e foi compreendida por sua força na construção do país. A fusão recoloca a cultura como elemento de segunda ordem, desestabilizando por completo um setor que deve possuir autonomia por todo seu caráter simbólico e de mercado. Existe a opção de voltar atrás e ao invés de toda trama conspiratória, encontrarem soluções concretas para o país? Não, então ao menos que ele possa voltar atrás na medida que extingue o MINC e que reúna pessoas qualificadas (algo que em sua lista de parceiros ainda não foi visto) que possam de fato compreender as demandas do setor. Mas não tem como hoje vislumbrarmos algo com otimismo. O que resta é pedir aos companheiros da classe artística que possamos nos reunir cada vez mais e criemos um front de sobrevivência diante dos tempos tenebrosos que se aproximam.

 

Jarmeson de Lima, radialista e produtor do festival Coquetel Molotov

É tão absurdo e desproposital a fusão dos dois ministérios num momento em que as políticas públicas de cultura estavam avançando que chega a parecer uma retaliação diante das conquistas obtidas na área. Apenas espero que mantenham os programas de fomento, os editais da Funarte, o fundo setorial de cinema e haja respeito a instituições como o Iphan, a Ancine e a Fundaj sem cerceamento artístico ou político.

 

Ana Garcia, produtora do Coquetel Molotov

 O Minc não estava atuando há alguns anos, com a entrada de Juca começamos a ver uma possibilidade de diálogo. E teve. Passamos a ter esperança. Em tempos de crise a cultura é sempre a primeira a ser cortada e isso é devastador. A cultura teria talvez mais link com o turismo que a educação, acredito. Inclusive era algo que estava conversando a respeito com Karina Hoover ontem. Mas é muito revoltante o que uma elite acha que é a Lei Rouanet o problema e não entende que a grana para orquestras, filmes, programas sociais vem disso. O maior medo é que a Rouanet acabe.

 

 

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