COMÉRCIO EXTERIOR

Dólar alto e crise afetam as importações e aumentam custo de produtos

Moeda norte-americana atingiu R$ 3,45 ontem, nível mais alto desde março de 2003

Emídia Felipe
Cadastrado por
Emídia Felipe
Publicado em 04/08/2015 às 11:54
NE10
FOTO: NE10
Leitura:

Fazia tempo que o brasileiro não via o dólar custar tão caro por tanto tempo. Nesta segunda-feira (3), a moeda norte-americana bateu os R$ 3,45, maior valor em mais de 12 anos. Nas casas de câmbio, turistas encontraram a cotação por até R$ 3,70. O movimento de alta tem outro impacto – maior e em cadeia: as importações encarecem, aumentando o custo de produção e, consequentemente, o preço ao consumidor final.

De acordo com informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o volume de dólares envolvido nas importações de Pernambuco caiu 24,4% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado.

É verdade que boa parte está ligada à Petrobras, uma vez que os quatro primeiros itens da pauta são derivados de petróleo, responsáveis por 27,7% do total comprado de outros países. No entanto, a alta do dólar e o desaquecimento da economia minaram o poder de compra internacional das empresas locais.

Analista do Núcleo de Economia e Negócios Internacionais da Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe), Francisco Mendonça explica que muitas das compras que deixam de ser feitas são de matérias-primas, como o trigo. Foram compradas quase sete mil toneladas a menos a menos no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo intervalo de 2014. Nesta comparação, também houve retração da importação de produtos como carne (-10,6%) e de tecidos de poliéster (-12,6%). “São itens que, com a alta do dólar, terão uma influência negativa na vida do consumidor”, reforça Francisco Mendonça.

Em nível nacional, segmentos ligados à cadeia produtiva de mercadorias populares também sentem esse efeito. De acordo com números da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), as importações desse tipo de produto somaram US$ 17,8 bilhões no primeiro semestre de 2015, desempenho 14,9% menor em relação ao primeiro semestre de 2014. O gerente de Economia da Abinee, Luiz Cezar Elias Rochel, esclarece que, em situações como essa ocorre uma substituição das importações por fornecedores locais.

Ao passo que isso favorece a fabricação nacional, encarece os custos de produção, principalmente num ambiente recessivo. Segundo Rochel, mesmo com a inflação do setor – que fica, em média, a 6% – abaixo do IPCA, esse conjunto de fatores pressiona as indústrias. Mas ele defende que a área de eletroeletrônicos consegue adaptar-se para diminuir os danos. “Os avanços tecnológicos e a diversidade de produtos permitem que possamos oferecer produtos de qualidade similar a preços menores, atendendo a uma gama maior de clientes”, explica.

No varejo, empresas como a Nagem também refletem essa resiliência. A rede informa que tem estratégias para tentar absorver as variações do dólar e vender mais neste período que envolve o Dia dos Pais (próximo domingo), segunda melhor data de vendas no ano para o segmento. “A Nagem conseguiu negociar, junto a fabricantes, a manutenção de preços e até oferta em linhas como telefonia, informática e tecnologia”, diz a nota enviada à reportagem.

Infográfico

Cotação do dólar

Em geral, a outra face da alta do dólar é sorridente: com o real desvalorizado, quem exporta ganha mais. Porém, para aproveitar essa vantagem, a empresa não pode começar a investir quando a crise chega. Francisco Mendonça, da Fiepe, explica que são necessários pelo menos dois ou três anos de trabalho dedicados a esse canal de vendas para se beneficiar da valorização da moeda norte-americana.

O assunto foi abordado pelo JC recentemente. A matéria Hora de romper fronteiras, publicada no dia 26 do mês passado, mostrava que das 16 milhões de empresas brasileiras, somente 20 mil exportam e, dessas, 209 são pernambucanas. No Estado, o número tem caído: eram 290 no início dos anos 2000.

Para Mendonça, essa baixa internacionalização é um dos fatores que explicam a redução das vendas de Pernambuco para outros países (veja infográfico acima) no primeiro semestre deste ano.

TENDÊNCIA
Fatores externos também pesam, tanto na cotação do dólar, quanto nos resultados das exportações. O indicador de atividade industrial da China recuou de 49,4 para 47,8 em julho, em medição feita pela Caixin Media (antes HSBC) e divulgada pela Markit. Foi o menor nível em dois anos e o quinto mês seguido com resultado abaixo da marca de 50, o que sinaliza contração.

No primeiro semestre deste ano, as vendas de Pernambuco para China caíram 63%. “A desaceleração chinesa afeta os preços de commodities e tem reflexo nos emergentes”, afirma o economista chefe do Banco de Tokyo-Mitsubishi, Carlos Pedroso. Das 24 principais moedas emergentes, apenas duas conseguiram fechar em alta em relação ao dólar na sessão desta segunda (3).

“Além do componente externo, a expectativa de um corte do selo de bom pagador do Brasil pelas agências de classificação de risco também pesou”, afirma o diretor de câmbio da TOV Corretora, Fernando Bergallo. “O mercado não vai ficar esperando o corte da nota para agir. Os investidores sentem os indícios e já se posicionam, comprando a moeda, mesmo que um eventual rebaixamento só ocorra no ano que vem”, diz.

Apesar de antecipar o anúncio do rebaixamento, o dólar ainda não absorveu completamente o impacto do corte da nota, complementa o diretor da TOV. “O rebaixamento não foi precificado por inteiro. Se o corte de fato acontecer, o dólar chega a R$ 4. Mas enquanto isso não ocorre, o mercado vai reagindo às notícias que vão saindo”, ressalta. Este ano, a moeda norte-americana já acumulou alta de quase 30%.

Últimas notícias