Sete anos após o lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), as grandes obras, chamadas estruturantes, ainda derrapam no cronograma e no orçamento. Em média, cada projeto tem estendido em 88% o prazo original de conclusão da obra, revela um levantamento feito pela consultoria Inter.B, do especialista Cláudio Frischtak. Um dos principais reflexos de tanto atraso é o aumento dos preços, que varia entre 28% e 64%.
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O trabalho avaliou as 16 maiores obras do setor de logística, energia e saneamento, que hoje somam R$ 83 bilhões de investimentos - R$ 21 bilhões a mais que a previsão inicial. O cardápio de justificativas para o atraso e alta de custos inclui as reclamações recorrentes, como dificuldade para conseguir licenças ambientais, complicações nos acordos de desapropriação, greves e manifestações.
Os números e as causas explicam a proliferação de expressões como “excludente de responsabilidade” e “reequilíbrio econômico financeiro” nos corredores das agências reguladoras, em Brasília. Com o estouro do orçamento e do prazo para início de operação, as empresas tentam escapar das punições decorrentes do descumprimento dos contratos e recompor os ganhos previstos inicialmente.
“O sistema não está funcionando porque há uma quantidade enorme de recursos públicos nos projetos. O financiamento é público, as garantias são públicas. Assim, o risco do setor privado diminui” afirma Frischtak. Na avaliação dele, esse é o resultado de um ambiente de incerteza regulatória e instabilidade macroeconômica. “Nesse cenário, só se consegue tirar alguns projetos do papel compensando algumas questões.”
O professor da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, entende que a origem dos problemas é a ausência de um projeto executivo. “Na Europa e nos Estados Unidos, há mais de 30 anos não se licita uma obra sem antes o governo fazer um projeto executivo.” O resultado de pular essa etapa, diz Resende, é que as surpresas técnicas vão surgindo no meio do caminho, seja na parte de geologia ou no licenciamento ambiental. “Isso criou a cultura do atraso e do aditivo contratual.”
Um exemplo disso, conforme o levantamento da Inter.B, é a Ferrovia Transnordestina, que já tem mais de 45 meses de atraso e R$ 2,1 bilhões de acréscimo no preço (o valor inicial era R$ 5 4 bilhões). Apesar da extensão do prazo, atualmente apenas 41% das obras estão concluídas. Depois de uma paralisia nos últimos anos devido a um acordo com o governo em relação ao aumento do financiamento e de divergências com construtoras, as obras da ferrovia - que vai ligar os portos de Pecém e Suape ao sertão de Pernambuco e Piauí - estão em ritmo mais forte, com 3 mil trabalhadores. A expectativa é concluir o projeto em 2016.
As obras da estatal Valec também sofrem do mesmo mal. A Ferrovia Norte Sul já teve inúmeras revisões no cronograma, paralisações e aumento nos preços. O trecho entre Ouro Verde (GO) e Estrela d’Oeste (SP) tem 61,35% das obras concluídas e deve demorar um ano a mais que o previsto anteriormente. A estatal disse que a primeira remessa das 10 mil toneladas de trilhos compradas em abril começou a chegar semana passada no Porto de Santos, o que deverá garantir a retomada do ritmo das obras.
Endosso. Os prazos dos projetos de transporte têm aumentado, em média, 92%. “De todos os setores, os investimentos de logística têm ficado aquém da meta”, afirma o diretor de linhas especiais da Chubb do Brasil Cia de Seguros, Eduardo Viegas. Ele conta que o volume de endosso das apólices (de seguro garantia, por exemplo) aumentou 30% com as prorrogações nos prazos nos diversos setores da infraestrutura. “Toda vez que há uma mudança nos prazos de um contrato, temos de endossar a apólice.”
No setor de energia elétrica, um dos problemas mais graves tem sido a explosão dos preços. Segundo a Inter.B, os empreendimentos analisados, entre eles Jirau, Belo Monte e Angra 3, tiveram um acréscimo de R$ 14 bilhões nos valores originais, de R$ 49,6 bilhões para R$ 63,7 bilhões. “Dos 101 projetos destacados pelo governo como os mais importantes do PAC1, 27 não foram concluídos ainda e 4 foram abandonados” afirma Luciano Amadio, presidente da Associação Paulista de Empresários de Obras Pública (Apeop).
No setor de saneamento, o levantamento da Inter.B mostra cinco obras que deveriam estar prontas em 2011 e 2012, mas que só serão entregues no fim deste ano ou em 2015. Uma foi entregue em fevereiro, caso do Abastecimento de Água em Manaus. Previsto para novembro de 2011, o projeto foi concluído com 27 meses de atraso.
Em compensação, a obra de Saneamento Integrado de Vitória (ES) deveria ter sido concluída em dezembro de 2012. Se tudo correr bem, ficará pronta em dezembro de 2015. Por enquanto, só 69% das obras estão prontas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.