Como os salários não conseguem acompanhar a escalada de inflação, mais pessoas estão se utilizando do rotativo do cartão de crédito para dar aquela “pedalada” e jogar a dívida para o mês seguinte. São pessoas que deixam de pagar o total da fatura. Segundo dados do Banco Central, os atrasos de até 90 dias na modalidade do rotativo do cartão equivaliam a 16,3% das operações em fevereiro, um crescimento de 1,5 ponto percentual em relação a 12 meses. São pessoas que pagam até 290% ao ano, ou 12% ao mês, de taxas de juros porque gastaram mais do que podiam. São as maiores taxas em 16 anos.
“São juros proibitivos. Quem entrar no rotativo se condena a uma dívida quase que impagável, ou que, no mínimo, vai comprometer de forma importante a sua saúde financeira”, alerta o diretor de economia da Associação dos Executivos de Finanças (Anefac), Roberto Vertamatti. Para se ter uma ideia do tamanho do problema, quem deixar sua dívida por um ano no rotativo do cartão, vai quadrupicá-la no período. Ou seja, quem deixar de pagar R$ 100, no outro mês, terá de desembolsar mais R$ 12 no próximo. Parece pouco, mas em um ano, esse mesmo valor estará em R$ 390. Se a quantia for R$ 500, em 12 meses ela terá se transformado em R$ 1.948.
“Quem deixa de pagar o total do cartão vai trazer para sua vida uma bola de neve que só aumenta. Se a pessoa não teve condições de pagar a fatura completa num mês, também não vai conseguir no próximo”, alerta a professora de Finanças da Faculdade Guararapes, Valéria Saturnino. Para sair dessa situação, a professora aconselha o endividado a procurar urgentemente uma linha mais barata no banco, de preferência empréstimo consignado, que tem as menores taxas, ou crédito pessoal, que tem juros altos, hoje cerca de 59% ao ano, mas nada que se compare aos quase 300% do rotativo do cartão. “Quem não pode ter acesso a uma alternativa, porque já está totalmente tomada, a única solução é quebrar o cartão, deixar de utilizá-lo até se reequilibrar”, comenta.
Além de os juros básicos da economia estarem aumentando por conta da inflação, Vertamatti explica que a grande discrepância entre os juros pagos pelas instituições financeiras e o quanto elas cobram dos clientes tem a ver também com outros fatores, sendo um dos principais a baixa concorrência. “Basicamente temos três bandeiras que operam no Brasil e a mesma explicação vale para o sistema bancário. Temos 135 bancos no Brasil, é um número pequeno em relação a outros países, mas os grandes bancos detém 85% do crédito no País. A concorrência é pequena”, diz.
Outro contribuição para essa discrepância é a inadimplência, que aumentou bastante nos últimos anos. “A taxa de inadimplência no Brasil é o dobro do mercado americano ou europeu”, diz.
Nessa questão ainda há a questão do spread bancário, que é a diferença entre a taxa de captação e venda do banco. “Nesse item tem o lucro do banco, em 15%, tem a cunha fiscal de 25% e a inadimplência que é 20%. Ainda incide no spread o custo de operação do banco e o último componente que é os juros que o banco paga a quem emprestou a ele, no caso os clientes que têm produtos como a renda fixa”, explica.