Verissimo lança livro de crônicas 'Ironias do Tempo'

O tempo é realmente alguém muito dono de si. Faz o que quer e, em questão de instantes, é capaz de modificar qualquer conjuntura ou contexto. Mas, ele pode também congelar, por anos a fio, certas situações e cenários, como se teimasse em perpetuá-los. Nas mãos de um grande cronista, a percepção disso, facilmente torna-se potência.

Com esse pensamento, a editora Objetiva convidou as escritoras Isabel e Adriana Falcão para a organização da antologia Ironias do Tempo (Objetiva, 206 págs.), com 77 crônicas de Luis Fernando Verissimo que envolve o personagem tão onipresente à obra do autor.

“Encontramos, as duas, a preciosidade que nos rendeu a ideia: ali estava a vida, acontecendo em tempo real, através dos olhos de Verissimo”, escrevem as organizadoras sobre o processo de pesquisa em torno da vasta obra do gaúcho, para que chegassem a tal seleção.

Exímio com relação à sua fluidez textual, Verissimo é dono de uma rara capacidade de incorporar pensamentos e acontecimentos de cada época, com um humor peculiar. Em Ironias do Tempo isso é, mais uma vez, ressaltado.

Seleção

Sobre a escolha dos 77 textos que estão na antologia, o autor confessa ter gostado do trabalho realizada pela parceria entre mãe e filha. “Talvez, eu escolhesse algumas crônicas que não estão no livro e deixaria outras fora, mas acho que a seleção foi boa. É difícil, era muita coisa. Quase 50 anos de produção, incluindo muita bobagem e palpite errado. As meninas tiveram trabalho”, afirma Verissimo em entrevista ao JC.

Tanto para Isabel quanto para Adriana, a proximidade com a obra do cronista gaúcho não é exclusividade deste tempo. Pelos idos dos anos 1930, o pai de Luis Fernando Verissimo, o escritor Erico Verissimo, foi contemporâneo de Augusto de Sousa Júnior, avô e bisavô das organizadoras, quando ambos trabalhavam na revista do Globo. Décadas depois, na infância dos anos 1990, Isabel era leitora e fã de Luis Fernando Verissimo e se correspondia através de cartas com o ídolo. Adriana, por sua vez, assina alguns trabalhos em parceria com o autor e sua filha, Mariana Verissimo, além de ter sido uma das roteiristas da famosa série televisiva A Comédia da Vida Privada, cujos episódios se baseavam nas crônicas de Luis Fernando Verissimo.

Por Ironias do Tempo corresponder à produção de Verissimo entre 1998 e 2018, a seleção ter sido realizada por representantes de duas gerações distintas - e afinadas -, enriqueceu o resultado. Os textos passeiam por diferentes períodos de nossa história e há quase progressão temporal entre eles.

Se antes o livrinho de endereços era comum, em outro período o telefone fixo era unânime e, posteriormente, chegávamos à era do computador e do GPS. No entanto, os textos se mantêm atemporais, dada à sensibilidade do autor.
Atualmente, Verissimo escreve para os jornais O Globo, no Rio, e O Estado de S. Paulo. Entretanto, já são mais de quatro décadas de escrita. Naturalmente, sua produção textual passou por modificações, mas a qualidade da escrita permanece, como se evidencia ao longo de Ironias do Tempo.

“No começo eu escrevia todos os dias. E escrevia muito. Sempre me surpreendo com o tamanho dos meus textos mais antigos. Com o tempo, não sei se fiquei mais conciso ou mais preguiçoso. E hoje faço só duas crônicas por semana”, confessa.
Apesar de não serem estanques, cada gênero linguístico resguarda algumas características. Um bom texto, inclusive de cunho jornalístico, contribui para a compreensão de cada período. “Acho que a função do jornalismo, incluindo a crônica, é, além de informar, colocar os fatos em perspectiva, ou num contexto histórico, que nos ajuda a entendê-los”, comenta o autor, que, através de seus textos, contribui para outros olhares possíveis.

Sobre o que costuma fazer nas horas vagas, Verissimo revela: “Perco muito tempo vendo filmes na TV, mas penso que, em geral, divido bem meu tempo entre o trabalho e o que me dá prazer, como ler e ouvir música. E, quando dá, viajar”.